25 Janeiro 2019
Comunidade versus isolamento. Contato ou narcisismo. Reconhecimento do outro contra individualismo e espirais de ódio. Os perigos e as potencialidades da internet estão na mais recente mensagem do Papa por ocasião do Dia Mundial das Comunicações Sociais. “Somos membros uns dos outros. Das comunidades nas redes sociais à comunidade humana”, é o título do documento, divulgado nesta quinta-feira, 24 de janeiro, pela Sala de Imprensa do Vaticano.
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada por Vatican Insider, 24-01-2019. A tradução é de Graziela Wolfart.
Longe de ser um diagnóstico fatalista, trata-se de uma análise concreta sobre uma realidade presente na vida de grande parte dos seres humanos em âmbito mundial. Não se trata de uma condenação da tecnologia, mas da busca em destacar vantagens e armadilhas. Sobretudo, a mensagem convida a passar de uma cultura dos “likes” ao “amém”, algo próprio das comunidades que acolhem os outros, com abertura de coração.
“O ambiente midiático é hoje tão onipresente que fica muito difícil distingui-lo da esfera da vida cotidiana. A internet é um recurso de nosso tempo. Constitui uma fonte de conhecimentos e de relações até pouco tempo inimaginável. No entanto, por causa das profundas transformações que a tecnologia imprimiu nas lógicas de produção, circulação e aproveitamento dos conteúdos, vários especialistas destacam os riscos que ameaçam a busca e a possibilidade de compartilhar uma informação autêntica em escala global”, escreveu o Papa.
Acrescentou que a internet representa uma “possibilidade extraordinária” de acesso ao saber, mas também se apresenta como um dos lugares mais expostos à desinformação e à distorção consciente e planejada, tanto dos fatos como das relações interpessoais, que muitas vezes assumem a forma de descrédito.
Mais adiante, denunciou que as redes se prestam a um uso manipulador dos dados pessoais com a finalidade de obter vantagens políticas e econômicas, sem o devido respeito à pessoa e a seus direitos. Lamentou que, segundo indicam as estatísticas, um a cada quatro jovens se viu envolvido em episódios de perseguição cibernética.
Por isso, era urgente ver a internet como uma comunidade que, quanto mais coesa e solidária, mais estará animada por sentimentos de confiança, de busca por objetivos compartilhados, e maior será sua força. Mas é preciso que, como rede solidária, a comunidade faça a escuta recíproca e o diálogo baseado no uso responsável da linguagem.
“É evidente que, no cenário atual, as redes sociais não são automaticamente sinônimos de comunidade. No melhor dos casos, conseguem dar amostras de coesão e solidariedade; mas com frequência ficam somente em agregações de indivíduos que se agrupam em torno de interesses ou temas caracterizados por vínculos débeis”, defendeu Jorge Mario Bergoglio.
Além disso, constatou que, muitas vezes, a identidade nas redes sociais se baseia na contraposição ao outro, ao que não pertence ao grupo, e esta se define a partir do que divide no lugar do que une, deixando espaço à suspeita e à explosão de todo tipo de prejuízos (étnicos, sexuais, religiosos e outros).
Segundo o Pontífice, essa tendência alimenta grupos que excluem a heterogeneidade; que favorecem, também no ambiente digital, um individualismo desenfreado, terminando, às vezes, por fomentar espirais de ódio. Assim, considerou, o que deveria ser uma janela aberta ao mundo se converte em uma vitrine para exibir o próprio narcisismo.
“A internet oferece uma oportunidade para favorecer o encontro com os outros, mas pode também aumentar nosso auto-isolamento, como uma teia de aranha que acaba nos prendendo. Os jovens são os mais expostos à ilusão de pensar que as redes sociais satisfazem completamente no plano relacional; se chega assim ao perigoso fenômeno dos jovens que se convertem em ‘ermitões sociais’, com o risco de se afastar completamente da sociedade. Esta dramática dinâmica revela uma grave lesão no tecido relacional da sociedade, uma laceração que não podemos ignorar”, continuou.
Neste contexto, Francisco chamou os cristãos a manifestar a comunhão que define sua identidade como crentes, porque – disse – a fé é uma relação, um encontro, e mediante o impulso do amor de Deus se pode comunicar, acolher, compreender e corresponder ao dom do outro.
Destacou que a vida das pessoas cresce em humanidade ao passar de um caráter individual para uma realidade pessoal, já que o autêntico caminho da humanização vai desde o indivíduo que percebe o outro como rival, até a pessoa que o reconhece como companheiro de viagem.
Acrescentou que a imagem do corpo e dos membros lembra que o uso das redes sociais é complementar ao encontro em carne e osso, que se dá através do corpo, do coração, dos olhos, do olhar e da respiração do outro. Assinalou que se a internet for usada como prolongação ou como espera desse encontro, então não se trai a si mesmo e continua sendo um recurso para a comunhão.
Assim, explicou, se uma família usa a internet para estar mais conectada e depois se encontra na mesa e se olha nos olhos, então é um recurso; ou se uma comunidade eclesial organiza suas atividades através da internet, para depois celebrar a eucaristia juntos, então é um recurso. “Se a internet me proporciona a oportunidade para me aproximar de histórias e experiências de beleza ou de sofrimento fisicamente afastadas de mim, para rezar juntos e buscar juntos o bem no redescobrimento do que nos une, então é um recurso”, indicou.
“Esta é a internet que queremos. Uma rede feita não para prender, mas para liberar, para reunir uma comunhão de pessoas livres. A própria Igreja é uma rede tecida pela comunhão eucarística, na qual a união não se funda sobre os ‘likes’ mas sobre a verdade, sobre o ‘amém’ com o qual cada um se une ao corpo de Cristo, acolhendo os demais”, sentenciou.
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Do “like” ao “amém”, perigos e vantagens da internet, segundo Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU