10 Julho 2017
“O fantasma arcaico de Temer, transitando nos salões do G 20, sob a indiferença dos principais líderes políticos do mundo, mostra a irrelevância do Brasil, hoje, no teatro global. Mostra a impropriedade dos atalhos, até mesmo para os projetos neoliberais, bem como a pobreza moral e política das nossas classes dominantes, que não só não tem um projeto de nação com um mínimo de Justiça Social – mesmo dentro do sistema do capital – como sequer tem civilidade política, para encaminhar seus projetos de poder dentro dos parâmetros da democracia formal do Estado de Direito”, escreve Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande do Sul – PT, em artigo publicado por Sul21, 10-07-2017.
Segundo ele, “a transição de Temer para Maia, não nos promete nem mais seriedade e legalidade na luta contra a corrupção, nem a garantia de um pleito justo em 2018, pois as mesmas forças que “elegeram” e sustentaram Temer, estão transitando impávidas para um novo acordo de estabilidade na exceção”.
A aliança idealizada pelo oligopólio da mídia, do “baixo-clero” da política – que governa sempre com quem está no poder – com os partidos e frações de partidos formais que defendem as reformas que o mercado deseja – independentemente do genocídio social que elas causem – somados à Fiesp e aos ideólogos liberal-rentismo – gerentes das agências de risco e especuladores universais – esta aliança, ruiu. A sua dor se espalha pelas ruas, com crianças voltando às sinaleiras, desempregados esmolando e sendo cooptados pelo crime, jovens sem esperança quebrando vidraças e futuros. Nem uma pequena dose de social-democracia cabocla, a direita odiosa aceitou para compor uma sociedade menos desigual e injusta.
A aliança pode ser recomposta num novo patamar de manipulação da informação, pelo qual os antigos promotores do golpe abdicam do seu desvelo amoroso pelo presidente Temer e encaminham um novo fantoche, para manter os seus propósitos. E este não é fazer as reformas para o país andar, mas fazer as “suas” reformas, para liquidar a ideia de nação socialmente justa e minimamente coesa, no festim do capital financeiro, “dono” da dívida pública. Querem exemplos? Vejam o tratamento à Amazônia, ao sistema de defesa do Atlântico Sul, que envolve a soberania sobre o pré-sal e o tipo de reformas que querem fazer na Legislação Trabalhista e na Previdência.
O fantasma arcaico de Temer, transitando nos salões do G 20, sob a indiferença dos principais líderes políticos do mundo, mostra a irrelevância do Brasil, hoje, no teatro global. Mostra a impropriedade dos atalhos, até mesmo para os projetos neoliberais, bem como a pobreza moral e política das nossas classes dominantes, que não só não tem um projeto de nação com um mínimo de Justiça Social – mesmo dentro do sistema do capital – como sequer tem civilidade política, para encaminhar seus projetos de poder dentro dos parâmetros da democracia formal do Estado de Direito. Atalham, para tirar uma presidenta honesta, designam um grupo de investigados e denunciados para governar o país e, a seguir, retiram-nos para designar outro grupo, sem vergonha e sem lei.
Juan Gelman pergunta, num dos seus poemas mais belos: “amor que serena, termina? \começa? que nova \velhice o espera para viver?\. Este poema me veio à mente quando vi o passeio de Temer no G 20, como um triste presidente que pensou que liderava alguma coisa e era um mero instrumento dos poderes nem tão invisíveis do mercado. O mesmo que agora precisa livrar-se dele para tentar criar um novo espaço de legitimidade, pois sua tarefa não era governar, mas fazer as reformas, que hoje necessitam de um novo impulso de pseudo-legitimidade para se realizarem.
Se retirarem Temer, como é esperado, vão constituir uma nova aura amorosa e devota, esperançosa e fraterna, em torno de um deputado que foi eleito com 53 mil votos, sem história e sem relações políticas que vão mais além das instâncias obscuras da elite carioca, assediada por condenações e inquéritos. O amor por Temer “serenou” e “terminou” e agora começa uma “nova velhice” que “espera (Maia) para viver”. A idiotia semeada pelo oligopólio da mídia, que outorgou à esquerda e ao PT todos os males da nação, agora vai cobrar seu preço. Não será pequeno o esforço que deverão fazer nos seus “fóruns” da liberdade, para mostrar que o mercado espera Maia para fazer o país deslanchar. A mentira tem perna curta, mas o coice que ela deu nas esperanças do país vai doer por muito tempo.
No seu livro “El Fango – cuarenta años de corrupción em España” – (Debate, Penguin Randon House, Barcelona, 2015, pg.116) – o ex-magistrado Baltazar Garzòn – aponta as dificuldades de combater a corrupção, já que o sistema de garantias do Estado de Direito, às vezes permite a formação de uma “convicção” sem provas, que “acaba logrando impunidade para os corruptos”, e agrega: “mas assim é o Estado de Direito e as garantias devem ser respeitadas para garantir a segurança jurídica, ainda que às vezes seja custoso assumi-las”. No mesmo livro, Garzòn lembra a condenação a 31 anos de prisão de Luis Roldán, máxima autoridade na área de segurança nos país no Governo Felipe González (Diretor Geral da “Guardia Civil”) entre 1986 e 1993, envolvido em recebimento de propinas para a cessão de obras públicas, tráfico de armas, uso pessoal de fundos secretos de segurança, além da “estafa” nos recursos da Caixa de Órfãos da Guarda Civil.
Evidentemente, a corrupção na Espanha não terminou, porque esta não termina. Nem com campanhas manipuladas, nem com fuzilamentos sumários. É uma luta incessante, em qualquer Estado e em qualquer regime, para reduzir as suas formas mais violentas e grosseiras, que são substituídas por outras mais sofisticadas e “legalizadas”, como aquelas que se dão pela manipulação da taxa de juros no mercado financeiro global. As consequências desta manipulação, que advém para os governos endividados e empobrecidos – corruptos ou não – tornam-se visíveis no plano da disputa política, quando ela versa sobre as funções públicas do Estado, mas, a partir de condenações como a de Roldán -fundada em provas técnicas e testemunhais- a possibilidade de impunidade se torna menor e a sociedade se torna mais exigente.
A transição de Temer para Maia, não nos promete nem mais seriedade e legalidade na luta contra a corrupção, nem a garantia de um pleito justo em 2018, pois as mesmas forças que “elegeram” e sustentaram Temer, estão transitando impávidas para um novo acordo de estabilidade na exceção. E farão isso, tanto nos processos penais que lhes interessam, no apoio às reformas do liberal-rentismo, como na busca de impunidade para os seus preferidos, através das delações premiadas, para não terem a mesma sorte de Roldán. Fazer acordo com Maia é fazer um acordo com quem apunhalou a democracia pelas costas, no episódio da deposição de Dilma. E mais do que isso, é pedir desculpas porque estavam de costas, na hora que o punhal baixou sobre os seus lombos indefesos. E isso seria a derrota superlativa da humilhação.
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Temer findou: lembremos Gelman e Roldán - Instituto Humanitas Unisinos - IHU