19 Dezembro 2017
"Algumas perguntas e suposições: Esse lento e contínuo desastre de contaminação vai continuar? As áreas de águas subterrâneas (Aquífero Barreiras) ainda livres de contaminação estão devidamente preservadas? Os 40 por cento de poços fechados, se não estivessem contaminados, não resolveriam com tranquilidade o abastecimento da Grande Natal, como também poderiam ajudar no suprimento, via pipe lines, de algumas cidades do nosso semiárido?"
Questiona Carlos Augusto de Medeiros Filho, geoquímico, graduado na faculdade de geologia da UFRN e com mestrado na UFPA, trabalha há mais de 30 anos em Pesquisa Mineral, em artigo publicado por EcoDebate, 18-12-2017.
O jornal Tribuna do Norte de 17 de março de 2013 reportava que “do total de 131 poços perfurados pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) em Natal, mais de 30 estavam contaminados por nitrato”. Correspondia, na época, a 23% dos poços.
Há poucos dias atrás, em 01 de dezembro de 2017, novamente a Tribuna do Norte transmitiu uma matéria com a manchete “ Natal tem 40% dos poços fechados por contaminação” e informava no texto que dos 133 poços existentes, 53 estão desativados por contaminação por nitrato, explicando se tratar de uma substância considerada nociva ao ser humano e tendo uma relação direta com a falta de saneamento básico.
Medeiros Filho (2016) comentava que desastres ambientais, de causas naturais ou antrópicas, que ocorrem de maneira brusca, violenta, motivam, normalmente, fortes divulgações na imprensa, especialmente se estiverem associadas com significativas tragédias humanas. Existem outros desastres, entretanto, que por se desenvolverem paulatinamente, por um relativo longo período de tempo, não chegam com destaque na imprensa e, em alguns casos, não são classificados como um sinistro ou não tem seus motivos devidamente discutidas.
Medeiros Filho (2016) acrescentava que, em Natal, o desastre da contaminação por nitrato das águas superficiais e subterrâneas é um caso exemplar de sinistro ambiental que avança constante e silenciosamente e sem expectativa clara de solução.
A reportagem da Tribuna do Norte, agora no começo de dezembro, vem infelizmente confirmar essa triste expectativa. O jornal potiguar registra que a região de San Vale, na zona Oeste de Natal, apresentava, há 13 anos, teores médios de nitrato de 1,8 miligrama por litro em sete poços da área. Atualmente essa média já atinge o valor de 9,72 mg/L. Lembrando que teores acima de 10 mg/L N-NO-3, pode causar doenças como metahemoglobinemia (WHO, 2008) e câncer gástrico (INCA,2009).
Essa tendência de contaminação progressiva, na zona Oeste de Natal, já tinha sido diagnosticada cientificamente no artigo de Cabral et al (2009). Os autores relatavam que o estudo de poços no bairro Planalto de 1999 a 2006 mostrava que os valores médios anuais de nitrato avançaram de 1,5 mg/L-N nas primeiras medições para 4,6 mg/L-N em 2006. Notava-se, portanto, um claro crescimento das médias ao longo dos anos, mesmo que ainda apresentado concentrações abaixo do limite de potabilidade de 10 mg/L-N (BRASIL, 2004).
Cabral (2007) estudando a variação temporal, de 2000 a 2006, nas concentrações de nitrato em um poço na captação San Vale, observou teores sempre inferiores a 10 mg/L-N, mas registrando uma preocupante curva, fortemente ascendente, nos teores de nitrato. Essa tendência de crescimento, aparentemente mantida, justifica as concentrações de nitrato hoje reportadas, muito próximas ao limite de potabilidade.
Algumas perguntas e suposições: Esse lento e contínuo desastre de contaminação vai continuar? As áreas de águas subterrâneas (Aquífero Barreiras) ainda livres de contaminação estão devidamente preservadas? Os 40 por cento de poços fechados, se não estivessem contaminados, não resolveriam com tranquilidade o abastecimento da Grande Natal, como também poderiam ajudar no suprimento, via pipe lines, de algumas cidades do nosso semiárido?
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n° 518, de 25 de março de 2004. Estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004.
Cabral, N.T. 2017. Avaliação do comportamento do aqüífero Dunas/Barreiras frente aos processos de Recarga e de contaminação em perímetro urbano de Natal/RN. UFRN/LARHISA/CNPq.
Cabral, N. T.; Righetto, A. M.; Queiroz, M. A. 2009. Comportamento do nitrato em poços do aquífero Dunas / Barreiras nas explotações Dunas e Planalto, Natal, RN, Brasil. Eng Sanit Ambient | v.14 n.3 | jul/set 2009 | 299-306.
INCA. Instituto Nacional de Câncer. Câncer de Estômago. [On-line]. Acesso em: agosto.2009
Medeiros Filho, C. A. Desastres lentos e graduais. In EcoDebate, 08/08/2016.
WHO. World Health Organization. Guidelines for drinking – water quality. 2008. [on line]. Acesso em: 21 ago. 2009.
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A Marcha Contínua de Contaminação por Nitrato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU