06 Junho 2017
Inserido no meio de MP sobre relicitações, artigo isenta bancos de responderem sobre os riscos e impactos ambientais na hora de conceder crédito à projetos de infraestrutura.
Medida impediria, por exemplo, a multa que Santander recebeu por financiar plantio em área embargada na Amazônia.
A reportagem é de Aldrey Riechel, publicada por Amazônia.org, 02-06-2017.
Ao transformar em Projeto de Lei de Conversão a Medida Provisória que trata sobre prorrogação e relicitação dos contratos de concessões de transporte o relator, deputado Sergio Souza, inseriu um artigo que isenta as instituições financeiras de responderem por danos socioambientais nos contratos de parceria. O projeto aguarda sanção presidencial.
O artigo inserido, de número 35, define que as instituições financeiras “somente responderão por dano ambiental nos contratos de parceria, se comprovado dolo ou culpa, bem como a relação de causalidade entre sua conduta e o dano causado”, indo na contramão de políticas de salvaguardas ambientais desenvolvidas pelo Brasil durante os últimos anos.
Nota técnica elaborada por organizações ambientais e protocolada na Presidência da República alerta que a medida afronta preceitos constitucionais, dificulta a implementação de políticas de responsabilidade socioambiental no setor financeiro, promove o financiamento de atividades ilícitas e danosas ao meio ambiente e serve como propulsor do desmatamento. Assinam a nota Conectas, Instituto Socioambiental, Greenpeace e Amigos da Terra – Amazônia Brasileira.
Clique aqui para ler a nota técnica na íntegra.
Mauro Armelin, diretor executivo da Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, afirma que “esse artigo desobriga os bancos a terem mais responsabilidade socioambiental em seu processo de concessão de crédito, podendo se dedicar somente a analisar o risco que assumem de não receber de volta o dinheiro que investiram. Isso seria um grande retrocesso nas práticas de financiamento responsável que no mundo todo é encarada como um vetor do desenvolvimento sustentável”. (leia o artigo sobre o artigo 35, aqui).
Ao justificar a inserção do artigo, o relator, que é presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara, escreveu que “instituições financeiras e entidades governamentais de fomento que financiem empreendimentos que, porventura, gerem dano ambiental têm sido solidariamente responsabilizadas por tais danos e têm sido chamadas a arcar com os prejuízos decorrentes. Isto é evidentemente um grave inibidor dos financiamentos na área de infraestrutura”.
O argumento ignora a legislação atual que se baseia no princípio do poluidor-pagador como forma de assegurar o direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto pela Constituição. O paragrafo terceiro determina que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
A Política Nacional do Meio Ambiente também regula o tema e determina que qualquer poluidor é obrigado, “independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”. O próprio Banco Central possui uma Política de Responsabilidade Socioambiental, que todas as instituições financeiras devem seguir.
O deputado Sérgio Souza (PMBD/PR) faz parte de quatro bancadas no Congresso, segundo levantamento da Agência Pública: Evangélica, Ruralista, Empresarial e de Parentes de Políticos. Ele também teve seu nome citado em grampos da Operação ‘Carne Fraca’, que investiga irregularidades na cadeia produtiva agropecuária. Os pagamento indevidos seriam para atender os interesses de empresas e evitar a fiscalização adequada das atividades.
Desde 2015 o Supremo Tribunal Federal definiu a ilegalidade dos contrabando legislativo, conhecidos como “jabutis” a prática consiste em inserir emendas parlamentares sem qualquer relação de conteúdo com as Medidas Provisórias submetidas à votação no legislativo. A ministra Rosa Weber, que votou a Ação Direta de Inconstitucionalidade, classificou a ação como antidemocrática, pois “subtrai do debate público e do ambiente deliberativo próprios ao rito ordinário dos trabalhos legislativos a discussão sobre as normas que irão regular a vida em sociedade”.
A nota técnica ressalta que “o mencionado art. 35 não tem qualquer relação com o objeto da MP nº 752/2016: enquanto o objeto da MP se refere às regras de concessões no setor de transportes, o art. 35 do PLV nº 3/2017 versa sobre o tema da responsabilidade civil ambiental das instituições financeiras”.
Outro ponto levantado seria “o princípio do não retrocesso estabelece vedação à realização de atos ou adoção de medidas legais que diminuam o nível de proteção dos direitos fundamentais”. O artigo 35, tornaria inoperante “o sistema de responsabilização civil ambiental, responsável não apenas pela reparação, mas principalmente pela prevenção de danos”.
Organizações ambientais, indígenas, de direitos humanos e do campo se reuniram em um movimento chamado #Resista, que alerta a população sobre os retrocessos socioambientais proposto pela bancada ruralistas nos últimos meses. Entra as medidas estão as MP 756 e 758, que reduzem a proteção à unidades de conservação, alterações no licenciamento ambiental e a criminalização de movimentos sociais.
Hoje às 11 horas da manhã acontece um twittaço contra os retrocessos ambientais. Participe usando #resista ou #RetrocessoAmbientalNão.
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Organizações pedem que Temer vete medida que isenta bancos de punição por dano ambiental - Instituto Humanitas Unisinos - IHU