22 Julho 2021
São muitas as esperanças de que no país sul-americano desperta o lançamento da Assembleia Constituinte, o instrumento escolhido, depois dos protestos de rua que eclodiram no final de 2019, para virar a página de forma unânime e escrever uma nova Carta, no lugar da que ainda data da época do General Augusto Pinochet. Uma nova temporada que tem um timbre decididamente "feminino", a partir da composição paritária em termos de gênero da Assembleia, onde prevalecem os independentes de partidos, além de expoentes da atual oposição de esquerda. E uma atenção particular à proteção da criação e das minorias étnicas. Em suma, um Chile ao mesmo tempo "rosa", "verde" e "multicolorido".
A reportagem é de Bruno Desidera, publicada por Agenzia SIR, 21-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
"No domingo, 4 de julho, ao ouvir o discurso da recém-eleita presidente da Assembleia Constituinte, uma indígena mapuche, me emocionei, e me senti orgulhosa pelo Chile e por esta oportunidade de incluir todas as populações que vivem no país neste processo”. Patricia Araya é uma jovem advogada, que integra a diretoria da ONG Fima, engajada em campanhas de defesa do meio ambiente. E dá voz a um sentimento comum, às esperanças de que no país sul-americano esteja despertando o início da Assembleia Constituinte, o instrumento escolhido, após os protestos de rua que eclodiram no final de 2019, para virar a página de forma unânime e escrever uma nova Carta, no lugar daquela que ainda data dos tempos do General Augusto Pinochet.
Vimos isso, justamente, no domingo, 5 de julho, quando a professora universitária Elisa Loncón, histórica ativista da população indígena, foi eleita presidente da Assembleia Constituinte, e logo após cumprimentou agitando a bandeira do povo mapuche. “Este sonho é um sonho dos nossos antepassados. Este sonho se torna realidade. É possível refundar o Chile, estabelecer uma nova relação”, disse, prometendo uma “direção coletiva em rodízio” durante os trabalhos da Assembleia Constituinte e expressando seu compromisso com um Chile “plurinacional e intercultural”, atento às mulheres, aos menores e às minorias. É possível “estabelecer uma nova relação entre todas as nações que compõem este país”, concluiu, anunciando que a nova Carta vai proteger a “mãe terra e a água”, hoje considerada um bem privado.
Como mencionado, grande fermento e esperança emergem da sociedade civil, do mundo ambientalista, mas também dos órgãos eclesiais, como também emerge das pessoas entrevistadas pelo SIR.
Contribuição à participação dos órgãos eclesiais e inter-religiosos. Afirma Rosario Letelier, encarregada das atividades institucionais da Caritas Chile: “Desde o plebiscito sobre a escolha de promover a Constituinte - explica - procuramos promover a participação dos cidadãos, também por meio de assembleias necessariamente virtuais. Em seguida, colaboramos com outros órgãos eclesiais, como a Comissão Justiça e Paz, a Comissão do Trabalho, a Pastoral Rural. Em geral, a Igreja está tentando colocar à disposição a contribuição da doutrina social. Contamos com a abertura de um amplo debate no país, já existe diálogo com os constituintes católicos”. Uma temporada de participação, “para dar voz aos vulneráveis, para inverter o modelo 'neoliberal puro', que mostrou todos os seus limites, para pensar outro modelo de desenvolvimento”. Portanto, o debate sobre o meio ambiente é central, “como se sabe - continua Letelier - o Chile é o único país onde a água é um bem privado, há dez anos grandes áreas do país vivem em contínua seca, muitas comunidades veem água apenas quando chega com caminhões. Mas também há outras questões relacionadas a isso, por exemplo, as minas centradas em um modelo econômico 'extrativista'. É significativo que a Assembleia Constituinte chilena seja a primeira do mundo a se composta com um critério de paridade de gênero, a contribuição feminina será muito importante”. Para falar a verdade, a paridade na composição, estabelecida a priori, paradoxalmente acabou favorecendo o componente masculino, em geral menos votado. Este também é um caso único no mundo. E afinal, destaca Patricia Araya, “as mulheres são maioria também nas organizações cívicas e ambientais”.
Não é apenas a Igreja Católica que está engajada neste debate e processo participativo. São cerca de 50 organizações que se referem à Aliança Interreligiosa e Espiritual para o Clima, presidida pela teóloga reformada Arianne van Andel. “Nossa realidade se formou nas vésperas da COP25, a Conferência Mundial do Clima que deveria acontecer em Santiago, antes de ser transferida por causa dos protestos de 2019. Mas continuamos trabalhando juntos, em rede com outros movimentos ambientais da sociedade civil. No âmbito dessa ação, por exemplo, nasceu o documento que pede uma Constituição ecológica, firmado junto com numerosas realidades da sociedade civil. “A dimensão espiritual e as religiões - acrescenta a teóloga - podem oferecer um olhar global sobre a questão ambiental e uma contribuição para uma sociedade mais comunitária e ecológica”.
A questão da água. Sobre os trabalhos da Assembleia Constituinte, van Andel está otimista: “Somos uma surpresa para o mundo todo, depois de mais de 40 anos existe a premissa para uma virada, principalmente no nível ambiental. O Chile é um país que vive de recursos naturais e eu compartilho a opinião de muitos. A água é o tema mais urgente e importante”. E esta é também a opinião da citada Patricia Araya: “A ideia de que uma mudança completa no modelo econômico possa partir da Constituinte me parece excessiva, mas acredito que a da água seja uma questão fundamental. Mostra-nos que o direito de propriedade não é algo absoluto, mas é limitado pela função social e pela função ecológica”. A ativista ambientalista está convencida de que o protagonismo na Assembleia Constituinte dos povos indígenas, presentes com algumas cadeiras reservadas, é outra frente fundamental: “Trata-se de sanar uma dívida que o Estado chileno tem, há muito tempo, para com eles. Espero que se abram espaços de autonomia, mas em convivência. Entre outras coisas, as duas questões, a ecológica e a indígena, estão intimamente ligadas”. Para Araya, o entusiasmo se mistura com a preocupação: “Temo a reação dos que detêm o poder, sobre a água, sobre as minas, espero que a Assembleia seja capaz de abrir o caminho para um novo Chile”.
Acima de tudo, desafio antropológico. Certamente um desafio difícil, que também depende de uma perspectiva fundamental, segundo o pensamento do Arcebispo de Concepción, Mons. Fernando Chomali, que num artigo escrito nos últimos dias - e enviado ao SIR pelo próprio bispo - espera que os Constituintes se questionem sobre a visão "humana" e sobre a centralidade da pessoa. “A Constituinte - escreve Mons. Chomali - será o espelho da antropologia que for assumida”. E esse fundamento terá repercussões na convivência, a começar pela atenção aos mais frágeis e descartados.
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Chile. Fermento e esperança para a Assembleia Constituinte. D. Chomali (Concepción): “Será o espelho da antropologia que for assumida” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU