27 Abril 2017
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira, dia 26, a reforma trabalhista do Governo Michel Temer (PMDB). O projeto de lei que faz a maior alteração nas regras envolvendo patrões e empregados em sete décadas foi aprovado por 296 votos a favor e 177 contra. A proposta será enviada ao Senado Federal depois que os deputados aprovarem os destaques que ainda precisam ser analisados. A expectativa do Governo é que ainda no primeiro semestre deste ano a reforma também seja aprovada pelos senadores. O placar é considerado um termômetro para outra votação estratégica: na próxima semana, o embate, bem mais difícil, será em torno da reforma da Previdência. Para aprovar alteração nas aposentadorias da grande maioria dos trabalhadores brasileiros serão necessários mais do que a maioria simples desta quarta, ou 308 votos da maioria qualificada em dois turnos de votação.
A reportagem é de Afonso Benites, publicada por El País, 26-04-2017.
A fácil vitória da base aliada do peemedebista foi marcada por uma tumultuada e demorada sessão. Foram mais de dez horas de debates. Sem votos para rejeitar a proposta, a oposição tentou obstruir a votação de todas as maneiras. Fez uma série de protestos, com cartazes, faixas, cruzes e caixões de papelão tentando mostrar que as alterações representam “a morte” da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Uma das discussões durante a sessão foi a de não deixar a votação ser nominal. Ou seja, os deputados da base de Temer queriam uma votação simbólica, sem que os nomes dos parlamentares aparecessem como voto favorável ou contrário ao projeto. O temor era serem vítimas dos manifestantes que convocaram a greve geral para a próxima sexta-feira, dia 28, tanto contra a reforma trabalhista como a da Previdência. A mobilização que cresce em adesão tenta transformar em resistência ativa a impopularidade do presidente Temer - sua aprovação caiu a apenas 4% segundo o instituto Ipsos - e será um teste para a capacidade das ruas de influenciarem as decisões do Congresso nas próximas semanas.
A reforma trabalhista, se aprovada no Senado, acabará com a contribuição sindical obrigatória, determina que o que for negociado entre patrões e empregados prevalece sobre a legislação e dificultará o acesso dos servidores à Justiça do Trabalho. O texto cria uma jornada intermitente de serviço, regulariza o home office e exclui os sindicatos das homologações de demissões, entre outros tópicos. Assim como no Congresso, o proposta contrapõe especialistas no assunto. "A reforma como um todo foi olhada sob um viés do empregador, com coisas boas e ruins para a sociedade. Mas o problema é que não conseguimos ter um debate forte sobre o tema. Foi uma reforma açodada. Não há dúvidas que os trabalhadores saem perdendo", disse Ricardo Guimarães, mestre em direito do trabalho e professor da PUC- SP. Já Adauto Duarte, conselheiro do Instituto Via Iuris de Direito do Trabalho, elogia: "Sob a ótica do direito coletivo achamos a proposta muito equilibrada, porque a prevalência do acordo sobre o legislado já tinha sido dada pelo STF. A novidade é a lista do que não pode ser negociado. De um lado protege o trabalhador e do outro, para quem negocia (seja sindicatos ou empresas) aumenta a segurança jurídica. As regras ficam mais claras".
Em vários momentos, o plenário da Câmara parecia uma sala de aula em que o professor não tinha o mínimo controle sobre os estudantes indisciplinados. Ninguém escutava o orador, vaias eram ouvidas a todo momento e Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente da Casa, se cansou de pedir respeito, sen êxito. Os gritos de Fora Temer eram constantes no plenário. O deputado Assis Melo (PCdoB-RS) chegou a usar um uniforme de metalúrgico, que é a sua profissão original, e foi repreendido por Maia enquanto protestava contra a reforma. A lógica do presidente da Câmara é que o regimento interno da Casa prevê que os parlamentares têm de usar traje passeio completo, ou seja, terno e gravata.
Os opositores à gestão Temer repetiram à exaustão que as mudanças nas leis trabalhistas retiram direitos dos trabalhadores. Por outro lado, os aliados do Governo defendiam que as alterações modernizam a legislação e facilitarão a criação de emprego quando vier a retomada econômica. O líder da oposição, José Guimarães (PT-CE), disparou: “Só faltou um artigo neste projeto de lei: está revogada a CLT a partir desse momento”. Ao que o deputado Nogueira respondeu: “Nenhum direito foi revogado. A reforma quer garantir igualdade para todos os trabalhadores brasileiros”.
Enquanto os debates se intensificavam, lobistas vinculados a sindicatos patronais e laborais transitavam entre os deputados no plenário pedindo que vários deles apresentassem emendas parlamentares ao projeto, algo similar ao que ocorreu na comissão especial que debateu o tema, na terça.
Um levantamento feito pelo site The Intercept Brasil concluiu que entre os principais interessados nessa reforma trabalhista estavam entidades que representam bancos, indústrias e o setor de transportes. O jornal online examinou as 850 emendas apresentadas por 82 deputados durante a discussão do projeto na comissão especial. Dessas propostas, 292 (34,3%) foram integralmente redigidas em computadores de representantes da Confederação Nacional do Transporte (CNT), da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística). O relator, Rogério Marinho (PSDB-RN), segundo a reportagem acatou 52,4% das emendas. Na terça-feira, o EL PAÍS mostrou que lobistas da CNI municiavam deputados da comissão com algumas dessas emendas.
Apesar do placar expressivo, os principais partidos da base do Governo, que representam 313 votos, registraram 57 traições. Nenhuma dessas legendas votou totalmente fechada com a gestão Temer. Apenas para ficar nos maiores, que têm representantes em ministérios: dos 59 deputados votantes do PMDB, sete foram contra a reforma trabalhista. No PSDB, os números foram 44 votantes, um contrário. No PP, 43 votos, sendo nove contra. No PR, foram 7 defecções entre os 35 deputados. No PPS, três dos nove legisladores foram contrários. No PSB, 16 dos 30 parlamentares estiveram contra Temer. No PSD foram cinco dos 34. E no PTB, quatro entre 17.
Foi tendo como pano de fundo esse cenário que Temer quis se cercar de cuidados para garantir o resultado. Exonerou quatro de seus ministros que são deputados federais para não ter o risco de ter quatro votos a menos entre sua própria base.
Retornaram à Câmara os ministros da Educação, Mendonça Filho (DEM-PE), das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), das Minas e Energia, Fernando Coelho Filho (PSB-PE) e do Trabalho, Ronaldo Nogueira (PTB-RS).
O retorno de Nogueira foi cercado de simbolismo. Afinal, como ministro do Trabalho, ele queria dar o peso de seu cargo para dizer ao trabalhador que seus “direitos serão preservados”. Além disso, sua exoneração retirou o voto de Assis Melo, o deputado comunista que protestou usando o uniforme de metalúrgico. Melo é suplente de Nogueira na Câmara e a volta do ministro o retirou da lista de deputados.
A mesma medida, de exonerar os ministros, será adotada por Temer na semana que vem, quando até 13 ministros podem voltar ao Legislativo para votar a reforma da Previdência, na terça e na quarta-feira. Os dias de agenda frenética no Congresso estão só começando.
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Às vésperas de greve geral, reforma trabalhista é aprovada na Câmara - Instituto Humanitas Unisinos - IHU