25 Setembro 2018
Os estudos sobre o monoteísmo de Raffaele Pettazzoni (1883-1959), um dos maiores historiadores das religiões, ainda são preciosos. As suas pesquisas continuam sendo uma referência: não apenas os ensaios dedicados aos cultos primitivos, mas também aqueles sobre os chamados superiores. Livros como Dio: formazione e sviluppo del monoteismo [Deus: formação e desenvolvimento do monoteísmo] (Società Editrice Athenaeum, 1922) ou L’onniscienza di Dio [A onisciência de Deus] (Einaudi, 1955) contêm observações não superadas pelas últimas teses sobre a origem dessa concepção religiosa.
O comentário é de Armando Torno, publicado por Il Sole 24 Ore, 23-09-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Agora as questões se ampliaram. O egiptólogo alemão Jan Assmann investiga as relações entre monoteísmo e violência; o antropólogo francês René Girard escreveu no livro “Coisas ocultas desde a fundação do mundo” (Paz e Terra, 2008): “O sagrado é a violência”.
Não é o caso de reportar todas as suposições sobre a origem do politeísmo ou do monoteísmo. Basta acrescentar que o faraó Amenofi IV (ou Amenhotep IV, que viveu no século XIV antes de Cristo), em honra ao Deus único, quis se chamar Akhenaton. Recuperou uma divindade, a mesma que, na época das grandes pirâmides, figurava entre as secundárias; transformou-a no culto central do Panteão egípcio, até fazer com que ela sustentasse uma religião monoteísta.
Aton, o disco solar, tendo sido um dos muitos deuses, reencontrou-se sendo Deus. O faraó foi mais longe, tornando-se a única ligação entre Ele e os homens, levando às extremas consequências o confronto com a poderosa casta sacerdotal do velho deus Amon.
A tais fatos, alguns acrescentam que é preciso comparar a forte correspondência entre o hino a Aton (que se considera que foi escrito de próprio punho pelo faraó) e o Salmo 104 da Bíblia. No entanto, preferimos retornar a Pettazzoni: dele, editado por Giovanni Casadio, foi publicada pela editora Mimesis uma coletânea de artigos intitulada Storia delle religioni e mitologia [História das religiões e mitologia]. Um pequeno texto aí apresentado, publicado em Tübingen em 1930, intitula-se “Monoteísmo e politeísmo”.
Relatamos a conclusão de Pettazzoni: “Os maravilhosos destinos de Javé como representante de um monoteísmo ético talvez estejam contidos em germe no aspecto vingador e punidor de um ser celestial primitivo, que se desenvolveu depois em um deus supremo do céu que se manifesta na tempestade. Alá, doador da chuva (Sura 29, 63) e onisciente (Sura 58, 8; 57, 3 ss.), provavelmente, também é um antigo deus do céu preexistente a Maomé. Os fundadores das grandes religiões monoteístas não revelaram ex novo os respectivos deuses, mas – exceto Jesus, que surgiu em um ambiente já monoteísta – sublimaram ao grau de deuses absolutamente únicos aqueles que, nos politeísmos anteriores, já eram deuses supremos, porque eram deuses do céu, que, por sua vez, remontam verossimilmente a primitivos seres celestes pré-politeístas”.
O que acrescentar? Simplesmente que a tese de Pettazzoni ajuda a compreender reavaliações atuais sobre o politeísmo, entendido como religião de alto perfil, além de fé tolerante. Nos tempos de Jesus, em Roma, conviviam centenas de cultos, e todos podiam ser praticados, se não violassem as leis do império.
Há alguns dias, também na Itália, foi publicada a tradução do ensaio de Catherine Nixey, Nel nome della croce [Em nome da cruz] (Bollati Boringhieri), dedicado à destruição realizada pelo cristianismo, começando no século IV, do mundo clássico e da religião greco-romana. Essa estudiosa, formada em Cambridge, descreve o momento em que os cristãos se tornaram perseguidores e intolerantes.
Além disso, quando uma fé declina (com a sua civilização), desponta a violência, que permite que outra ocupe o seu lugar. A religião sempre se transforma em política. Ontem como hoje.
Raffaele Pettazzoni. Storia delle religioni e mitologia. Milão: Mimesis, 280 páginas.