01 Julho 2019
Dezenas de pessoas se manifestaram contra a exploração de carvão na região Metropolitana de Porto Alegre.
A reportagem é de Catiana de Medeiros, publicada por MST, 30-06-2019.
A rejeição da população à Mina Guaíba ficou em evidência na noite desta última quinta-feira (27) em Eldorado do Sul, na região Metropolitana de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Dezenas de trabalhadores de vários municípios se posicionaram contra a implantação do projeto da empresa Copelmi, durante audiência pública realizada pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), na Escola David Riegel Neto, no centro do município.
O evento, recomendado pelo Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal, durou cerca de 8 horas, com direito a protestos dentro e fora da instituição de ensino. Marcaram presença deputados, prefeitos e vice-prefeitos, promotores de justiça, procuradores, vereadores e representantes de movimentos populares, da sociedade civil e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Também participaram indígenas, assentados e trabalhadores urbanos de Eldorado do Sul e Charqueadas – municípios onde a Copelmi quer implantar a Mina Guaíba, a maior de carvão a céu aberto do país, e um polo carboquímico-.
A discussão em torno do projeto, que ocupará quase 5 mil hectares e prevê a extração de 166 milhões de toneladas de carvão, faz parte do processo para concessão da licença prévia ambiental.
Dois funcionários da Copelmi apresentaram o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima). Os argumentos mais usados por eles é que o empreendimento gerará empregos e trará crescimento à região. No entanto, a maioria dos participantes da audiência se manifestou contra o projeto. Se aprovado, a Mina Guaíba será instalada em 2020 e começará a operar em 2023. O seu fechamento seria apenas em 2052.
Moradora do Distrito Parque Eldorado e analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Manuela Schuch, disse que “carvão é energia do século passado” e que, ao contrário do que alega a Copelmi, não representa desenvolvimento, e sim retrocesso.
Ela apresentou alternativas de geração de emprego e renda à região, por meio de iniciativas para recuperação de áreas degradadas. “A gente tem projeto que prevê a construção de uma agrofloresta comunitária, produzindo alimentos saudáveis e preservando os recursos hídricos”, declarou.
Manuela afirmou também que a Mina Guaíba pode destruir recursos essenciais à sobrevivência humana, como a água, uma vez que estaria a 1.500 metros do rio Jacuí. “A gente não vive mais de três dias sem água e estamos discutindo um empreendimento que pode contaminá-la de forma irreversível com metais pesados, o que a torna imprópria para o consumo e pode causar doenças graves, doenças do coração, cegueira, doenças degenerativas e câncer”, alertou.
A produção de alimentos orgânicos também estaria prejudicada. Segundo o assentado Valcir de Oliveira, dezenas de famílias de Eldorado do Sul, São Jerônimo, Guaíba e Charqueadas que fazem feiras ecológicas perderiam a certificação.
Além disso, moradores do assentamento Apolônio de Carvalho, em Eldorado do Sul, seriam expulsos da área para implantação do projeto, acabando com a terceira maior produção de arroz orgânico do país. Quem vive no loteamento Guaíba City, em Charqueadas, também seria atingido. No entanto, Oliveira enfatiza que toda a região será vítima devido à contaminação. “Não existem afetados indiretos, todos nós seremos afetados diretamente”, apontou.
Representantes de povos indígenas também se posicionaram. O cacique kaingang Maurício Gonçalves complementou que, apesar da Copelmi ter apresentado “imagens bonitas”, o projeto não trará prosperidade à população.
Ele denunciou que, assim como em outras situações, os indígenas não foram consultados, o que desrespeita artigos da Constituição Federal e da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Nós, por direito, temos que ser consultados. Vocês vão trazer lucro à empresa e a algumas pessoas, mas vão trazer uma catástrofe para quem fica sem lucro. Vocês vão matar as matas, os rios, a fauna e a flora, sem contar as vidas”, argumentou.
Fernando Campos, da coordenação do Núcleo Amigos da Terra, ressaltou que a audiência pública na cidade de Eldorado do Sul aconteceu após muita pressão popular, e que a Fepam cedeu à população documentos referentes ao projeto somente por ordem judicial. “Esse pessoal não tem compromisso com a verdade”, criticou.
Manifestantes ainda ressaltaram que quem deve decidir sobre a implantação do projeto é o povo que seria impactado. Por isso, desde o início do ano, trabalhadores, parlamentares e entidades socioambientais pressionam para que também ocorra uma audiência pública da Fepam em Porto Alegre.
O entendimento é que, se aprovado, o empreendimento atingirá a cidade com a contaminação do ar, do rio Jacuí e do lago Guaíba, responsáveis por abastecer diariamente mais de 4,3 milhões de pessoas.
A população continua mobilizada contra a implantação da Mina Guaíba entre Eldorado do Sul e Charqueadas. Na próxima segunda-feira (1º de julho), às 10 horas, acontecerá um novo debate sobre os impactos do projeto, com o apoio do Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul. Será na Ilha da Pintada – salão da Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, rua Capitão Coelho, 300.
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Audiência reforça posição contrária da população gaúcha à Mina Guaíba - Instituto Humanitas Unisinos - IHU