15 Março 2022
Reproduzido em países da África e da América Central, o Programa de Aquisição de Alimentos já vinha sendo sucateado. E agora foi praticamente extinto, substituído por um “cheio de incertezas”.
A reportagem é de Cida de Oliveira, publicada por Rede Brasil Atual, 13-03-2022.
O presidente Jair Bolsonaro tanto investiu contra os pequenos agricultores e a população mais pobre do país que, como se fosse pouco, jogou uma pá de cal sobre o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Na prática, enterrou a política criada em 2003 no âmbito do Fome Zero, no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que chegou a comprar quase R$ 1 bilhão em alimentos produzidos sem agrotóxicos em pequenos estabelecimentos, beneficiando de um lado indígenas, quilombolas, extrativistas e pescadores artesanais. E de outro, escolas, asilos e outras instituições que atendem pessoas em situação de insegurança alimentar.
E criou um programa para chamar de seu, o Alimenta Brasil. Na propaganda governamental, a iniciativa tem como finalidade ampliar o acesso à alimentação e incentivar a produção de agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, povos indígenas e demais populações tradicionais.
E que por meio da dispensa de licitação, o poder público compra os alimentos produzidos por esses agricultores e destina a famílias em situação de insegurança alimentar, rede socioassistencial, escolas públicas, unidades de saúde, unidades de às unidades de internação socioeducativas e prisionais, entre outras. Ou seja, tudo o que o PAA fazia com excelência a ponto de o programa ter se tornado referência internacional e ser implementado em países da África e da América Central.
“Esse novo programa não se justifica, é uma jogada política. Enterrar um programa exitoso, de 18 anos, reconhecido pelo FAO, para colocar outro no lugar, ainda cheio de incertezas”, diz à RBA o agrônomo Sílvio Porto, professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e ex-diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) de 2003 a 2011.
Segundo nota técnica da qual ele é coautor, lançada recentemente pela Fian Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadadas –, a MP está em meio à incertezas e incoerências, como afirmar que o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) será a instância de controle social. No entanto, o Consea foi extinto pelo próprio governo Bolsonaro em 2019, logo em seu início. O financiamento do programa é outra preocupação, segundo ele, já que o recursos deverão ser compostos de emendas parlamentares, o que abre caminho para “politicagens”.
O Alimenta Brasil, segundo Porto, nasceu da desconstrução do PAA, que foi sendo desconstruído. De modo geral, a política teve orçamento crescente entre 2003 e 2012, bem como aumento na execução nesse período. E passou por redução de verbas entre 2013 e 2016, mesmo assim conseguindo mantendo bons volumes orçamentários, segundo a nota técnica da Fian Brasil.
A partir de 2016, com o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, entrou em fase de redução drástica de orçamento. Com a chegada de Bolsonaro ao poder, os recursos entraram em queda livre, chegando, em 2021, a uma previsão de cerca de R$ 100 milhões, 10% do que chegou a ser aplicado no programa em 2012.
“Além do orçamento diminuto destinado ao PAA em 2021, o governo federal não tomou nenhuma iniciativa para assegurar sua execução, preferindo apostar na edição do Alimenta Brasil”, aponta a nota técnica.
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Em meio à fome, Bolsonaro ‘enterra’ programa de compra de alimentos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU