06 Julho 2021
Entrevista com o Presidente da Administração do Patrimônio da Sé Apostólica (Apsa), D. Nunzio Galantino, chefe das finanças e dos cofres vaticanos.
A entrevista é de Domenico Agasso, publicada por Vatican Insider, 05-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
O grande e decisivo objetivo das reformas econômicas iniciadas pelo Papa Francisco é "assegurar que a forma de administrar os recursos postos à disposição da Igreja pela generosidade dos fiéis seja transparente e tal a não criar constrangimento e desconforto para ninguém”. Para evitar outros escândalos, como o que levará dez pessoas a julgamento no Vaticano, entre os quais prelados, funcionários, financistas, administradores e um cardeal, Giovanni Angelo Becciu. Foi o que afirmou D. Nunzio Galantino, presidente da Administração do Patrimônio da Sé Apostólica (Apsa), a quem o Pontífice entregou o dinheiro e as contas da Santa Sé.
Excelência, que significado terá o processo após a investigação que começou com o investimento no imóvel de Londres?
É inútil esconder. Foi e é um episódio constrangedor. O judiciário dirá quais são os níveis de responsabilidade. Certamente o caso acelerou os procedimentos que estão levando à adoção de critérios administrativos que deixam pouco espaço para o arbítrio e, muito menos, para uma gestão pouco transparente.
Quais são os erros cometidos na gestão das finanças eclesiásticas que absolutamente não podem ser repetidos? Como os escândalos podem ser prevenidos?
Os escândalos se previnem com a implementação de procedimentos corretos e colocando atenção em quem se escolhe como ‘companheiros de viagem’. Os últimos episódios parecem mostrar que nem todos os chamados colaboradores eram dignos de toda a confiança neles depositada.
Pode nos explicar de uma vez por todas o que é o Óbolo de São Pedro, que segundo os investigadores sofreu enormes perdas devido ao "sistema predatório e lucrativo podre", e para o que é utilizado?
O óbolo é uma forma de participação direta dos fiéis de todo o mundo, com as suas ofertas, na missão universal do Santo Padre. Colaborar no exercício da caridade do Papa e custeando as despesas para todas as atividades de evangelização da Igreja de Roma. É uma prática que assumiu diferentes formas ao longo da história, por meio de coletas e doações de fiéis individuais ou de igrejas locais inteiras. Suas raízes remontam à Igreja primitiva.
O senhor se sente confortável em dizer a um fiel disposto a fazer uma doação à Santa Sé que ele pode confiar no uso adequado desse dinheiro?
Devemos ter o cuidado de não criminalizar com superficialidade uma gestão econômica que tem suas regras, não de hoje. É claro que a má gestão que está sendo apurada pelo judiciário, se por um lado cria constrangimento, por outro, está pressionando todos nós, responsáveis, a criar condições para que os fiéis possam confiar. Nunca faremos o suficiente neste aspecto. Acredite em mim.
Mas é possível manter juntos com coerência economia, finanças e Evangelho?
Não só é possível, mas é obrigatório. Ai de quem pensa que a vida do dia-a-dia (incluindo a administração) é uma coisa e o Evangelho é outra. Quem pensa assim vota automaticamente na incoerência, na vida dupla e na fraude. A vigilância é importante, mas não é suficiente. É preciso coerência. Ou pelo menos é preciso tentar a sério.
O Vaticano também enfrenta o complexo período pós-pandêmico e, inclusive, não receberá nenhum "Fundo de Recuperação": como poderá se sustentar?
O balanço 2020 está em fase de preparação para ser apresentado e aprovado pelo Conselho de Economia. Dadas as dificuldades comuns a todas as administrações, também haverá um déficit para nós. Por enquanto não quantificável. Não seria a primeira vez que o balanço da Santa Sé fecha no vermelho. Entre as causas, convém recordar que grande parte das atividades da Santa Sé são ‘atividades de missão’, ou seja, não produzem lucro. Comportam apenas despesas.
E, além disso, no resultado operacional tem seu peso a redução no fluxo das receitas - devida, entre outros fatores, aos consideráveis descontos feitos nos valores para ir ao encontro das dificuldades dos estabelecimentos comerciais, ao fechamento dos Museus do Vaticano e outros fatores. O plano de recuperação já está em ato. Começou com uma redução considerável das despesas e alguns ajustes nos vencimentos do pessoal eclesiástico.
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“Episódios constrangedores no Vaticano, mais transparência com o dinheiro da caridade”. Entrevista com Nunzio Galantino - Instituto Humanitas Unisinos - IHU