23 Janeiro 2020
O Pe. Hans Zollner, principal especialista em proteção infantil da Igreja, deseja uma teologia mais sistemática sobre a crise dos abusos.
A reportagem é de Christopher Lamb, publicada por The Tablet, 21-01-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Roma está prestes a sediar uma cúpula que examinará como a crise dos abusos sexuais clericais está forçando a Igreja a voltar à sua missão principal e a repensar o seu modelo de sacerdócio.
O encontro de cerca de 90 teólogos de todo o mundo, organizado pelo Centro de Proteção aos Menores da Pontifícia Universidade Gregoriana, analisará o impacto eclesiológico dos abusos, de um modo que não seja simplesmente jurídico ou processual. A reunião de 11 a 14 de março deve abordar o clericalismo, a reforma eclesial e a redescoberta da missão de Jesus nas estruturas da Igreja.
Em um nível teológico, o abuso de crianças por parte de padres e o fracasso dos bispos em responder adequadamente são duplamente chocantes, porque traem a missão da Igreja. Os historiadores falam da maior crise desde a Reforma, e, para os organizadores da próxima cúpula, a resposta aos abusos requer uma profunda busca na alma sobre o que significa ser Igreja.
Mas o Pe. Hans Zollner, diretor do centro e principal especialista em proteção infantil da Igreja, disse que, embora a crise dos abusos esteja em discussão na Igreja há 35 anos, houve “poucas tentativas de fazer uma teologia sistemática” sobre isso.
O objetivo, disse ele, é reunir “experiência e criatividade teológicas” e o trabalho jurídico, prático e psicológico que tem sido realizado. O Pe. Zollner, um teólogo e psicólogo que faz parte da comissão papal de proteção aos menores, está organizando o encontro com um colega jesuíta, o Pe. James Keenan, professor da cátedra Canisius de teologia do Boston College e renomado teólogo moral.
“As pessoas podem dizer: ‘Por que vocês estão abordando isso teologicamente? Vocês deveriam seguir a lei adequadamente. Por que vocês espiritualizam isso novamente?’”, questionou Zollner à The Tablet. “A resposta é ‘não’, estamos tentando trazer isso à atenção da nossa fé e da reflexão da fé, uma fé que diz, acima de tudo, que o próprio Jesus foi vítima de violência, ele se identificou com os mais vulneráveis.”
Ele acrescentou: “O que a nossa fé em Jesus Cristo nos diz sobre como devemos ir ao encontro dos sobreviventes de abuso dentro e fora da Igreja? Como devemos falar em perdão diante de crimes horríveis? Como devemos falar sobre cura?”
“Como entendemos a Igreja que tem se mostrado há séculos como um farol de proteção, apoio e cuidado dos mais vulneráveis, mas, ao mesmo tempo, também tem sido – como vimos nas últimas décadas – um lugar onde as pessoas têm sido usadas de uma maneira horrível?”
Os pontos de discussão incluem “punição e reconciliação”, fazer justiça às vítimas, afastar o sacerdócio do clericalismo rumo a um ministério de serviço, “redescobrir Jesus na eclesiologia” e ver a missão da Igreja como uma ajuda para guiar a reforma.
Os observadores da Igreja têm apontado que a crise dos abusos está apressando o fim de um sistema clericalista que colocou a proteção da instituição como algo primordial, em que o sacerdócio era idealizado e as lideranças não eram responsabilizadas. O Papa Francisco falou sobre o escândalo do abuso clerical que “purifica” a Igreja, pois a crise de abusos leva bispos a renunciarem, um cardeal a ser preso, e outro a ser removido do sacerdócio.
Espera-se que bispos importantes e lideranças vaticanas estejam no centro das atenções quando um relatório sobre o ex-cardeal e ex-padre Theodore McCarrick for publicado nas próximas semanas.
A ligação entre a teologia e a salvaguarda foi analisada pela Comissão Real nas “Respostas Institucionais ao Abuso Sexual de Crianças na Austrália”, uma das investigações estatais mais aprofundadas que já foram realizadas. Em seu relatório final, a comissão criticou fortemente o clericalismo, mas acrescentou que o entendimento da Igreja de que uma “mudança ontológica” ocorre na ordenação sacerdotal agravou o problema. A comissão também pediu o fim do celibato clerical obrigatório.
A cúpula, que ocorre a pouco mais de um ano da histórica reunião do papa para discutir a questão no Vaticano em fevereiro passado, será uma oportunidade para que os teólogos, e não as autoridades seculares, olhem para essas questões, embora provavelmente tenham uma visão mais matizada do que a Comissão Real.
Teólogos da América do Norte, da Europa, da África, da Ásia e da América Latina participarão do evento, incluindo quatro delegados da Austrália e o Prof. Paul Murray e o Dr. Marcus Pound da Universidade de Durham, no Reino Unido.
Nota da IHU On-Line:
O Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o seu X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos, a ser realizado nos dias 14 e 15 de setembro de 2020, no Campus Unisinos Porto Alegre.
X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos
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Evento em Roma, com cerca de 90 teólogos, examinará a questão dos abusos sexuais clericais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU