22 Agosto 2016
"Em primeiro lugar, a palavra mais comum que ouvi foi esta: “Presença”. Eles acham que o papa não quer que o clero seja um conjunto de burocratas, e sim pastores. Praticamente todos com os quais me encontrei disseram estar buscando formas para serem mais presentes junto ao povo nas circunstâncias da vida diária", escreve John L. Allen Jr., jornalista, em artigo publicado por Crux, 19-08-2016 A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Eis o artigo.
Em contato com padres e bispos de todo o mundo no mês passado, a impressão básica que eles parecem estar tendo do Papa Francisco pode ser expressa em três palavras: presença, misericórdia e serviço.
No mês passado, pude interagir com uma parcela ampla do clero católico. Passei duas semanas em Cracóvia, Polônia, cobrindo a Jornada Mundial da Juventude, e depois vários dias em Toronto na convenção anual dos Cavaleiros de Colombo. Na semana passada, estive em Santa Barbara, Califórnia, onde passei alguns dias com o bispo auxiliar Robert Barron e sua equipe.
Uma coisa sobre o catolicismo que às vezes é um pouco difícil de ser compreendido por quem é de fora é que, embora a política certamente faça parte da vida da Igreja, há muito mais coisas envolvidas aí. Os católicos, talvez o clero em particular, têm também uma lente espiritual para avaliar as vicissitudes da vida, incluindo a liderança de quem quer que venha a ser o papa em um dado momento.
Naturalmente, os católicos têm as suas próprias perspectivas políticas pessoais, o que modela inevitavelmente a maneira como veem os pronunciamentos ou gestos papais. A maioria deles, no entanto, também acredita que o papa está lá porque Deus quis exatamente isso, portanto, eles tentam, dentro dos limites de seus próprios instintos e visões de mundo, escutá-lo com atenção e seguir a sua liderança.
Nos encontros que tive recentemente – com padres e bispos americanos, europeus, australianos, ingleses, africanos, asiáticos, latino-americanos e do Oriente Médio –, em algum momento eu fazia esta pergunta: “Qual o impacto que o Papa Francisco está tendo sobre o senhor?”
Muitos padres disseram que consideram Francisco como uma confirmação do que eles já estavam tentando fazer, em termos de ser pastores próximos das experiências do povo. Mostravam-se alegres pelo fato de que o papa está tocando os corações do mundo e chegando até os que se encontram distanciados da fé. Para eles, é isso que de se trata o catolicismo.
Este entusiasmo é muitas vezes maior entre os padres mais velhos, aqueles mais ligados ao Concílio Vaticano II (1962-1965).
Para outros membros do clero, especialmente os padres e bispos mais jovens que poderiam tender a se identificar como líderes ao estilo “João Paulo II” ou “Bento XVI”, Francisco tem representando uma pequena pedra no sapato. (Isso acontece apesar de Francisco ter rejeitado as tentativas de colocá-lo em oposição a qualquer um de seus antecessores).
Praticamente todos, no entanto, afirmam que, de alguma forma, estão tentando descobrir o que o papa quer e como pôr suas ideias em prática da melhor maneira possível.
Eis o que ouvi em geral quanto ao que o clero acredita que o papa está querendo fazer.
Em primeiro lugar, a palavra mais comum que ouvi foi esta: “Presença”. Eles acham que o papa não quer que o clero seja um conjunto de burocratas, e sim pastores. Praticamente todos com os quais me encontrei disseram estar buscando formas para serem mais presentes junto ao povo nas circunstâncias da vida diária.
Um elemento do “efeito Francisco”, consequentemente, parece estar incentivando os líderes eclesiásticos a saírem de seus ambientes fechados e a assar mais tempo nas paróquias, nas escolas, nos hospitais, em sopões comunitários, em abrigos para os sem-teto, e nos inúmeros outros ministérios da Igreja, interagindo com as pessoas comuns e tendo uma melhor leitura de quais são realmente suas preocupações e experiências.
A segunda palavra que ouvi na maioria das vezes: “Misericórdia”. O clero parece ter entendido que eles devem projetar um rosto misericordioso, compassivo.
O significado disso significa nas situações concretas varia dependendo do indivíduo. Está em aberto o debate sobre se ser misericordioso e compassivo implica, por exemplo, facilitar a volta à Comunhão da parte de fiéis católicos divorciados e recasados no civil.
Em geral, a impressão é que Francisco quer que a misericórdia de Deus e da Igreja Católica seja palpável e tangível.
Em terceiro lugar, a palavra mais ouvida foi “serviço”.
Os religiosos me disseram que estão vendo o papa pressioná-los no sentido de se certificarem de que a Igreja esteja na linha de frente ao responder às necessidades dos que sofrem e dos marginalizados, mesmo que isso signifique abrir as paróquias a famílias de imigrantes, reunir esforços para ajudar os pobres e desabrigados da comunidade, esforçar-se ainda mais para manter as escolas disponíveis a alunos de baixa renda, e assim por diante.
De forma alguma, essas coisas são novidade, uma vez que a Igreja sempre esteve comprometida em servir, especialmente aos pobres e abandonados. O clero, no entanto, parece estar ouvindo o papa dizer que esses esforços devam ser redobrados no contexto de um mundo cada vez mais dividido e violento, marcado por aquilo que o pontífice chama de “uma Terceira Guerra Mundial trava em parcelas”.
Será que presença, misericórdia e serviço constituem a totalidade da agenda de Francisco?
Talvez não, mas quanto ao que mais tem marcado os 400 mil padres e 5 mil bispos ao redor do mundo, certamente estas palavras parecem representar o essencial.
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O que o clero está ouvindo de Francisco: “Presença, misericórdia e serviço” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU