24 Setembro 2018
“Com um coquetel de soluções já usadas pela Santa Sé em muitas partes da sua história, encontrou-se uma solução que regenera a comunhão entre o Vaticano e a China. Nem tudo está resolvido, portanto, mas tudo será diferente.”
A opinião é do historiador italiano Alberto Melloni, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas João XXIII, de Bolonha. O artigo foi publicado por La Repubblica, 23-09-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O que foi assinado nesse sábado, 22, não foi uma concordata entre a Santa Sé e a China: é muito mais. A Igreja nunca recuou diante das concordatas: mas sempre soube que os acordos de poder podem garantir privilégios ou tutelas – coisas, portanto, com as quais não se pode e não se deve contar demais.
Em vez disso, a diplomacia vaticana, desde Roncalli até aqui, aprendeu que, com qualquer instrumento diplomático, pode dar muito quando ativa aquela comunhão das Igrejas e aquela comunhão dos bispos, sem a qual até o ministério pontifício fica suspenso como um lampadário suntuoso em uma sala vazia.
E o acordo “secreto” entre a China e a Santa Sé é um grande serviço à comunhão. A questão da eleição dos bispos que criou não duas Igrejas, mas sim três hierarquias: uma que agrada o governo, por ter surgido a partir de uma escolha interna ao país; a outra em comunhão com Roma; e uma terceira cada vez mais vasta com a qual se convergia.
Com um coquetel de soluções já usadas pela Santa Sé em muitas partes da sua história, encontrou-se uma solução que regenera aquela comunhão: o que libera energias espirituais, abre uma fresta para uma teologia chinesa (que precisa de liberdade para crescer), liberta os seminaristas da necessidade de buscar padrinhos, dentro e fora da China, sem saber se um chamado episcopal estaria de acordo com os cânones ou contra.
Nem tudo está resolvido, portanto, mas tudo será diferente. Haverá repercussões, já que, no Partido Comunista Chinês, haverá alguns que tentarão fazer explodir a medida com alguma provocação e atingir o catolicismo. Na Igreja, haverá a amargura de quem carrega os estigmas da perseguição e vai olhar para eles, ao invés de olhar para o horizonte distante de quem sabe que a Igreja universal precisa da fé e da sabedoria da China para ser ela mesma. Os descontentes com o Papa Francisco dirão que o pontífice perdoou o diabo e procurarão na internet um Viganò de segunda mão.
Mas também haverá acelerações. Gestos antes imprudentes, como a canonização de Matteo Ricci e de Xu Guangqi, se perfilam em um horizonte não muito distante. E haverá possibilidades de fraternidade entre fiéis antes divididos e o reconhecimento do testemunho daqueles que confessaram a fé.
A paciência e o diálogo direto, portanto, prevaleceram: depois de experimentar o acordo “secreto”, eles o anunciaram como provisório. Com elegância superfina, fizeram com que acordo fosse assinado não pelo secretário de Estado e pelo ministro das Relações Exteriores, mas pelos seus vices. E, com (jesuítica) perfídia, anunciaram-no no dia em que Bannon, muito redimensionado em sua pátria e muito ativo ao semear o verbo antibergogliano na China, circula por Roma em busca de uma vingança entre os antieuropeístas, que justamente indignaram Antonio Tajani.
Em um dia como esse, somos levados a pensar em Dom Jin, que, após 27 anos de confinamento, detenções, prisão e trabalhos, foi consagrado bispo de Xangai: um confessor da fé, que, de 1982 a 2005, foi considerado “ilegítimo” por ter sido consagrado sem mandado. Tendo morrido em 2013 em odor de santidade, a sua vida dizia que as aporias sobre as quais, nesse sábado, se revelou que ele havia trabalhado, tiravam da Igreja dons de Deus. Que agora lhe são restituídos.
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Uma nova era entre Vaticano e China. Artigo de Alberto Melloni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU