10 Mai 2022
"Testemunhamos o papel fundamental das mulheres que romperam os padrões do seu tempo e ousaram pensar 'fora da caixa', essas religiosas inspiradas pela Divina Ruah, fundaram congregações, enfrentaram autoridades religiosas e políticas e foram extremamente fortes diante de uma sociedade patriarcal e machista!", escrevem Ir. Michele da Silva, Ir. Leidiane Paes Abreu, Ir. Glenda Sábio Garcia, Ir. Elis Alberta R. dos Santos e Ir. Samanta Karla de Sousa Carneiro, em artigo publicado por coletivo Ciranda das Mulheres.
Segundo as jovens religiosas, "nós, como tantas, fomos chamadas a sermos companheiras de caminhada, a lutar pela justiça, pela igualdade e para que tod@s tenham vida plena! A vocação à vida Religiosa Consagrada é para a liberdade, para a construção e transformação do Reino de Deus, precisamos nos empoderar da nossa missão enquanto Mulheres Consagradas e não assumir a vocação de mães e esposas!"
Nascemos mulheres, foi o que disseram. Mal sabíamos da beleza e das lutas que nos esperavam como mulheres numa sociedade patriarcal, e num contexto histórico de avanços e retrocessos em curtos períodos de tempo. Temos pensado e desejamos propor esta reflexão sobre os papéis de esposa e mãe, lindos quando se é por livre escolha e não por uma imposição social, cultural e religiosa. A mulher, ainda, está vinculada à função reprodutiva, à capacidade de gerar e aos trabalhos de cuidado não remunerados. Estas associações, dificultam a acolhida e, inclusive, condenam as mulheres que não se encaixam nos seus padrões. Crescemos educadas na fé católica, que - tantas vezes - reforça tais padrões, sem muito questionar. Das diversas vocações que nos apresentavam na juventude, sempre olhamos para as mulheres consagradas de forma diferente, sentíamos um ar de liberdade nos seus corpos que nos cativava.
Desde que nos encantamos pela Vida Religiosa Consagrada - VRC sempre estranhamos os conceitos: “Esposa de Cristo” e “Mãe Espiritual”. Respeitamos a história das Congregações e a forma de cada religiosa viver a sua espiritualidade, mas esses conceitos nos incomodam bastante! Como Mulheres Consagradas temos um potencial incrível de anunciar a Boa Nova da libertação, fomentar o protagonismo e o empoderamento das pessoas mais vulneráveis, de construir um mundo mais humanizado e, como minoria, caminhar com os grupos minoritários. Somos criativas, livres e podemos viver numa dinâmica do discipulado de iguais, na sororidade e na emancipação das mulheres!
A decolonização dos nossos corpos passa, justamente, por uma tomada de consciência de como o peso do patriarcado tem nos definido a partir de uma imposição social. E, hoje, sentimos necessidade de romper com essas ideologias que mistificam nosso Ser. A vida religiosa consagrada feminina é sim geradora de vida, mas porque cuida, promove e ajuda a libertar, por isso ela é fecunda. A sublimação não é o suficiente para nossa opção de vida, mas é o sentido do nosso Sim, que está fundamentado na pessoa de Jesus Cristo, que nos torna mulheres livres, felizes e doadas. A história do cristianismo primitivo já nos conduzia para isso.
Quem foi a anunciadora da ressurreição? Não sobrou para ela o título de mãe, esposa? De certa forma isso é muito interessante, pois registraram de fato, o que não poderia ser escondido. Maria Madalena foi a amiga escolhida para ser a anunciadora da Boa Nova da Ressurreição, e assim ela o fez. Este seria o papel e a melhor exaltação que se deveria fazer a uma mulher como esta. Com sua própria vida ela proclamou que não aceitava o esquema até então preestabelecido. Ela foi a mulher reconhecida por sua missão, como apóstola da ressurreição! E hoje porque é tão difícil sermos reconhecidas pelo que somos e queremos ser? Porquê? Não seria essa, uma estratégia do patriarcado para nos manter aprisionadas a uma ideia criada e mantida por eles? Para se beneficiarem de alguma forma?
Hoje desafiamos o patriarcado à repensar suas teorias e teologias que querem definir o papel da mulher. Não fizeram Maria Madalena a mãe, a esposa do lar, mas fizeram dela a mulher adúltera, a mulher sedutora e prostituta. Se ela tivesse feito tudo isso, mesmo assim, não perderia o destaque e o brilho da mulher corajosa e ousada que ela foi. Não é curioso que, quando não é esposa e mãe, a mulher modelo do ideal espiritual, ela se torna a mulher devassa ou fora do esquema? Não seria esse um fetiche criado pelo sistema patriarcal? Não deveríamos questionar o patriarcado com todas as suas estruturas e talvez sugerir que ele sente-se no divã?
Ao longo da história da VRC, testemunhamos o papel fundamental das mulheres que romperam os padrões do seu tempo e ousaram pensar “fora da caixa”, essas religiosas inspiradas pela Divina Ruah, fundaram congregações, enfrentaram autoridades religiosas e políticas e foram extremamente fortes diante de uma sociedade patriarcal e machista! Por que, então, precisamos nos considerar: “Esposas e Mães”? A sociedade impõe essa condição. Uma mulher só é completa com a maternidade, então precisa ser espiritual, na VRC, e também precisa ser esposa e serviçal. Pronto, temos o modelo perfeito! Precisamos conversar mais sobre isso, a maternidade e o casamento são vocações lindas, mas para quem as tem. Nós, como tantas, fomos chamadas a sermos companheiras de caminhada, a lutar pela justiça, pela igualdade e para que tod@s tenham vida plena! A vocação à vida Religiosa Consagrada é para a liberdade, para a construção e transformação do Reino de Deus, precisamos nos empoderar da nossa missão enquanto Mulheres Consagradas e não assumir a vocação de mães e esposas!
Esta provocação é para refletirmos, precisamos transformar as estruturas patriarcais que nos impuseram tabus e pesos que não precisamos carregar, isso não nos pertence! Vamos construir um novo olhar da VRC feminina, livre, profética, cuidadora, a partir do olhar renovado e integral de nossos corpos femininos.
Convidamos as queridas companheiras da VRC a falar sobre esse tema e abrir-se para novas possibilidades. Podemos ser muito mais realizadas quando assumirmo-nos como mulheres que somos. Atuando de forma sinodal, propagamos a “diferença” na Igreja e sociedade de forma autêntica, humana, e militante. Cabe somente a nós, darmos o primeiro passo para a revolução da sororidade!
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Vida Religiosa Consagrada feminina: reprodução ou superação dos papéis sociais? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU