29 Fevereiro 2020
“Há muito, muitíssimo a ser feito. Sem desanimar, devemos pensar que uma Igreja purificada e consciente, renovada e ‘em saída’ poderá prestar um serviço muito precioso para a luta contra os abusos – sexuais e de qualquer outro tipo – na sociedade humana, para o bem dos menores de todo o mundo”, escreve o Pe. Federico Lombardi, presidente da Fundação Vaticana Joseph Ratzinger-Bento XVI.
A reportagem é publicada por Rai News, 28-02-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O grupo de trabalho operacional (força-tarefa) do papa, que ajudará as Conferências Episcopais, os institutos religiosos e as sociedades de vida apostólica na preparação e na atualização das diretrizes sobre a proteção dos menores, apresentado nesta sexta-feira, 28, no Vaticano, está sob a responsabilidade da Secretaria de Estado.
Uma nota do Vaticano esclarece que “quem supervisiona o grupo de trabalho é Dom Edgar Pena Parra, substituto para os Assuntos Gerais da Secretaria de Estado, junto com os cardeais Oswald Gracias, arcebispo de Bombaim, Blase Joseph Cupich, arcebispo de Chicago, Dom Charles Jude Scicluna, arcebispo de Malta e secretário adjunto da Congregação para a Doutrina da Fé, e o Pe. Hans Zollner, SJ, decano do Instituto de Psicologia da Pontifícia Universidade Gregoriana e membro da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores”: Gracias, Cupich, Scicluna e Zollner foram os responsáveis pela cúpula desejada pelo papa em fevereiro do ano passado com os presidentes das Conferências Episcopais de todo o mundo e, desde então, são o comitê diretivo que geriu as medidas adotadas desde aquela época.
O coordenador, explica o Vaticano, apresentará um relatório trimestral sobre as atividades desenvolvidas pela força-tarefa ao substituto para os Assuntos Gerais da Secretaria de Estado.
A força-tarefa auxiliará as Conferências Episcopais na preparação e na atualização das diretrizes sobre a proteção dos menores e as iniciativas implementadas para fortalecer a prevenção e o combate aos abusos: quem a apresentou à imprensa, um ano após o encontro presidido pelo Papa Francisco com os presidentes das Conferências Episcopais de todo o mundo, por ocasião de um “meeting point” na Sala de Imprensa da Santa Sé, foram o Mons. Juan Ignacio Arrieta Ochoa de Chinchetru, secretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, e o Pe. Federico Lombardi, jesuíta, ex-porta-voz do Vaticano e atual presidente da Fundação Vaticana Joseph Vatzinger-Bento XVI.
O jesuíta Hans Zollner, membro da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores e presidente do Centro para a Proteção dos Menores da Pontifícia Universidade Gregoriana, reivindicou os muitos passos dados pelo Papa Francisco, em particular no ano passado, começando pela cúpula convocada exatamente há um ano pelo papa com os presidentes das Conferências Episcopais de todo o mundo sobre os abusos sexuais de menores: “Eu acho que podemos constatar que há uma certa mudança geral bastante visível também no esforços de muitas Conferências Episcopais, não apenas de rever as suas diretrizes, mas também de fazer com que a mensagem do papa também seja implementada”, disse ele ao Vatican News: “Ou seja, escutar as vítimas, fazer justiça e se comprometer com a prevenção dos abusos”.
O jornal L’Osservatore Romano recapitulou recentemente todas as medidas adotadas pelo Vaticano há um ano para combater e prevenir os abusos sexuais de menores na Igreja.
Logo um mês depois da cúpula de fevereiro de 2019, “no dia 26 de março de 2019, Francisco assinou três documentos que mudam o rosto da legislação vaticana. O primeiro é a Carta Apostólica na forma de motu proprio com a qual se estabelece que seja acusado quem comete ‘abuso ou maus tratos contra menores ou pessoas vulneráveis’, que, pelos crimes cometidos em território vaticano, tenham jurisdição penal os órgãos judiciais internos, que seja oferecida às vítimas assistência espiritual, médica, social e legal, assim como seja garantido o direito a um processo justo para os imputados e se proceda a remoção dos cargos para os condenados, garantindo também para eles um apoio à reabilitação”.
“O segundo procedimento aprovado pelo papa foi a Lei 297 para o Estado da Cidade do Vaticano. O novo código impõe, entre outras coisas, a obrigação de denúncia imediata de uma notícia de crime e fixa em 20 anos o prazo de prescrição do crime, que, em caso de menor, começa a contar partir do cumprimento dos 18 anos de idade.”
“A Lei 297 também indica no ‘serviço de acompanhamento’ o instrumento idôneo para fornecer toda forma de assistência às vítimas e às suas famílias. O terceiro procedimento, as ‘Diretrizes para a proteção dos menores’, sanciona os critérios para a escolha dos agentes de pastoral e as normas corretas de comportamento na relação com menores e pessoas vulneráveis e, em geral, lista os procedimentos a serem seguidos no caso de processos contra abusadores.”
“Depois de legislar sobre essa matéria dentro do Vaticano, um mês e meio depois, Francisco estende de modo análogo as mesmas obrigações para toda a Igreja. Ele fez isso com o motu proprio Vos estis lux mundi, assinado em 9 de maio de 2019. Também no caso desse documento, foram fixadas as normas a serem seguidas para denunciar assédios e violências, e para assegurar que bispos e superiores religiosos prestem contas do seu trabalho. O documento introduz a obrigação para clérigos e religiosos de denunciar os abusos e exige que cada diocese adote um sistema facilmente acessível ao público para receber as denúncias.”
“Para auxiliar os dicastérios na aplicação do motu proprio, foi instituída uma mesa presidida por Dom Filippo Iannone, presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, à qual se sentam representantes da Secretaria de Estado e das Congregações para a Doutrina da Fé, para as Igrejas Orientais, para os Bispos, para a Evangelização dos Povos, para o Clero, para os Institutos de Vida Consagrada”.
No fim do ano passado, o papa deu mais um passo. No dia 17 de dezembro, foram oficializados dois Rescritos assinados pelo cardeal secretário de Estado, Pietro Parolin.
O primeiro, que atraiu uma grande cobertura midiática, promulgou a instrução com a qual Francisco, cancelando o “sigilo pontifício”, quis certificar o modo de se comportar – e, portanto, o grau de reserva a ser adotado – nos casos de denúncias de abusos sexuais cometidos pelo clero e por religiosos e sobre eventuais encobrimentos e silêncios por parte das autoridades eclesiásticas.
O segundo Rescrito introduz modificações nas “Normae de gravioribus delictis”. Uma delas configura como crime por parte de um clérigo a aquisição, posse ou divulgação de imagens pornográficas de menores considerados como tais não mais até os 14 anos, mas sim até os 18 anos.
Outra é a que concede a faculdade de exercer o papel de advogado e procurador não mais como no passado a um clérigo, mas sim a “um fiel, com doutorado em direito canônico”.
Ainda na conclusão da cúpula de fevereiro, haviam sido preanunciados, finalmente, duas outras medidas: uma força-tarefa para auxiliar Conferências Episcopais e comunidades religiosas que precisam preparar ou atualizar as diretrizes sobre o assunto e, em breve, um vademecum da Congregação para a Doutrina da Fé.
Para o Pe. Lombardi, “aqui – no campo da recepção nos diversos lugares das leis e das orientações da Igreja – é que se joga o trabalho da resposta capilar e profunda ao drama dos abusos nas suas várias formas”, escreveu o jesuíta no prefácio do livro “La Chiesa risponde agli abusi sui minori. Interventi, provvedimenti e indirizzi per contrastare un grave fenomeno di devianza” [A Igreja responde as abusos de menores. Intervenções, procedimentos e direções para combater um grave fenômeno de desvio].
“Há muito, muitíssimo a ser feito”, afirma ele. “Sem desanimar, devemos pensar que uma Igreja purificada e consciente, renovada e ‘em saída’, poderá prestar um serviço muito precioso na luta contra os abusos – sexuais e de qualquer outro tipo – na sociedade humana, para o bem dos menores de todo o mundo.”
O Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o seu X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos, a ser realizado nos dias 14 e 15 de setembro de 2020, no Campus Unisinos Porto Alegre.
X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos
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Um ano após a cúpula sobre os abusos, Secretaria de Estado lança força-tarefa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU