19 Junho 2019
Com importantes resultados chegou ao seu término o projeto “Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do médio rio Solimões e afluentes”, realizado pela Cáritas de Tefé e CIMI Regional Norte I na Prelazia de Tefé, e apoiado pela União Europeia e Agência Católica de Desenvolvimento Internacional (CAFOD).
A reportagem é de Ligia Kloster Apel, assessora do Conselho Indigenista Missionário de Tefé - AM.
Caracterizado como um grande “ajuri” (mutirão) em defesa dos direitos indígenas, o projeto atuou com o objetivo de contribuir com o fortalecimento dos conhecimentos indígenas sobre seus direitos constitucionais e de suas capacidades de diálogo com o poder público para reivindicações e garantias desses direitos. Nos municípios de Tefé, Japurá, Maraã, Itamarati e Carauari, de 2016 a 2019, foram realizadas atividades de formação como Oficinas Político-jurídicas, Encontros Regionais e Mutirões em Defesa dos Direitos Indígenas, Campanhas de valorização da cultura indígena e sensibilização da sociedade para as ameaças que sofrem, palestras e contatos direto com comunidades escolares, feiras, exposições e jogos interculturais, e Incidências políticas junto aos órgãos públicos responsáveis pelas políticas indigenistas locais e nacionais.
Marcando o encerramento das atividades do projeto foi realizado de 27 a 29 de maio, no Centro de Formação Irmão Falco, o II Encontro Regional de Lideranças Indígenas. Representando suas comunidades, as mais de 150 lideranças presentes afirmaram que o projeto ampliou seus conhecimentos sobre as leis e o funcionamento do Estado brasileiro, fortaleceu sua identidade através da valorização da diversidade de culturas indígenas da região e, também, proporcionou maior segurança no diálogo com o poder público para reivindicar seus direitos. O tuxaua Anilton Braz Kokama, da aldeia Porto Praia de Baixo, em Tefé, agradeceu o trabalho desenvolvido pelo CIMI e falou como se sente com os novos conhecimentos: “Agradeço pelo trabalho que o CIMI fez e digo que a gente se sente alegre porque, agora, temos o conhecimento que a gente não tinha. Hoje não é qualquer um que vai nos atrapalhar”, afirma o Kokama com a segurança de quem adquiriu coragem com os aprendizados.
A jovem liderança Valcidheice Pereira Kokama, da aldeia Boara de Cima, Tefé, também diz que o projeto trouxe conhecimento e, com ele, a certeza de que a voz indígena deve ser ecoada: “ele trouxe a nossa voz à tona, porque a gente não sabia o que falar, o que dizer. As pessoas falavam as coisas pra gente ditando: vocês vão fazer isso, aquilo e aquilo. Por falta de conhecimento, a gente baixava a cabeça e concordava. Agora não. Com o que aprendemos, conseguimos responder porque sabemos o que responder e a gente afirma ‘não, não é assim que eu quero, eu quero dessa forma porque é melhor pra mim, é melhor pro meu povo’.
Para o coordenador do projeto e do CIMI Regional Norte I na Prelazia de Tefé, Raimundo Freitas, é gratificante ouvir esses depoimentos que mostram o “quanto as lideranças se fortaleceram em suas lutas conjuntas pela garantia de seus direitos, no diálogo com o poder publico, sem medo de serem ignorados ou enrolados”. Freitas, que é missionário do CIMI, conhece as lutas dos povos indígenas e sabe que muitas conquistas custaram “o sangue de mártires derramados na luta”. Sabe, também, que “atualmente, os povos indígenas e as populações tradicionais de nosso país correm sérios riscos de retrocessos e violações dos seus direitos conquistados”.
Mas acima de tudo, o coordenador do CIMI na Prelazia de Tefé, é seguro ao afirmar que “se tem um povo que sabe resistir e lutar, são nossos irmãos indígenas”. É com essa certeza que Raimundo envia boas energias aos povos que participaram do projeto e a todos os indígenas: “Eu digo a esses bravos guerreiros, resistentes e persistentes: Os tempos são difíceis e desafiadores, mas vocês nunca desanimaram e jamais baixaram a cabeça para quem quer pisar sobre vocês. Então, mantenham-se unidos, fortes e unificados em suas ações. Só assim terão um futuro promissor para suas futuras gerações”.
Durante os três dias do encontro, lideranças e parceiros trocaram ideias, informações e opiniões sobre a conjuntura política que o país vive e traçaram caminhos estratégicos para continuarem fortalecendo a luta. Gesse Baniwa, liderança antiga do movimento indígena da Amazônia, participou de todos os debates, ouvindo e contribuindo. Por fim, enviou um recado para cada indígena do Brasil e do mundo: “esperança, esperança, esperança, mas esperança que vai se realizando na medida do compromisso de luta. É luta, mobilização, formação, informação. Vamos exercitar de vez o direito à autonomia. Governar nossas comunidades, administrar nossas vidas nas nossas aldeias. Tá garantido na Constituição, tanto nacional quanto internacional. Se a gente conseguir por em prática essa nossa autonomia de verdade, pra valer, de forma coletiva, ninguém nos segura. E não tem que ser uma autonomia ditada também só pela autoridade dos caciques, tem que ser autoridade da comunidade, da coletividade. Ninguém segura a gente e, aí, eu acho que nós temos mais condições de vencer esses desafios de ataques aos nossos direitos”.
Confirmando o desejo de Gesse, o líder Sumurivi Hava Deni, da aldeia Itaúba, de Itamarati (AM), diz com segurança e esperança que a cultura indígena do Amazonas não deixará de existir: “O direito indígena é nosso direito, porque nós temos nossa crença, a nossa cultura e nós demonstra nossa cultura, nossa língua que cresce. Isso é um direito nosso. Tento nós fala no meio de cariva [branco, não índio], tanto nós fala em nossa assembleia e, por isso, nossa cultura é diferenciada. A nossa cultura daqui da região da Amazônia sempre vai continuar, porque é nossa cultura”, afirma, agradecendo e reconhecendo que o projeto contribuiu com a valorização de sua cultura.
Também agradecido, Biruvi Makuvi Deni, da aldeia Itaúba, afirma que o projeto trouxe benefícios pelos conhecimentos das leis brasileiras que protegem os indígenas e que o índio precisa ser forte: “Foi importante o que o projeto trouxe pra nós”, e disse, contundente, que “o índio tem valor, o índio sabe respeitar. O branco diz que o índio não sabe de nada, mas o índio tem memória”, finalizou
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Alto Solimões - AM. Esperança, legitimidade e autonomia: resultados que indicam caminhos de luta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU