30 Abril 2018
“Padre, o senhor não deve se meter na política”. Pode-se censurar um padre? Pode-se demitir a figura que, por definição, deveria ser a consciência crítica de uma comunidade? O Speaker republicano, Paul Ryan, conseguiu fazer pelo menos uma coisa sem precedentes e pela qual será lembrado: mandar embora o capelão da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos.
A reportagem é de Giuseppe Sarcina, publicada por Corriere della Sera, 29-04-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Há duas semanas, ele instruiu o Pe. Patrick Conroy a deixar o cargo imediatamente, mesmo que faltassem poucos meses para a aposentadoria. E, em um primeiro momento, os deputados pensaram que o sacerdote, de 67 anos, havia decidido se retirar, abandonando a função assumida em 2011.
Mas, na quinta-feira, 26 de abril, com uma entrevista ao New York Times, o Pe. Patrick contou como foi, desencadeando um duro choque entre os parlamentares.
A história começou em novembro passado, quando o Pe. Conroy guiou a oração no Congresso, na época lidando com a polêmica reforma tributária. Discutia-se sobre o corte de impostos, entre muitas outras controvérsias. O religioso se dirigiu aos legisladores com estas palavras: “Tentem garantir que não haja vencedores e perdedores com essas novas normas, mas sim benefícios equilibrados e compartilhados por todos os estadunidenses”. Logo depois, o reverendo foi chamado por Paul Ryan, que o intimou, sem muitos elogios, a “ficar de fora”.
Ainda de acordo com o New York Times, haveria outra razão, ainda mais insidiosa. Em uma entrevista ao The National Journal, o capelão havia tocado o tema das agressões sexuais, um fenômeno disseminado também na Câmara dos Representantes. Além disso, ele havia descrito nestes termos as características do político médio: “Quem são as pessoas que competem por um cargo público? São realmente as mais qualificadas? Não, não são. Muitas delas, eu posso lhe dizer, nem sabem como se cumprimentar nos corredores, sem falar do modo como tratam seus colaboradores”.
É claro, Conroy tem uma personalidade forte. Ele cresceu em Arlington, não muito longe de Washington. Estudou filosofia e direito, antes de frequentar a escola de teologia dos jesuítas na Universidade de Santa Clara, na Califórnia. Tornou-se sacerdotes aos 33 anos, depois de uma experiência como advogado de defesa a serviço dos nativos americanos e dos refugiados em San Salvador.
Eis como ele interpretava seu papel como capelão na Câmara: “Eu não devo me ocupar da vida religiosa dos legisladores. Cada um segue sua fé. Eu sou apenas um conselheiro espiritual”.
Um “conselheiro” pesado demais para o Speaker. Ryan, 48 anos, está muito atento à sua imagem de conservador católico, moderado, dialogante. Há algumas semanas, anunciou que não se candidataria novamente às eleições de meio de mandato em novembro: “Quero estar mais perto dos meus filhos adolescentes”.
Em Washington, ao contrário, acredita-se que ele quis sair do tumultuado carro trumpiano para voltar, depois, como a alternativa republicana para a Casa Branca. Tudo isso explica a confusão causada pelo caso Conroy: mas Ryan realmente o expulsou? O porta-voz do líder republicano informou que havia muitas reclamações sobre a atividade pastoral do padre e que, “no fim, foi tomada a melhor decisão no interesse da Câmara”. Curioso: parece uma releitura dos tuítes de Donald Trump quando afastou o diretor do FBI, James Comey.
Os republicanos pediram, por vias breves, explicações mais convincentes. Enquanto 147 democratas e um conservador protestaram com uma carta oficial. O caso está se ramificando, revelando as tensões entre republicanos católicos do Norte e evangélicos dos estados do Sul.
Mas as divisões também cruzam o próprio mundo católico. A Catholic Association está do lado de Ryan: a área mais conservadora considera os jesuítas como “liberais demais”. Do Papa Francisco até o capelão Patrick.
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Câmara dos Representantes dos EUA demite o capelão jesuíta Patrick Conroy - Instituto Humanitas Unisinos - IHU