01 Outubro 2018
O salão Marconi da Rádio Vaticano abriga os microfones dos pontífices, daquele usado na praça São Pedro por Eugênio Pacelli àquele para as reuniões com os jovens de Karol Wojtyla. O cardeal Gualtiero Bassetti - arcebispo metropolitano de Perugia e presidente da Conferência Episcopal italiana - fala em qualquer microfone de qualquer televisão para explicar a dissensão dos bispos sobre o decreto de Matteo Salvini sobre os migrantes. Um, dez, vinte vezes. Então, exausto, o cardeal pega uma cadeira em frente aos retratos dos papas, arruma o anel pastoral, toma um gole de água e responde ao Fatto Quotidiano.
A entrevista é de Carlo Tecce, publicada por Il Fatto Quotidiano, 28-09-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
O pontificado de Francisco atravessa um período complicado: o relato de Carlo Maria Viganò sobre o ex-cardeal McCarrick, o alegado acobertamento dos molestadores, os escândalos sexuais, os anos de silêncio sobre os abusos. Além das declarações públicas óbvias, percebe-se um apoio total ao papa ou resiste a vertente dos críticos?
Alguns bispos não conseguem entender o pensamento de Francisco, não o elabora, talvez não o leia. O Papa traz uma novidade, mas é a novidade do Evangelho e não pode assustar. Bergoglio não é nenhum inovador ou progressista, ele é um homem que tem sua bela formação jesuíta e insiste nas temáticas fundamentais como o discernimento e a misericórdia. O papa está apaixonado pela religiosidade popular que está na base da fé, porque vem dos últimos. Mais do que sobre as verdades abstratas, ele parte dos conteúdos do Evangelho. O método, comparado ao passado, é diferente. Evangelho, misericórdia, sinodalidade, povo de Deus, Francisco é um defensor dos fracos, pensa na teoria do desperdício, nas críticas à economia de consumo.
E pensamos também nos contrastes com os Estados Unidos, é o primeiro pontífice não propriamente filo-estadunidense.
Porém vem do continente americano ... Quando ele se apresentou em Nova York, brincou sobre isso com as autoridades locais. Ele disse que ambos eram americanos, alguns do norte, alguns do sul.
O ex-núncio Viganò age por desejo de verdade, espírito de vingança ou porque é um peão em uma conspiração?
O que Viganò escreveu é absurdo, acima de tudo é absurdo em sua forma. Se você pretende escrever um documento de acordo com a verdade, não deve usar um estilo que deixe entrever uma ameaça. Se você fizer algo do gênero em uma denúncia na promotoria, você é que será indiciado, não quem você quer enlamear.
O Vaticano está preparando um contra dossiê para responder a Viganò, é uma boa escolha?
Sim, em breve teremos uma resposta detalhada. O Papa fez bem em não ter uma reação imediata, mas existem os elementos para desmontar aquelas falsidades.
Alguma vez o senhor já teve que lidar com algum caso de padre acusado de abuso em menores?
Vinte anos atrás, quando eu era bispo de Arezzo. Era um padre acima de qualquer suspeita, estava sempre entre os jovens. Era conhecido porque cativava os garotos, conseguiu envolvê-los em iniciativas educacionais.
Ele ia às escolas para discutir sobre drogas. Nós ficamos cientes dos fatos depois das denúncias aos carabineiros da mãe de uma criança. Eu fiz contato com a mãe, nós os ajudamos e o agora ex-padre foi preso e passou oito anos na prisão. Ele vinha de uma congregação religiosa, então era mais difícil para a diocese encontrá-lo.
Como se pode curar o velho flagelo da pedofilia?
Os controles nos seminários devem ser aumentados, entender aqueles que batem na porta da Igreja e devem denunciados os culpados sem medo.
O líder dos bispos italianos é favorável à concessão do sacerdócio aos homens casados?
Uma reflexão deve ser feita. Esse é um problema que a Igreja terá que discutir. Eu não sou contrário. Já existe o sacerdócio uxorado para os sacerdotes católicos do rito oriental. Em Perugia temos um ucraniano e um romeno casados e as pessoas estão satisfeitas. É uma questão de disciplina eclesiástica. Apenas para os homens casados pode ser permitido o sacerdócio, mas os sacerdotes não podem se casar.
O retorno do crucifixo, os pais da família, o beijo no sangue de São Genaro, a imagem votiva de Padre Pio: o governo redescobriu a fé católica ou é especulação sobre a fé?
Eu não julgo as pessoas, elas podem ser mais católicas do que eu, mas a verdadeira religião - como explica Jesus aos samaritanos - é daqueles que adoram em espírito e em verdade. Se você adora, e você é um verdadeiro crente, tudo bem se você andar com o rosário em seu bolso, mas isso é o rabo do cavalo. Eu estou interessado no cavalo inteiro, não apenas no rabo, não só a exibição da fé para fins de propaganda.
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"Viganò só faz ameaças, o papa desmantelará as falsidades" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU