Por: André | 20 Abril 2015
Em dois anos como Papa nunca lhe havia acontecido de ser atacado tão asperamente como agora pela Turquia, por causa de sua denúncia do genocídio armênio. Um ponto de inflexão no pontificado.
A reportagem é de Sandro Magister e publicada por Chiesa, 17-04-2015. A tradução é de André Langer.
O encantamento de um pontificado que até ontem suscitavam apenas respeito e admiração acaba de ser rompido pelo primeiro e verdadeiro “casus belli”: o massacre de um século atrás, que o Papa teve a audácia de chamar pelo seu nome – o nome tabu de “genocídio” – e de equiparar a todos os outros aniquilamentos sistemáticos, programados, de povos e de religiões que marcaram o século XX e que caracterizam também, agora, o século XXI.
É difícil negar que se trata de um ponto de inflexão no pontificado. Porque, há apenas alguns meses, no final de novembro, Francisco esteve na Turquia e não falou uma única palavra sobre os armênios.
Quando lhe foi perguntado pelo motivo pelo qual guardou silêncio, ele respondeu que lhe importavam mais os pequenos passos, como aquele dado um ano antes pelo presidente Recep Tayyip Erdogan com uma carta de condolência. Na realidade, essa carta, negacionismo puro por trás de um pouco de fumaça, não foi absolutamente suficiente para consolar os armênios; pelo contrário, amargurou-os mais ainda.
Mas Erdogan havia pedido ao Papa para não falar sobre o genocídio e Francisco respeitou o seu pedido.
A diplomacia vaticana respirou aliviada. No fundo, são apenas cerca de 20 países que explicitamente chamam de genocídio o extermínio dos armênios cristãos. Fazem-no com todas as precauções, para não irritar um aliado, real ou potencial, com o qual se preocupam muito.
Mas quando o Papa Francisco incluiu em sua agenda 2015, com data que caiu no domingo depois da Páscoa, a evocação em São Pedro, da memória dos 100 anos do massacre dos armênios, isso significa que ele mudou de passo.
Como Francisco poderia ter dito menos que seus predecessores?
Com efeito, já em 09 de novembro de 2000, João Paulo II havia definido essa tragédia como um genocídio, e depois novamente em 27 de setembro de 2001, em duas declarações solenes assinadas conjuntamente pelo “catholicos” Karekin II, a primeira em Roma e a segunda na capital da Armênia, onde havia chegado enquanto o mundo estava transtornado com a queda das Torres Gêmeas.
Além disso, nessa viagem, o Papa Karol Wojtyla visitou o memorial do extermínio, e pronunciou uma oração cheia de aflição na qual utilizou, para definir a tragédia, a mesma expressão utilizada pelos os armênios: “Metz Yeghérn”, o grande mal.
Naquela época, estas palavras eram um tabu, mas as autoridades turcas reagiram de forma moderada. Erdogan ainda não havia chegado ao poder, com seu neo-islamismo combativo, e estava em seu apogeu o interesse da Turquia em sua entrada na comunidade europeia, para a qual o caso armênio se apresentava como um obstáculo. Também Bento XVI, ao receber, em 20 de março de 2006, o patriarca dos armênios católicos evocou o “Metz Yeghérn” sem suscitar reações, que, pelo contrário, estouraram estrondosamente contra ele poucos meses depois, quando, em Regensburg, revelou as raízes violentas da religião muçulmana.
No domingo passado, o Papa Francisco poderia ter dito o mínimo, mas, ao contrário – e isso é uma novidade –, ele foi mais longe, muito mais longe.
Não apenas situou o genocídio dos armênios à frente dos outros genocídios do último século, mas detalhou-os um a um, até aqueles que acontecem ainda hoje e que provocam danos a tantas pessoas que são “perseguidas, exiladas, assassinadas, decapitadas pelo simples fato de serem cristãos”, católicos ou ortodoxos, siríacos, assírios, caldeus ou gregos. Como há 100 anos, disse, “parece que a humanidade não consegue parar de derramar sangue inocente”.
As reações turcas foram virulentas e evasivas as chancelarias ocidentais. Para Francisco, significa o fim da tranquilidade.
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A primeira vez de Francisco. Com o inimigo otomano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU