11 Abril 2019
Lucas nos convida a entrar com Jesus em sua Paixão, a reconhecer nossas fraquezas e, com Pedro, nossas fragilidades, a sentirmos sobre nós o olhar do Senhor, a levarmos, seguindo-o como Simão Cirineu, a sua cruz e a nos abandonarmos com ele nos braços do Pai.
A reflexão é de Raymond Gravel (1952-2014), padre da arquidiocese de Quebec, Canadá, publicada no sítio Réflexions de Raymond Gravel, comentando o evangelho do Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor. A tradução é de José Jacinto Lara.
Eis o texto.
Referência bíblica:
Evangelho: Lucas 22,14-23,56
A Paixão segundo São Lucas tem suas particularidades:
É uma paixão a ser meditada ao longo de nossas experiências humanas nas quais Cristo se junta a nós, como ocorreu com os discípulos de Emaús, nos quais ardia o coração, ao ser proclamada, interpretada e atualizada a Palavra. Eles o reconheceram ao partir o pão (Lc 24.30-31). Ao longo deste caminho doloroso que leva à cruz, encontramo-nos com Jesus mediante os personagens que Lucas nos apresenta:
Estamos entre os apóstolos que discutem entre si acerca de quem dentre eles é o maior (Lc 22,24).
Somos Pedro, cujo amor ao Senhor o faz dizer: "Estou pronto, Senhor a ir contigo até a prisão e mesmo até a morte" (Lc 22,33) mas que, na primeira ocasião, renegará o seu mestre: "Eu te declaro, Pedro, antes que o galo cante hoje, negarás, por três vezes, que me conheces" (Lc 22,34).
Somos Judas, à frente de uma multidão de pessoas, querendo traí-lo (Lc 22,47).
Somos Simão Cirineu, discípulo de todos os tempos, que caminha após Jesus, levando também ele a sua cruz (Lc 23,26).
Somos as mulheres de Jerusalém que o lamentam (Lc 23,27).
Somos um dos malfeitores crucificados com ele: "Senhor, lembra-te de mim, quando estiveres no teu reino" (Lc 23,42) e a quem Jesus responde: "Em verdade, hoje mesmo estará comigo no paraíso" (Lc 23,43).
A narração da Paixão segundo Lucas está repleta de delicadeza e de ternura do evangelista para com o Senhor Jesus. Lucas não narra certos detalhes mais cruéis: não relata a flagelação (estamos longe do filme de Mel Gibson). Judas não abraça Jesus, mas aproxima-se apenas para fazê-lo. Ao longo de todo o caminho da cruz, o Jesus de Lucas dá provas de sua paciência e perseverança. O mais difícil de sua Paixão acontece no Getsemani, quando, numa profunda angústia e agonia interior, ele é confrontado com angústias extremas: "Cheio de angústia, ele orava intensamente e o seu suor caía por terra como gotas de sangue" (Lc 22,44). Reconfortado por um anjo, como o profeta Elias (1Rs 19,5ss), Jesus já é o vencedor do que o aguarda.
Lucas suaviza também as situações e os acontecimentos: no jardim de Getsemani, diz que Jesus encontra os discípulos dormindo de tristeza (Lc 24,25). Acolhe Judas com delicadeza: "Judas, é por um beijo que entregas o Filho do homem?" (Lc 22,48). Converte o coração de Pedro com seu olhar de amor e de ternura (Lc 22,61). Fala às filhas de Jerusalém que lamentava a sua sorte (Lc 23,28-31). Perdoa os seus carrascos: “Pai, perdoa-os, porque não sabem o que fazem" (Lc 23, 34). Faz entrar no paraíso o ladrão crucificado com ele: “Em verdade eu te digo: hoje mesmo estarás comigo no paraíso” (Lc, 23,43).
O Jesus de Lucas é tão cheio de bondade e de misericórdia que converte os seus algozes e os que o condenam. Pilatos, por três vezes, o inocenta (Lc 23,4.14.22), as mulheres (23,27), o povo (Lc 23,48) o ladrão (Lc 23,42) e o centurião (Lc 23, 47) declaram-no justo. Na cruz, as suas palavras não são um grito de sofrimento, mas uma oração da tarde: "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito" (Lc 23,46). Desse modo, Lucas nos convida a entrar com Jesus em sua Paixão, a reconhecer nossas fraquezas e, com Pedro, nossas fragilidades, a sentirmos sobre nós o olhar do Senhor, a levarmos, seguindo-o como Simão Cirineu, a sua cruz e a nos abandonarmos com ele nos braços do Pai.
Para terminar, no início do relato de sua Paixão, a Ceia (Lc 22,14-38) é, a uma vez, a refeição do adeus de Jesus e a inauguração da nova Aliança. E, no final do relato, após a morte de Jesus, Lucas nos diz que as mulheres, acompanhando José de Arimateia, preparam com afeto o sepultamento. Mas com todos os seus perfumes, elas querem conservá-lo morto. Entretanto, precisa, o evangelista: "Era o início da Preparação e já se aproximava o sábado" (Lc 23,54). Portanto, as luzes do sábado já brilhavam. Mais: estas luzes já anunciavam as luzes da Páscoa. Mas as mulheres não sabiam disso.
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Queres segui-lo até a cruz? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU