24 Janeiro 2020
"Ao fazer o anúncio surpreendente de hoje, Bolsonaro agiu como um parteiro mágico. Só que a montanha pariu um rato. Ou um factótum", escreve Lúcio Flávio Pinto, jornalista desde 1966, sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973, e editor do Jornal Pessoal, em artigo publicado por Amazônia Real, 21-01-2020.
O presidente Jair Bolsonaro tirou, hoje, da cartola de mágico da internet dois coelhos: o Conselho da Amazônia e a Força Nacional Ambiental. Criaturas que demandariam tempo, reflexão e debates para poderem existir legitimamente, surgiram um dia depois que o Brasil foi criticado pelos países mais ricos do mundo. Reunidos na suíça Davos Platz, sob um frio intenso, os poderosos apresentaram restrições ao Brasil por seu descaso efetivo (em contraste com a preocupação formal, para inglês ver) com a situação da maior floresta tropical do planeta e sua gente nativa.
A “pirralha” sueca Greta Thunberg fez mais barulho do que o astro programado para a ocasião, o presidente americano Donald Trump. Bolsonaro seria tão mal vindo que nem foi. Teve que dar uma resposta a jato, à distância.
Mas se criar de fato o conselho terá que extinguir a Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), que foi criada e renasceu, depois de uma morte curta e temporária, justamente para coordenar a ação do governo federal na região, para proteger, defender e promover o desenvolvimento sustentável da Amazônia.
Como a sede do novo órgão deverá ficar em Manaus, sendo a Sudam baseada em Belém, a colisão não seria frontal. Mas é, tirando esse aspecto secundário da localização territorial. O conselho terá estrutura própria, o que significará mais custos e ônus, mas também conflito jurisdicional.
O colegiado será chefiado pelo general e vinculado à sua vice-presidência. Em tese, numa hierarquia superior. Na prática, mero apêndice e, como tal, sujeito à presunção de inutilidade e sob o risco de existência efêmera. Ainda mais por ter-se originado de um ato administrativo da presidência da república, enquanto a Sudam resulta de lei.
Já a nova força nacional, versão ambiental da FNS (Força Nacional de Segurança), por sua amplitude territorial e temática, está condenada à dispersão e ineficiência. Também a colidir setorialmente com o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), além do Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio).
Se esvaziar os dois órgãos, principalmente o mais velho, o Ibama, sucessor do IBDF (Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal), ainda do início do regime militar, os levará à extinção. Se for o contrário, terá sido dilapidação de dinheiro público.
Para estar em harmonia com o conselho, a FNA deveria ser restrita à Amazônia, onde ainda está a maior floresta tropical da Terra, sua maior bacia hidrográfica e dois terços do espaço territorial brasileiro. Afinal, ela é que é a fronteira nacional, uma das mais valiosas que resta no planeta.
Além dessa jurisdição, a Força teria que ser especializado, na nossa versão da polícia montada do Canadá, adaptada de floresta temperada para tropical e de um país civilizado para uma região agredida pela violência e os desmandos do homem.
Ou então, aproveitando o acervo de experiências de um órgão já existente, dar esse poder de polícia ao Ibama, equipando-o com uma frota de helicópteros e múltiplas bases situadas nas áreas de maior atrito ecológico e social da Amazônia.
Ao fazer o anúncio surpreendente de hoje, Bolsonaro agiu como um parteiro mágico. Só que a montanha pariu um rato. Ou um factótum.
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Para Davos ver - Instituto Humanitas Unisinos - IHU