07 Outubro 2016
Mais uma pergunta em uma manchete do New York Times e explode o alvoroço. Se aquela interrogação da edição especial de 26 de julho do ano passado tinha marcado uma época ("Será o fim do cristianismo no Oriente Médio?"), desta vez, a pergunta é mais direta e pessoal: "O Papa Francisco fracassou?".
A reportagem é de Maria Teresa Pontara Pederiva, publicada no sítio Settimana News, 02-10-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O artigo de Matthew Schmitz, editor da revista de cultura religiosa First Things, publicado na edição do dia 29 de setembro, apresenta, na verdade, um cenário totalmente estadunidense (que, nos últimos anos, tinha visto em ação os chamados "bispos guerreiros", depois induzidos a deporem as armas), mas significativo em reflexões – e, às vezes, acusações explícitas – nada novas também no contexto europeu por parte dos detratores do atual pontífice (basta pensar na carta de verão dos 45 teólogos, filósofos e historiadores com as "doutas" críticas à Amoris laetitia), sem nem mesmo o benefício da dúvida que o jornalista estadunidense deliberadamente inseriu com aquele ponto de interrogação.
Quando o Papa Francisco subiu à cátedra de São Pedro, em março de 2013, o mundo o olhou com admiração, começa a análise. Eis, finalmente, um papa em sintonia com os tempos, um homem que, à forma, prefere os gestos espontâneos, como pagar a conta do hotel e recusar os sapatos vermelhos. Em vez de se mudar para os apartamentos papais, ele foi morar em uma pequena pensão destinada a acolher os hóspedes do Vaticano. E, além disso, inaugurou um novo discurso não dogmático com afirmações como: "Quem sou eu para julgar?".
Diversos observadores especularam que o calor, a humildade e o carisma do novo papa produziriam uma espécie de "efeito Francisco", trazendo novamente à Igreja os católicos descontentes, e pode-se dizer que, mesmo depois de três anos de pontificado, os auspícios se repetem.
No inverno passado, Austen Ivereigh, autor de uma biografia do Papa Francisco, escreveu que a posição "mais suave" do papa sobre a questão da comunhão aos divorciados recasados "poderia desencadear um retorno às paróquias em grande escala".
"Desde os primeiros dias de pontificado, Francisco trabalha para trazer os protestantes de volta ao redil, mas ele será capaz de fazer o mesmo com aqueles católicos exasperados com o escândalo dos abusos de menores ou com as guerras culturais?"
"De certa forma, as coisas realmente mudaram", escreve Schmitz, referindo-se ao contexto do seu país. "A percepção do papado, ou ao menos do papa, melhoraram. Francisco é muito mais popular do que o seu antecessor, o Papa Bento XVI. Cerca de 63% dos católicos estadunidenses aprovam-no, enquanto apenas 43% aprovavam Bento no auge da sua popularidade, de acordo com uma pesquisa realizada pelo New York Times e pela CBS News em 2015. Francisco também deu uma grande ênfase no diálogo com os católicos descontentes."
"Mas os católicos estão realmente voltando para a Igreja?", é a pergunta final. "Nos Estados Unidos, ao menos, isso ainda não aconteceu." Os novos resultados da pesquisa do Centro para a Pesquisa Aplicada ao Apostolado de Georgetown sugerem que não houve nenhum "efeito Francisco". Em 2008, 23% dos católicos estadunidenses participavam da missa dominical. Oito anos mais tarde, a participação na missa permaneceu estável ou até mesmo diminuiu ligeiramente, para 22%.
É claro, continua o artigo, os Estados Unidos representam apenas uma parte de uma Igreja global. No entanto, é significativo aquilo que os pesquisadores da Georgetown descobriram: alguns comportamentos de observância religiosa são mais fracos hoje entre os jovens católicos do que com Bento XVI. Por exemplo: em 2008, 50% dos Millennials (entendidos como a geração nascida nos anos 1980 e 1990, ou seja, os jovens-adultos ou a Geração Y) relataram ter recebido as cinzas na Quarta-Feira de Cinzas, e 46% reconheciam ter se abstido de carne, de algum modo, nas sextas-feiras. Este ano, apenas 41% relataram ter recebido as cinzas, e apenas 36% se abstiveram nas sextas-feiras. "Apesar da popularidade pessoal de Francisco, os jovens parecem ainda estar à deriva em termos de fé", é a conclusão.
"Por que a popularidade do papa não revigorou a Igreja? Talvez seja muito cedo para julgar", reconhece Schmitz, acrescentando: "Provavelmente não teremos uma medida real do efeito Francisco enquanto a Igreja for regida por bispos nomeados por Bergoglio e por padres que adotam a sua abordagem pastoral. E isso vai levar anos ou décadas."
Ou pode haver algo diferente. Francisco é um jesuíta e, como muitos membros de ordens religiosas católicas, ele tende a ver a Igreja institucional, com as suas paróquias, dioceses e estruturas quase como um obstáculo às reformas. Ele descreve os párocos como "monstrinhos" que "jogam pedras" contra os pobres pecadores. Aos empregados da Cúria, ele atribuiu um diagnóstico de "mal de Alzheimer espiritual". Repreendeu os ativistas pró-vida por causa de uma "obsessão" deles sobre o aborto; definiu como "pelagianos" aqueles que acreditam, hereticamente, que podem ser salvos pelas suas próprias obras.
Todas essas denúncias acabam desmoralizando os fiéis católicos, sem fornecer aos descontentes qualquer motivo para voltar. Por que voltar a fazer parte de uma Igreja cujos padres são monstros e cujos membros gostam de jogar pedras? Quando o próprio papa enfatiza a inutilidade de uma observância ritual, não há qualquer motivo para ir se confessar ou para se levantar para ir à missa.
"Até mesmo os fãs mais ardorosos de Francisco temem que a sua agenda esteja atrasada. Quando foi eleito, ele prometeu uma limpeza das corruptas finanças do Vaticano. Três anos mais tarde, ele começou a recuar diante da oposição, abrindo mão de uma auditoria externa e tomando os poderes dos seus homens escolhidos a dedo. Francisco também evitou grandes mudanças em matéria de doutrina. Em vez de endossar explicitamente a comunhão para os casais divorciados e recasados, eles silenciosamente lhes estimulou com uma piscadela e um aceno de cabeça."
"Francisco construiu a sua popularidade às custas da Igreja que ele lidera", é a conclusão. "Aqueles que querem ver uma Igreja mais forte terão que esperar por outro tipo de papa. Em vez de tentar suavizar o ensinamento da Igreja, tal homem precisaria falar sobre o modo pelo qual disciplinas duras podem levar à liberdade. Enfrentar uma época hostil como a nossa com as estranhas afirmações da fé católica, talvez, pode não ser popular, mas, ao longo do tempo, pode se revelar mais eficaz. Até mesmo Cristo se deparou com as vaias da multidão."
Em tempo real, no dia 30 de setembro, chegou a resposta dos jesuítas da revista America, em um artigo de Sam Sawyer, SJ. "Aquilo que os números podem e não podem nos dizer sobre o Papa Francisco e a Igreja".
"É verdade, os dados falam por si mesmos. Desde 2008, quando o Papa Bento XVI ocupou a cátedra de São Pedro, houve uma queda de 10 pontos percentuais no número de Millennials estadunidenses que receberam as cinzas na Quarta-Feira de Cinzas e um declínio semelhante entre aqueles que fazem o sacrifício quaresmal indo além da abstinência de carne às sextas-feiras. Não há nada de bom a dizer sobre essas tendências. Schmitz está certo em dizer que ignorar as partes corpóreas do culto nos torna mais fracos. Mas, como estatístico, eu não tenho tanta certeza de que esse tipo de números são a prova da fraqueza do papado de Francisco."
O jesuíta traz um exemplo da parcialidade de se confiar exclusivamente aos dados de uma pesquisa. Vejamos a participação nos ritos quaresmais, sempre por parte da mesma faixa etária, no que diz respeito aos outros cristãos: aumentou ou diminuiu?
"Eu não sei a resposta, mas eu ficaria surpreso se são apenas os católicos que estão diminuindo nessas taxas." Os Millennials estão se secularizando muito rapidamente. Quer Francisco esteja fazendo melhor ou pior em comparação com Bento, um declínio na prática religiosa não é tão surpreendente."
É preciso, então, procurar uma pergunta mais indicativa: "Qual seria uma medida melhor do sucesso de um papado em particular?", pergunta-se Sawyer, contanto a aposta de um amigo ateu que, há três anos, previa o papa de Bergoglio como "um mal para a Igreja estadunidense".
"A Igreja Católica Romana não existe para ser relativamente mais bem sucedida do que outras fés, mas para nos oferecer a graça de Deus nos sacramentos."
E ainda: "Três anos do pontificado de Francisco são suficientes para julgar se a sua abordagem é eficaz ou não?".
"Em seu recente editorial, Matthew Schmitz reconhece que perguntar se o Papa Francisco fracassou ou não pode ser prematuro. No entanto, em vez de imaginar como seria essa abordagem pastoral a partir de um ponto de vista da vida da Igreja, Schmitz castiga o Papa Francisco pelo que ele vê como o seu desrespeito pela Igreja institucional, que ele atribui à formação jesuíta de Francisco e o seu foco na espiritualidade interior em detrimento da observância ritual."
Com essa abordagem, é quase inevitável concluir que Francisco fracassou, porque se imagina a sua eficácia e, consequentemente, a eficiência da Igreja e do Evangelho de forma restritiva demais. Pressupõe-se – continua o jesuíta – um modelo comparativo entre os católicos comprometidos contra um mundo em rápida secularização e se imagina o sucesso em termos de vitória nesse fronte. Com base nesse modelo, esperamos que aquilo que um papa deveria fazer é convencer mais pessoas de que a Igreja está certa e de que a laicidade está errada.
"Mas há outras maneiras de pensar sobre o confronto com o mundo secular, sem assumir uma batalha em que apenas um lado é o vencedor." Desde os primeiros dias do seu pontificado, Francisco começou um caminho diferente, do qual ainda não é possível ver os frutos. Portanto, é totalmente legítimo pôr em discussão a sabedoria da sua abordagem, mas não é correto decretar o seu fracasso, simplesmente porque ele não pretendeu combater em alguns temas.
Francisco havia descrito claramente os termos do seu compromisso por ocasião do seu discurso aos cardeais antes do conclave no qual ele foi eleito: uma Igreja que "evangeliza e olha para fora", em vez de se curvar sobre si mesma e viver para si mesma.
"Schmitz pensa que aqueles que querem ver uma Igreja mais forte vão ter que esperar por um tipo diferente de papa. Ele parece estar disposto a dar a esse tipo de papa tanto tempo quanto for necessário para ele ser eficaz. De fato, a sua esperança é uma boa descrição de como São João Paulo II e Bento XVI fortaleceram a Igreja, razão pela qual devemos estar profundamente grato a eles. No entanto, mesmo ao longo dos 35 anos dos seus papados somados, a prática religiosa diminuiu no mesmo ritmo tanto quanto nos primeiros três anos de Francisco."
Não existe apenas uma maneira para fortalecer a Igreja e os comportamentos que levam a envolver o mundo através da compaixão e da misericórdia não são menos exigentes do que aqueles voltados a combatê-lo e corrigi-lo. "Em vez de sonhar com um papa diferente, talvez devêssemos tentar olhar para um tipo diferente de força, até mesmo naquela fraqueza divina que 'é mais forte do que a força humana'" (1Co 1, 25).
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O Papa Francisco fracassou ou não? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU