04 Mai 2020
Mesmo que suas palavras tenham sido reunidas durante 2018, a de Joseph Ratzinger é, sob todos os aspectos, a primeira aparição após o pastiche do livro sobre o celibato eclesiástico escrito em conjunto com o cardeal africano Robert Sarah. O papa emérito aparece no apêndice da biografia de mil páginas escrita por seu amigo jornalista Peter Seewald - "Ein Leben" que chega às livrarias nesta segunda-feira, enquanto para as versões italiana e inglesa será necessário esperar o segundo semestre - com uma entrevista intitulada "As últimas perguntas a Bento XVI "e que, como no livro de Sarah, oferece aos leitores um verbo que aquece os ânimos da ala conservadora da Igreja, aquela parte que permaneceu fiel a ele mesmo após a renúncia de 11 de fevereiro de 2013.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 03-05-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Ratzinger, de fato, fala da crise da sociedade contemporânea comparando "casamento homossexual" e "aborto" com o "poder espiritual do anticristo". Com suas palavras, antecipadas ontem pelo site conservador estadunidense LifeSiteNews, o mesmo que nos últimos meses divulgou as opiniões contra Francisco do ex-núncio de Washington, Carlo Maria Viganò, ataca com toda a força a "ideologia dominante" na sociedade e que ao se opor a ela, ele explica, acaba-se sendo excomungado. Em suas palavras, percebe-se o eco do texto de um ano atrás dedicado à pedofilia, com a condenação às aberturas iniciadas em 1968, o começo, segundo ele, da decadência moral da sociedade e de uma crise irreversível da Igreja. O inimigo é sempre o mesmo: a revolução dos anos 1960-1970.
"Cem anos atrás - afirma Bento - todos teriam considerado absurdo falar de um casamento homossexual". Enquanto hoje, ele diz, somos excomungados pela sociedade se nos opomos. E o mesmo vale para "aborto e criação de seres humanos em laboratório". E novamente: "A sociedade moderna está no meio da formulação de um credo anticristão e, se alguém se opõe é punido pela sociedade com a excomunhão". "O medo desse poder espiritual do Anticristo é mais do que natural e precisa da ajuda de orações da Igreja universal para resistir."
Resistir, opor-se à ideologia dominante. O núcleo do pensamento de Ratzinger não é novo. Todo o seu pontificado girou em torno dos princípios não negociáveis, uma resistência ao mundo sem se nem mas. Mas o papa emérito também reflete sobre outra resistência, a sofrida durante seu pontificado vinda de dentro da Igreja, em particular da Cúria Romana. Ele diz: “Os entraves vinham mais do lado de fora do que da Cúria. Eu não queria simplesmente promover a purificação no pequeno mundo da Cúria, mas da Igreja como um todo". Enquanto isso, os eventos mostraram "que a crise da fé também trouxe a uma crise da existência cristã". Isso, ele continua, é o que o "Papa deve ter diante de seus olhos".
No início de seu pontificado, Bento XVI pediu força para não fugir dos lobos: estes, no entanto, não são os inimigos internos ou o que aconteceu com o Vatileaks, porque, segundo ele, "a verdadeira ameaça à Igreja e, portanto, ao ministério petrino não é reside nessas coisas, mas na ditadura mundial de ideologias aparentemente humanistas, contradizendo as quais se fica excluídos do consenso social básico". Os lobos, quando muito, emergem no triunfo da ideologia relativista, ele explica, que tende a excluir aqueles que têm uma concepção diferente daquela dominante: "O engano religioso supremo é o do Anticristo - insiste - um pseudo-messianismo mediante o qual o homem se glorifica no lugar de Deus e do seu Messias”.
No livro Seewald fala sobre o conclave que elegeu Bento XVI em 2005. Uma parte votou nele, outra já então em Jorge Mario Bergoglio, que depois retornou a Buenos Aires. Para este último, votou o cardeal Carlo Maria Martini que, segundo o que Seewald escreve, nunca se alinhou com Ratzinger, como já foi dito por muitos.
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O retorno de Ratzinger: “Casamento homossexual e aborto, sinais do Anticristo” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU