20 Setembro 2019
Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste 25º Domingo do Tempo Comum, 22 de setembro (Lucas 16,1-13). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Há parábolas de Jesus bem construídas e com uma mensagem evidente; outras, por sua vez, mais contorcidas, menos lineares, cuja mensagem deve ser buscada com cuidado e inteligência.
Neste capítulo 16 do Evangelho segundo Lucas, encontramo-nos diante de duas parábolas sobre as atitudes em relação ao dinheiro e à riqueza, parábolas proclamadas uma neste domingo, e a outra, no próximo (Lc 16,19-31).
Certamente, a parábola de hoje, a do ecônomo injusto, desonesto, que não age com retidão, pode parecer escandalosa; para o leitor superficial pode até ser imoral, mas é necessário prestar atenção e discernir o vértice teológico presente no relato: então o entenderemos em fidelidade à intenção de Jesus.
Tentemos, portanto, com humildade, trabalhar, exercitar a inteligência para chegar a compreender também este trecho de modo evangélico, captando nele a “boa notícia”.
Um homem rico tem um ecônomo que administra os seus negócios, mas, de repente, este último se revela como um dissipador dos seus bens. Então, o patrão o chama e lhe pergunta: “Que é isto que ouço a teu respeito? Presta contas da tua administração, pois já não podes mais administrar meus bens”. É algo que ocorre muito frequentemente, porque a tentação da injustiça, de pensar em si mesmo e de não ser responsável por uma propriedade alheia é fácil e recorrente.
Mas como reagir quando se é descoberto? Aqui, o ecônomo, diante da ameaça de patrão e da perspectiva de perder o trabalho, começa a raciocinar, a pensar no seu futuro. Ele medita consigo mesmo: “Que vou fazer? Para cavar, não tenho forças; de mendigar, tenho vergonha”.
E eis que, no seu diálogo interno, ele chega a uma solução: tornar-se amigo de alguns devedores do seu patrão, para poder contar com eles. Mas ele deve fazer tudo muito rápido, por isso convoca os devedores imediatamente. Ao primeiro, ele pergunta: “Quanto deves ao meu patrão?”. Resposta: “Cem barris de óleo". E ele replica, cortando pela metade a dívida: “Pega a tua conta, senta-te, depressa, e escreve cinquenta!”. Para outro, que deve 100 sacos de trigo, o ecônomo lhe perdoa 20.
Eis uma verdadeira fraude, um perdão das dívidas sem a autorização do patrão, uma evidente injustiça! Porém, o padrão, tomando conhecimento do engano realizado em seu detrimento, congratula-se com o ecônomo desonesto, que, segundo Jesus, é filho deste mundo das trevas, portanto, é um filho de Satanás, aquele que luta contra os filhos da luz que vivem na justiça.
Então, por que o elogio, as congratulações? Pela ação injusta? Não: pela capacidade de fazer amigos, dando e compartilhando exatamente aquela riqueza injusta. Assim, aquele ecônomo injusto não dissipa mais os bens dos quais é administrador, mas os honra, compartilhando-os com aqueles que não têm nada.
Eis onde está a boa notícia, o evangelho: o que é urgente, a ação boa, é distribuir o dinheiro da injustiça aos pobres, e não o conservar zelosamente para si mesmo. Precisamente essas palavras de Jesus querem ser uma boa notícia para os ricos, porque agora eles sabem como devem administrar os bens que não são deles: distribuindo-os a todos.
A natureza exemplar desse ecônomo injusto, portanto, não deve ser identificada no seu agir desonesto, mas sim na sua capacidade de discernimento da situação em que se encontra, de adesão à sua realidade marcada por muitos limites e de agir em conformidade com inteligência.
Atenção, nesse relato e no sucessivo comentário de Jesus, aparece por nada menos do que cinco vezes o termo injustiça/injusto (adikía/ádikos) para definir o ecônomo e a riqueza, Mamon. A injustiça, portanto, é denunciada e condenada: não há outra via de justiça senão o de dar a riqueza, compartilhando-a com os pobres, aqueles que são bem-aventurados e aos quais é prometido o reino de Deus (cf. Lc 6,20).
O dinheiro continua sendo “Mamon (de ‘aman, que significa “crer”!) de injustiça”, definição presente também nos escritos de Qumran, que proclama a sua iniquidade radical. Nós sabemos bem disto: o dinheiro captura a fé, encanta, seduz, dá uma falsa segurança, rouba o coração, engana e se torna o tesouro precioso, o ídolo no qual se confia (cf. Lc 12,34; 1Tm 6,17). É verdade que o dinheiro é apenas um instrumento, mas, como pede para se ter confiança nele, é preciso vigiar para não ser dominado por ele, e, pelo contrário, é preciso doá-lo, distribuí-lo, compartilhá-lo. De fato, se for acumulado e mantido para si, acaba sendo alienante: não é mais possuído, mas é ele quem possui aqueles que o têm nas suas próprias mãos!
Precisamente por isso, no Evangelho segundo Lucas, há uma grande revelação feita pelo próprio demônio a Jesus no momento das tentações no deserto: “Toda essa riqueza foi dada a mim” – dada por Deus, poderíamos dizer – “e eu a dou a quem eu quiser” (cf. Lc 4,6).
Sim, quem acumula riquezas é um administrador de Satanás, quer o saiba ou não; por isso, na nossa parábola, o homem rico que dá muitos bens à gestão do ecônomo pode ser uma figura do demônio. A única maneira para fugir da escravidão satânica é distribuir, doar o dinheiro, os bens, perdoar as dívidas: o dinheiro acumulado é sempre sujo; para limpá-lo, basta compartilhá-lo!
O cristão, portanto, sabe que existe um Mamon com letra maiúscula, um ídolo forte e sedutor que pode se tornar um Kýrios, um Senhor, tornando servo e escravo quem é o seu administrador. O discípulo de Jesus – como o próprio Jesus recorda claramente – não pode servir a dois senhores, mas é posto diante de uma escolha:
- ou amar e servir um, ou amar e servir o outro;
- ou repudiar um, ou repudiar o outro,
porque os dois patrões são antitéticos, são concorrentes ao exigir fé-confiança.
Como discípulos de Jesus, podemos olhar para o horizonte do Reino, onde nos aguarda a grande comunhão dos amigos do Senhor na vida eterna. Que nos acolherá com amizade entre si são precisamente os pobres, aqueles dos quais nos tornamos amigos aqui na terra, dia após dia, com a dança do dom e o exercício da partilha. Não estaremos sozinhos, mas seremos uma comunhão de amigos, se, na amizade, tivermos nos exercitado aqui e agora, doando e aceitando os dons.
Mas, nessa parábola e nas palavras com as quais Jesus a comenta, há apenas uma exemplaridade ligada à partilha dos bens com os pobres? Não existe também, talvez, um convite dirigido por Jesus aos discípulos, aos “filhos da luz”, para que sejam capazes de exercitar inteligência, criatividade e audácia, como infelizmente os “filhos deste mundo” sabem fazer?
De fato, há quase um lamento nessa observação de Jesus a respeito dos seus seguidores: eles não sabem ser phrónimoi, capazes de inteligência, de discernimento e de vigilância!
Especialmente hoje, em um mundo indiferente ao anúncio de Deus, por que os cristãos não sabem fazer com que se compreenda que o Evangelho é uma boa notícia? Por que o discurso cristão continua sendo tão confuso e ofuscado por tantas palavras e tantos revestimentos humanos e mundanos? Por que não sabemos dizer que o cristianismo é o encontro com uma pessoa, Jesus Cristo, o Senhor vivo, sem afogar o anúncio em moralismos culpabilizantes que os homens e as mulheres de hoje não conseguem acolher como salvação? Por que não sabemos opor à indiferença dominante na sociedade a “diferença cristã” manifestada em vidas humanas marcadas pela bondade, beleza e bem-aventurança?
Sim, ainda hoje Jesus continua se lamentando de como os filhos deste mundo são mais inteligentes e estão mais despertos do que os filhos da luz!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Compartilhar a riqueza injusta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU