28 Julho 2022
Este ano, o mundo estará em “dívida ecológica” por 156 dias. Precisaríamos de 1,75 Terras para regenerar o que a humanidade consome em termos de área.
A reportagem é de Júlio Brion, publicada por Le Monde, 28-07-2022.
A partir de quinta-feira, 28 de julho, o mundo vive de crédito até o final do ano. O "overshoot day", data a partir da qual a humanidade consumiu tudo o que os ecossistemas podem regenerar em um ano, acaba de ser atingido, segundo cálculos da organização americana Global Footprint Network. A data fatídica chega um dia antes do ano passado, confirmando que a calmaria causada pela crise sanitária foi um episódio passageiro – em 2020, sob efeito de confinamentos e restrições sanitárias, o dia da ultrapassagem recuou três semanas em relação a 2019.
A associação WWF, na origem da campanha de comunicação por volta do dia do overshoot, recorda assim que "os únicos períodos de calma não foram escolhidos nem antecipados: correspondem às crises energética (1973, 1979), financeira (2008) e saúde (2020).
Ce jeudi, l’humanité a consommé la totalité des ressources naturelles et renouvelables que la Terre peut produire en une année.
— Pierre Benassaya ? (@PierreBenassaya) July 28, 2022
Petit historique de l’évolution de la date du jour du dépassement depuis les années 1970 ? pic.twitter.com/qvTrQg37Se
Pierre Cannet, diretor de advocacia e campanhas do WWF França, acredita que este dia de excesso ilustra que “nosso sistema estagnou desde o período dos acordos de Paris”.
Para Laetitia Mailhes, porta-voz da Global Footprint Network, este ano confirma mais uma vez o "aumento da competição pelo acesso aos recursos dos quais dependemos", o que levanta a questão de se a humanidade acabará por ser capaz de "fazer o que é preciso para viver dentro do orçamento ecológico do nosso planeta. Há uma finitude que deve ser levada em conta".
Como de costume, esses cálculos mostram que nem todos os países contribuem na mesma proporção para a dívida ecológica global. Se toda a humanidade vivesse como os franceses, o Dia da Sobrecarga da Terra teria sido alcançado já em 5 de maio.
Seguindo o modo de vida norte-americano, o prazo teria sido adiantado em dois meses, em 13 de março, e seria alcançado em 2 de junho para o modo de vida da população chinesa.
Se a metodologia utilizada para calcular este dia de superação não chega a um consenso, Aurélien Boutaud, investigador associado do CNRS e autor de L’Empreinte écologique (A Pegada Ecológica) (La Découverte, 2018), defende-a explicando que "a pegada ecológica é um indicador e tem, por isso, enormes vantagens", nomeadamente porque "agrega milhares de estatísticas cujo impacto se traduzirá numa unidade de medida comum".
No entanto, reconhece “certas desvantagens, em particular algumas aproximações, e há aspectos ambientais ignorados” ou indiretamente levados em consideração, como a proteção da biodiversidade. Além disso, o indicador é “muito antropocêntrico, supõe-se que as biocapacidades sejam inteiramente dedicadas à sobrevivência dos humanos”, observa.
Este ano, o WWF destaca neste cálculo o sistema alimentar global que “se baseia na destruição da natureza e dos combustíveis fósseis”. A associação estima assim que 55% da biocapacidade mundial é utilizada para alimentar a humanidade. Este foco no sistema agrícola não surpreende Pierre-Marie Aubert, investigador do Instituto para o Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (IDDRI), para quem “o sistema alimentar é um elemento ultradeterminante na forma como usamos a terra”.
O WWF lembra que toda a cadeia alimentar é responsável por mais de um quarto das emissões globais de gases de efeito estufa, enquanto a agricultura responde por 70% do uso de água doce. A associação convida-nos assim a “modificar as nossas dietas reduzindo o consumo de carne e laticínios” e a apoiar a transição para a agroecologia.
Em particular, apela à União Europeia para que adote uma regulamentação europeia ambiciosa face à desflorestação importada e apela à França para que estabeleça disposições financeiras destinadas a desencorajar as operações agrícolas intensivas.
Para Pierre-Marie Aubert, “a mudança das práticas alimentares [tem] efeitos consideráveis se for acompanhada de políticas que atuem na oferta agrícola”.
Foto: Reprodução Le Monde
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Earth Overshoot Day – “Dia da Sobrecarga da Terra”: a partir de 28 de julho, a humanidade vive de “crédito ecológico” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU