18 Outubro 2022
"É preciso parar a escalada e evitar a catástrofe do sonambulismo", escrevem 11 intelectuais europeus, em apelo publicado por Avvenire, 17-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Caro Diretor,
A ameaça de um apocalipse nuclear não é novidade. A bomba atômica já foi usada. Não é impossível que se repita. É um caso amplamente contemplado nos manuais de estratégia. Diante dessa ameaça, a opinião pública parece perigosamente tolerante. Nenhuma reação popular forte, nenhuma vontade convicta e racional para evitá-la. Um perigoso sentimento de inevitabilidade e resignação está se espalhando, ou, pior, a ideia de que apenas um "acerto das contas" possa dar origem a uma nova e estável ordem mundial. Mas hoje nenhuma guerra pode impor uma ordem sob cujos escombros não sobrem o planeta, os povos, toda a humanidade. Não podemos nos resignar. Mas a uma vontade racional de paz deve ser oferecido um cenário credível para acabar com este conflito, que irrompeu com a agressão russa além das graves tensões no Donbass. Um conflito que não pode ter a vitória inteiramente de um lado e derrota inteiramente do outro, segundo uma concepção maniqueísta do mundo e da história.
Todos os atores do conflito, aqueles que estão no teatro de guerra e aqueles que o alimentam ou não o impedem, devem estar cientes disso. É preciso parar a escalada e evitar a catástrofe do sonambulismo. Com esse intuito, acreditamos que os governos responsáveis devam seguir estas linhas:
1) Neutralidade de uma Ucrânia que entre na União Europeia, mas não na OTAN, conforme o compromisso reconhecido, ainda que apenas verbal, dos Estados Unidos à Rússia de Gorbachev após a queda do Muro e a dissolução unilateral do Pacto de Varsóvia.
2) Reconhecimento acordado do status de fato da Crimeia, tradicionalmente russa e ilegalmente "doada" por Krushev à República Soviética da Ucrânia.
3) Autonomia das regiões de língua russa de Lugansk e Donetsk dentro da Ucrânia de acordo com os Tratados de Minsk, com garantias europeias reais ou, alternativamente, referendos populares sob a supervisão da ONU.
4) Definição do status administrativo dos outros territórios disputados do Donbass para gerir o caldeirão russo-ucraniano que na história daquelas regiões foi criado e eventualmente com a criação de um ente paritário russo-ucraniano para gerir as riquezas minerais dessas áreas no seu mútuo interesse.
5) Desescalada simétrica das sanções europeias e internacionais e do empenho militar russo na região.
6) Plano internacional de reconstrução da Ucrânia.
Em nossa opinião, esses podem ser pontos de partida realistas e credíveis para um cessar-fogo. Por fim, a proposta de Elon Musk vai na mesma direção e, há tempo, as solicitações de Henry Kissinger para uma solução que, no respeito as razões da Ucrânia, ofereça ao mesmo tempo uma saída para o fracasso militar de Putin no terreno. Basicamente essas são as linhas mais credíveis de uma negociação possível e necessária, mesmo para a única agência mundial que trabalha verdadeiramente pela paz, a Igreja de Roma.
Essa solução contém a todos, mesmo ao Ocidente e em particular aos países da União Europeia, os mais ameaçados pela hipótese de um desesperado ataque nuclear russo. E para a própria Ucrânia, se não quiser ser a nova Coreia no coração da Europa pelos próximos 50 anos. Libertemos a razão e a política dos grilhões do ódio, e talvez encontremos também o coração e a inteligência para pôr fim a essa carnificina. É um convite dirigido a todos, a quem ao ouvi-lo quiser relançá-lo e assumi-lo.
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O apelo. Uma negociação credível para parar a guerra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU