28 Outubro 2024
No dia 16 de agosto ao terminar o horário eleitoral na TV, foi possível prever o desfecho das eleições em Porto Alegre.
O artigo é de André Marenco, cientista Político, professor Titular no Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, publicado por Sul21, 27-10-2024.
No dia 16 de agosto, ao terminar o horário eleitoral na TV, foi possível prever o desfecho das eleições em Porto Alegre. Enquanto Melo concentrou sua atenção sobre as enchentes, apresentando-se como aquele que “salvou” a cidade das águas, o PT optou por preencher seu tempo apresentando sua candidata “Maria”, como cristã e de família, script que se repetiu monotonicamente por duas semanas. Nenhuma tomada nos locais dos diques e casas de bombas, nada de mostrar didaticamente a falta de manutenção, ou ainda, apresentar imagens de sua candidata fazendo resgates durante as cheias. Quando “Maria” finalmente lembrou-se que havia ocorrido uma enchente na cidade, já era tarde, Melo já havia consolidado sua narrativa e revertido sua rejeição anterior. Tendo vencido – por WO – a narrativa sobre as enchentes, Melo pode dedicar-se a apresentar suas obras, enquanto “Maria” em tom robótico falava de “esperança”, “mudança, “confiança” e outras rimas vazias.
No “Manual Marqueteiro de Almanaque” uma campanha deve começar apresentando a candidata, mostrar seu lado humano, familiar – se possível cristã – quase como se ela não fosse uma política. Depois, deve apresentar suas propostas, porque, com pesquisas qualitativas debaixo do braço, concluem que os eleitores querem propostas e não críticas.
A Ciência Política possui mais de 70 anos de expertise em pesquisas eleitorais, desde os primeiros surveys rigorosos aplicados nos EUA até excelentes pesquisas como as do cientista político Felipe Nunes, da Quaest. Nestas sete décadas de conhecimento científico acumulado, um padrão tem se mantido constante em eleições majoritárias, o do voto retrospectivo, cunhado pelo cientista político Anthony Downs: eleitores comparam as realizações do incumbente com as promessas da oposição. O problema é que com eleitores desconfiados, esta comparação é desigual, pois o eleitor mediano – aquele que realmente decide a eleição – irá sempre preferir um “feijão-com-arroz” do incumbente às promessas da oposição, que ele não tem segurança de que poderão ser cumpridas. Moral da história, “é melhor um pássaro na mão, do que dois voando”. Somente quando a oposição é exitosa em desconstruir o incumbente e o eleitor passa a rejeitá-lo, é que este dará atenção às propostas da oposição. Isto são sete décadas de ciência acumulada, não coaching eleitoral.
Se o PT quiser voltar a ser competitivo na cidade, deve dar atenção a duas questões: Porto Alegre é um município onde a classe média possui um peso demográfico e eleitoral relevante. O partido foi hegemônico quando representou alternativa para este segmento, e vem colecionando derrotas deste que este eleitor divorciou-se da esquerda. Para isto, precisa incorporar à sua agenda temas como smart city e cidades sustentáveis, que podem sensibilizar os ouvidos de eleitores de bairros de renda média e, devidamente traduzidos, fazer muito sentido também para aqueles que já sentiram a dura experiência dos impactos de mudanças climáticas. Mas isto não se improvisa em ano eleitoral, é preciso uma longa sinergia e diálogo com a ciência e os cientistas, coisa que os petistas fechados em suas bolhas têm dificuldade em promover.
Uma fotografia do PT em Porto Alegre hoje revelaria uma gerontocracia, uma vez que seus principais quadros são os mesmos há 30 ou 40 anos. Assim, ele precisa promover com urgência uma renovação geracional. Para isto, pode mirar-se nos exemplos de PSOL e PCdoB, exitosos em processos recentes de transição geracional. Há boas novidades em sua bancada de vereadores, como Alexandre Bublitz, Juliana Souza e Natasha, com potencial para representar a cara de um partido mais oxigenado.
De qualquer forma, seu desafio no futuro será distinguir o que – na política – é ciência, e o que é “cloroquina”.
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Como perder uma eleição? Artigo de André Marenco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU