28 Setembro 2023
Jorge Viana engrossa o coro absurdo da ala desenvolvimentista do governo federal, que defende explorar petróleo na foz do Amazonas para financiar a transição energética.
A informação é de ClimaInfo, 27-09-2023.
O atual presidente da ApexBrasil, o engenheiro florestal Jorge Viana, ex-governador e ex-senador pelo Acre, assessorou o movimento dos trabalhadores rurais e seringueiros de seu estado, o que o fez se aproximar do lendário Chico Mendes. Décadas depois, porém, sua defesa da exploração de petróleo na foz do Amazonas certamente causaria vergonha no líder seringueiro brutalmente assassinado por sua luta pela preservação da Floresta Amazônica, bioma que, além do desmatamento, vem sendo ameaçado pelas mudanças climáticas causadas pelos combustíveis fósseis.
Viana repete à Exame a narrativa da ala do governo que, baseada num projeto de desenvolvimento a qualquer custo, defende que a exploração de petróleo na área da foz e na totalidade da Margem Equatorial é necessária para “financiar a transição energética”. Como se a transição não dependesse de medidas opostas, como a eliminação dos subsídios aos combustíveis fósseis e seu redirecionamento às tecnologias da transição, como a eletrificação dos transportes, a pesquisa das tecnologias de produção e emprego do hidrogênio verde e a eficiência energética, entre outras.
“O petróleo lá tem que ser explorado com toda rigidez e cuidado, quem sabe criando um fundo soberano que mude a vida do povo que vive na Amazônia. São 29 milhões de pessoas morando na região mais rica do planeta e que passam necessidades básicas. Se o Brasil pegar esse novo pré-sal e fizer direitinho a gente faz a transição para o modelo descarbonizado, mas colocando os brasileiros em um padrão de vida digno. As coisas não são incompatíveis para mim”, afirmou, ignorando os previsíveis impactos da atividade petroleira na sensível região da foz, e fechando os olhos ao fato que a exploração de petróleo é uma atividade concentradora de renda.
Antes de misturar na mesma frase combustíveis fósseis, “economia verde” e transição energética, o presidente da ApexBrasil deveria conhecer Mark Jacobson. Professor da Universidade de Stanford, ele estudou o que seria necessário para alcançar a meta de energia 100% limpa de carbono em 145 países – considerando a eletrificação de edifícios, transportes e indústria. E mostrou que é possível cortar 80% do consumo de combustíveis fósseis em todo o mundo até 2030, como informa o Um só planeta.
“Temos 95% das tecnologias que precisamos para fazer a transição (energética) agora, então, se as implantássemos o mais rápido possível, poderíamos fazer a transição de pelo menos 80% até 2030”, disse Jacobson.
O que Jacobson e outros especialistas argumentam é que, com vontade política e financiamento similar à de uma guerra mundial, o mundo poderia abandonar o uso de combustíveis fósseis em um espaço de 10 a 15 anos. Se a própria Petrobras calcula que qualquer produção de petróleo na foz do Amazonas demoraria 6 anos, pelo menos – isso em caso de descoberta –, fica a dica de que é melhor mantê-lo onde está.
Leia mais
- Como a articulação entre agronegócio e Congresso atua para garantir o retrocesso na legislação socioambiental do Brasil
- Movimento ecológico e as esquerdas: o desafio de superar a catástrofe ambiental e as injustiças sociais. Entrevista especial com Alana Moraes
- Como Belo Monte introduziu doenças crônicas e mudou a alimentação do povo Arara
- O Brasil da Agenda Verde e do petróleo na foz do Amazonas
- No PAC Verde, ‘‘transição energética’’ ainda é promessa retórica
- Fim da exploração de petróleo é a maior divergência na Cúpula da Amazônia
- Lula volta a defender exploração de petróleo na foz do Amazonas
- Brasil no divã amazônico: entre a preservação da floresta e a exploração petroleira
- Cúpula da Amazônia: acordo deve evitar ponto de não retorno da maior floresta tropical do mundo
- Povos indígenas pedem à humanidade que aja com urgência para salvar a Amazônia. Eles garantem que 20% da maior floresta tropical do planeta já foi destruída
- Manguezais da Amazônia armazenam duas vezes mais carbono por hectare que a floresta tropical da região
- Aquecimento global ameaça fotossíntese na Amazônia e em outras florestas tropicais
- Helder Barbalho: o ‘rei do norte’ usa o discurso de proteção à Amazônia para ampliar seu poder
- Foz do Amazonas e a exploração de petróleo. Interesses econômicos são a raiz do negacionismo científico. Entrevista especial com Thomás Banha
- O negacionismo científico que se recusa a reconhecer recifes da Foz do Amazonas é o mesmo que defende extração de petróleo na região. Entrevista especial com Ronaldo Francini-Filho
- Pauta nacional-desenvolvimentista petroleira do século XX versus agenda socioambiental para o século XXI. Entrevista especial com Carlos Marés, Bruce Albert e Maurício Angelo
- O que a exploração de petróleo na Foz do Amazonas tem a ver com a saúde dos mares do planeta?
- Na foz do rio Amazonas. Artigo de Michael Löwy
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“Petróleo combina com economia verde”: o disparate do presidente da Apex - Instituto Humanitas Unisinos - IHU