30 Novembro 2022
O decrescimento como forma de sair da crise climática? Esta é a única solução, diz o economista Timothée Parrique. Em seu livro Ralentir ou périr, publicado em 2022, revela sua “caixa de ferramentas” para acabar com o crescimento e passar para uma sociedade de “prosperidade”, longe dos clichês que se colam a essa teoria.
A entrevista é de Lucie Bras, publicada por Ouest-France, 27-11-2022. A tradução é do Cepat.
Ele é o economista que coloca o decrescimento no centro do debate sobre o clima. Desde o lançamento do seu livro, em setembro, Ralentir ou périr (Éd. Seuil, 2022), Timothée Parrique, 33 anos, tem se convidado para a mídia ou estar na frente de alunos das grandes escolas para falar sobre sair do capitalismo e uma transição para uma economia pós-crescimento. Uma mudança radical a ser feita imediatamente... sob pena de “perecer” diante da emergência ecológica.
No livro, o doutor em economia pinta o retrato de uma sociedade doente do seu crescimento e convida-nos a desacelerar num mundo que tem “fobia do desaceleramento”. Para ele, o decrescimento é uma caixa de ferramentas que permitirá que combinemos justiça social e respeito ao meio ambiente. Ele propõe, de modo especial, substituir o PIB por um índice de bem-estar dos cidadãos.
Então, como sair dessa “obsessão generalizada pelo crescimento”? Timothée Parrique, atualmente pesquisador da Universidade de Lund, na Suécia, nos dá algumas pistas.
Pode nos falar sobre sua trajetória? Como chega a teorizar o decrescimento?
Foi uma viagem. Comecei a estudar economia em 2007. Matriculei-me no curso de economia clássica e na época não me interessava nenhum pouco pelo clima. E fiz um Erasmus [1] na Suécia. E aí descobri a mudança climática; foi meu primeiro choque.
Voltei para a França e me matriculei em um mestrado em economia ambiental, mas não falava de decrescimento, estava muito focado no crescimento verde e na monetização da natureza. Achei isso limitado e voltei para a Suécia para fazer um mestrado em economia ecológica. Foi então que descobri o decrescimento. Isso me tocou muito porque me permitiu resolver um problema que eu tinha como economista ambiental: via as economias crescerem e suas pegadas ao mesmo tempo. Resolvi trabalhar neste assunto.
Você fala muito em escolas de negócios, em particular você fez um curso de introdução na HEC. Você também participou de formações governamentais. Como suas propostas são recebidas?
Na maioria das vezes, os estudantes nunca ouviram falar ou apenas por meio de clichês. Quando chego, sinto que há resistência, pois muitos pensam que é um conceito de “zadistas”. Então, mostro a eles a faceta teórica do decrescimento, mas também a abordagem da história do pensamento. E eu apresento isso a eles como uma caixa de ferramentas, para olhar para os mesmos problemas sob outro ângulo.
Frequentemente mencionam o crescimento verde [a manutenção do crescimento aliada à sobriedade ambiental], que é um argumento impossível de defender hoje, depois do último relatório do IPCC. Não existe nenhum modelo que mostre que isso é possível dentro do tempo que temos.
Você fala em suprimir o PIB. O que há de errado hoje com este instrumento de medição?
Há duas coisas erradas com o PIB. A primeira é a maneira como ele é medido. O produto interno bruto é um indicador antigo, tem quase 100 anos. Foi desenvolvido às pressas durante a Grande Depressão nos Estados Unidos. Cem anos depois, tornou-se uma espécie de totem. No nosso imaginário econômico, um ponto de PIB quer dizer enriquecimento e crescimento, portanto prosperidade, quando sabemos que isso não é verdade. Não é um indicador de bem-estar, como já dizia seu criador Simon Kuznets: o PIB mede apenas uma parte muito pequena da economia, principalmente da esfera mercantil, sem incluir os serviços públicos, as atividades associativas e voluntárias ou os ecossistemas.
O segundo limite está relacionado ao crescimento. Em todos os países de alta renda, vemos uma desaceleração de longo prazo nas taxas de crescimento. E isso é uma coisa boa! Da mesma forma que nosso corpo se estabiliza em um determinado tamanho por volta dos 20 anos, uma economia será construída, ativada. Depois de um tempo, ela vai parar de crescer de forma exponencial e se estabilizar. Passará de uma economia de quantidade para uma economia de qualidade.
Os governos dos países ricos estão todos se perguntando “como voltamos a crescer?”, que realmente não é a pergunta certa. A pergunta certa seria: “como conseguimos prosperar sem crescimento?” Ao contrário de alguns mitos, o aumento do PIB não chega aos mais pobres. Erradicação da pobreza, redução das desigualdades, pleno emprego, serviços públicos de qualidade, bem-estar... É o que nos promete a ideologia do crescimento. Todas essas são falsas promessas.
Então, como saímos do crescimento? Porque ao ouvir os noticiários ou os políticos, no momento, isso é inevitável.
Esta é a minha grande surpresa. A ideia do crescimento está muito bem estabelecida, mas, ao mesmo tempo, não há quem realmente o defenda. Fiz contato com cerca de vinte empresas, falei com várias centenas de altos funcionários. E nunca vi um que realmente me justificasse a necessidade incontornável de aumentar o crescimento do PIB.
Claro, não quero ser ingênuo. Penso que a melhor maneira de sair do crescimento é se livrar da mística que o cerca, é criar um imaginário alternativo, uma nova narrativa de prosperidade. Dizer que o crescimento foi, talvez, uma narrativa interessante para a reconstrução do pós-guerra em meados do século XX. Mas hoje, precisamos de uma nova narrativa, uma economia de bem-estar, de qualidade, uma prosperidade social e ecológica. A chamemos como quisermos.
Ao encontro de uma economia do decrescimento, portanto. Como você a define?
O decrescimento é uma redução da produção e do consumo para aliviar a pegada ecológica, planejada democraticamente com um espírito de justiça social e com a preocupação com o bem-estar.
Esta é uma definição muito teórica. Mais concretamente, como seria uma economia em decrescimento?
Essa é uma questão complicada. Por outro lado, se você perguntar a alguém: “Como é uma economia de crescimento?”, essa pessoa dirá “não sei” porque é muito abstrato.
O decrescimento é tomar o tempo para ver a nossa vida desacelerar, retomar o tempo para realizar os projetos que deixamos de lado porque o capitalismo não o permitiu: trabalhar em associações, passar o tempo em família, em formação… Se colocarmos limites à rentabilidade, aparecerão muitas opções.
O mesmo vale se limitarmos os salários: dizemos que a pessoa mais bem paga da empresa nunca deveria receber mais do que quatro, cinco ou sete salários mínimos. Uma pessoa que sai da escola de negócios não terá que escolher entre receber o dobro do Smic trabalhando para uma comunidade ou dez vezes o Smic trabalhando para o banco Société Générale. Isso abre as possibilidades.
O decrescimento não é uma prioridade quando a pessoa já se está na precariedade. Você diz que os mais ricos devem decrescer mais que os mais precários. Como isso funcionaria?
As famílias mais ricas têm uma pegada de carbono de cerca de 15 a 20 toneladas por ano. A pegada meta é de duas toneladas, é uma diminuição vertiginosa. Se você está num domicílio em situação precária, você está com cinco toneladas hoje. Se você tiver que ir a dois, é mais comedido. Os esforços de sobriedade para as famílias mais ricas serão proporcionais à sua pegada e, portanto, hoje muito mais importantes do que os esforços de sobriedade para as famílias mais vulneráveis, que consomem muito pouco.
O que acha do fato de inventar novos termos para traçar um futuro mais desejável? Como o Bruno Latour que dizia que tínhamos que falar de prosperidade?
Hoje, a música do capitalismo é tão estrondosa que cada nova proposta é imediatamente esvaziada de sua radicalidade. É assim que se diluem os termos desenvolvimento sustentável, economia verde, crescimento verde, economia circular.
Então, para mim, é preciso uma mistura de palavras de demolição: decrescimento, renúncia, fechamento, racionamento… Essas palavras que chocam nos levam a pensar na amplitude do trabalho necessário. Isso nos coloca em desacordo desde o início, o que é ótimo quando você quer mudar um sistema. Em seguida, usamos palavras de reconstrução. Então, para mim, meu par preferido, é “decrescimento” para colocar em risco o imaginário do crescimento e depois “pós-crescimento” como palavra de reconstrução para seguir em frente.
Em seu livro, você explica que o decrescimento é apenas um passo em direção a uma sociedade de pós-crescimento. Você pode explicar isso?
O pós-crescimento é uma economia estacionária em harmonia com a natureza, onde as decisões são tomadas em conjunto e onde as riquezas são compartilhadas equitativamente para prosperar sem crescimento.
Uma economia do pós-crescimento será necessariamente estacionária. Ou seja, os níveis de produção e consumo não estarão em constante crescimento. Eles irão flutuar de acordo com as necessidades e as inovações tecnológicas. Jamais encontraremos a experiência do exponencial que temos com o crescimento.
Parece um ideal a ser alcançado. Mas é difícil acreditar que os dirigentes políticos anunciarão repentinamente uma transição para uma economia de decrescimento. Você acredita nisso em nível nacional ou em pequenos bolsões locais?
Na realidade, vemos que isso já está acontecendo ao nível das coletividades, de certas empresas, por exemplo, as cidades em transição, as ecovilas, as moedas locais... Há pequenos avanços. Em alguns países também, como a Nova Zelândia, que decidiu criar um orçamento de bem-estar.
Ainda não houve uma grande experiência de decrescimento na escala de um país inteiro e acho que há mais chances de que as alternativas continuem existindo em nível local e regional. Um dia, quando estivermos de costas para a parede, diremos a nós mesmos: “o que podemos fazer?". E então veremos as alternativas que funcionam. E talvez essa nova narrativa de prosperidade consiga chegar ao nível do governo. Acho que é o cenário mais provável.
Depois, não ficamos ao abrigo de políticos que abordam o assunto. Como Delphine Batho, durante as primárias dos Verdes em 2021. O que sei é que, de qualquer forma, no papel, funciona.
Diante do impasse do sistema atual, nossos governos devem declarar aberta a feira de ideias. Se realmente queremos fazer uma transição ecológica, penso que temos que nos dotar dos meios para construir a economia. Paremos de falar de retomada do crescimento e admitamos que os curativos já não funcionam mais e que teremos que operar.
Justamente, como seria este canteiro de obras? Qual seria o primeiro passo a dar, na sua opinião?
Abandonar o PIB e substituí-lo por indicadores de bem-estar.
Estamos organizando uma importante convenção de cidadãos para definir nossos próprios indicadores de bem-estar, como fez a Nova Zelândia. Em seguida, serão transcritos em padrões ecológicos de contabilidade social para todas as empresas.
Uma vez que temos esse quadro, que será uma espécie de novo software, aplicamos uma lógica real de racionamento, ou seja, cotas de carbono. A cada ano, empresas e indivíduos terão um orçamento de carbono: saberemos exatamente quantas toneladas podemos emitir. Assim, integramos os condicionantes ecológicos ao funcionamento da economia, legalmente.
A primeira das reduções terá de ser a das desigualdades. Isso é importante porque todas essas mudanças sobre as quais estou falando hoje podem ser frustradas com muita facilidade pelo poder dos lobbies e pela capacidade das pessoas que são hoje muito ricas para manter as regras do jogo do Banco Imobiliário em vigor. As ferramentas são inúmeras: herança garantida, ISF [imposto sobre fortunas] climático, salário máximo, renda mínima garantida… Neste período de sobriedade, teremos de distribuir mais as riquezas.
Por trás de todo esse projeto de sociedade existe uma emergência ecológica. O título do seu livro é “desacelerar ou perecer”. Você pensa que temos que reagir muito rápido, caso contrário perderemos tudo?
É o que estamos vendo, os cientistas e os ativistas dizem-nos isso da forma mais violenta possível, deitando-se nas estradas, colando-se aos bancos. Eles estão no mais total desespero e têm suas razões para isso. Sim, é desacelerar ou perecer. De fato, muitos já pereceram. Veja a devastação causada pelas enchentes no Paquistão. Esta é uma consequência direta do aquecimento global.
As pessoas mais vulneráveis estão na linha de frente. Parece-me um pouco burguês perguntar: “mas quando isso realmente vai acontecer? Quanto tempo temos?”. É horrível fazer esta pergunta quando hoje há pessoas que já estão morrendo pelos danos acumulados ao longo de décadas de exploração ecológica.
Eu tenho uma última pergunta. Nós falamos sobre tudo o que está errado. Mas o que hoje te dá esperança sobre a situação, alegria?
São os jovens que saem das escolas de negócios ou de engenharia e que fazem seu discurso de formatura chamando para desertar, dizendo: "não vamos trabalhar para o capitalismo". E isso está começando a reverberar. Algumas empresas de combustíveis fósseis não conseguem mais encontrar engenheiros qualificados para trabalhar. É ótimo, isso me dá muita esperança. Certamente, é uma minoria da população, mas como essas elites constituíram a principal força destrutiva do capitalismo, é bom que sejam elas que comecem a se rebelar.
Acho que estamos realmente experimentando o colapso do capitalismo por dentro, porque a força de trabalho se recusa a participar, e por fora, porque os ecossistemas estão depredados. Essas duas grandes restrições, social e ecológica, estão se fechando como uma grande armadilha para lobos. Em vez de ter um colapso repentino, seria ótimo ter um decrescimento escolhido, ou seja, planejar essa transição de maneira inteligente para que seja o mais justa e convivial possível. Ver que há muitas pessoas que se interessam pelos conceitos de decrescimento, isso me dá esperança. Digo a mim mesmo que nem tudo está perdido.
[1] Programa criado em 2004 pela União Europeia, com o objetivo de financiar e promover o intercâmbio estudantil e a mobilidade acadêmica entre os alunos das universidades europeias. É uma bolsa de estudo que abrange os níveis de graduação, mestrado, doutorado e estágio.
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“Decrescimento é reservar um tempo para ver nossa vida desacelerar”. Entrevista com Timothée Parrique - Instituto Humanitas Unisinos - IHU