18 Março 2021
Uma nova instrução da Secretaria de Estado proibiu a prática de missas individuais dentro da Basílica de São Pedro e estabeleceu limites rígidos sobre o uso do rito latino.
A reportagem é de Christopher White, publicada por National Catholic Reporter, 16-03-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Uma nova instrução da Secretaria de Estado do Vaticano proibiu a prática de missas privadas dentro da Basílica de São Pedro e impõe limites estritos ao uso do rito latino.
Uma carta de 12 de março delineando as novas medidas enviou ondas de choque às comunidades católicas tradicionalistas que descreveram a supressão de missas individuais como “uniformidade forçada”, enquanto encantavam os reformistas que a veem como uma priorização há muito esperada da natureza comunal da missa.
Cerca de 3 mil bispos, padres e teólogos encheram a Basílica de São Pedro durante os anos do Concílio Vaticano II (1962-65) e uma das reformas inovadoras foi adaptar a liturgia “mais adequadamente às necessidades de nosso tempo”.
Agora, quase 60 anos depois, aqueles que defendem as reformas do Vaticano II dizem que o próprio local físico onde essas palavras foram escritas e aprovadas pode se tornar um exemplo para o resto da Igreja.
De acordo com a carta, rubricada pelo arcebispo Edgar Peña Parra, secretário substituto do Vaticano para assuntos gerais, os novos protocolos convidam os padres a participar de uma das muitas celebrações conjuntas da missa que acontecem dentro da basílica todos os dias, em vez de celebrar a sua própria Missa privada, que agora é proibida. Os protocolos entrarão em vigor no dia 22 de março.
“A intenção é restaurar a noção de participação na liturgia, e simplesmente não fazer missas privadas”, disse dom Kevin Irwin, o presidente de estudos litúrgicos da Universidade Católica da América e autor de “Pope Francis and the Liturgy: the call to holiness and mission” (“O Papa Francisco e a Liturgia: o chamado à santidade e à missão”, em tradução livre).
As diretivas continuam a notar que as missas ainda são permitidas nas capelas da gruta da basílica para grupos de peregrinos acompanhados por um sacerdote ou bispo e que o uso do rito extraordinário (latino) é limitado a determinados momentos na Capela Clementina nas catacumbas do Vaticano.
O padre Mark Francis, que serviu na Comissão Internacional sobre o Inglês na Liturgia e é presidente aposentado da União Teológica Católica, disse ao NCR que o novo decreto deixa claro que “os padres individuais estão a serviço da Igreja e não vice-versa”.
“A Eucaristia é uma celebração comunitária”, disse ele. “Ter uma missa particular é um tipo de oximoro”.
Como ex-superior internacional dos Viatorianos, padre Francis relembrou sua própria experiência de viver em Roma por 12 anos, onde a sacristia da Basílica de São Pedro muitas vezes se parecia com a Grande Estação Central, com padres indo e vindo constantemente, disse ele.
Para o padre Francis, o novo decreto é um esforço para “encorajar a concelebração” e deixar claro “que nem todo sacerdote deve celebrar sua própria missa particular”.
Rita Ferrone, autora de vários livros sobre liturgia, concordou, dizendo ao NCR: “missas privadas não são a norma da Eucaristia”.
Ela acredita que as novas diretrizes estão “reafirmando a norma”.
Embora Ferrone tenha notado que as diretrizes não vão mudar nada em relação às missas privadas que podem estar ocorrendo em outros locais, ela diz que isso oferece uma oportunidade para São Pedro “dirigir as coisas de uma maneira que sua vida litúrgica reflita o melhor, a visão mais normativa da liturgia que saiu do Concílio Vaticano II”.
“O que acontece na Basílica de São Pedro pode ser um exemplo”, disse Ferrone. “Mas não é uma regra para o resto do mundo.”
Ou, como padre Francis disse: “O que eles estão basicamente fazendo é dizer que a Basílica de São Pedro precisa implementar o Concílio Vaticano II”.
O padre John Zuhlsdorf, como outros tradicionalistas, discorda, argumentando que as missas do Novus Ordo na Basílica de São Pedro, às quais os padres são encorajados a ingressar ou concelebrar, terão leitores e cantores leigos e mulheres, reformas da liturgia às quais eles continuam a se opor.
De acordo com o padre jesuíta John Baldovin, professor de teologia histórica e litúrgica na Escola de Teologia e Ministério do Boston College, o documento do Vaticano que descreve a celebração da missa torna explícito que “a missa sem pelo menos um ministro/membro dos fiéis pode ser celebrada apenas por ‘uma causa justa e razoável’”.
Além das Instruções Gerais do Missal Romano, que datam de 1969, as Escrituras também deixam claro que “a Eucaristia é essencialmente comunitária”, argumenta Baldovin.
“Do contrário, é muito estranho chamar a Eucaristia de sacramento da unidade”, disse ele ao NCR. “Muitas missas sendo celebradas simultaneamente na mesma igreja é um sinal contraditório e confuso”.
Em 2007, o Papa Bento XVI lançou o motu proprio Summorum Pontificum, que permite a celebração da “forma extraordinária” da missa sob certas circunstâncias, mas Baldovin acredita que essa mudança foi um erro. Por causa disso, “muitos padres e vários leigos parecem querer torná-lo comum”, como o número de padres que optaram por celebrá-lo sozinho na Basílica de São Pedro, disse ele.
“Eles afirmam que é por piedade e devoção, mas, em última análise, celebrar a missa pré-Vaticano II é uma rejeição do Concílio e de tudo o que ele representa”, argumentou. “O Papa Francisco é bastante claro que o Concílio deve ser nossa inspiração na reforma em curso da Igreja”.
No mês passado, o Papa Francisco aceitou a renúncia do cardeal Robert Sarah, o polêmico chefe da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos do Vaticano. Sarah há muito é considerado um herói por muitos católicos tradicionalistas. Ferrone observou que sua partida poderia ter proporcionado um momento oportuno para implementar reformas litúrgicas.
De acordo com o The Tablet, Francisco iniciou um processo de consulta que o ajudará a escolher o novo líder do escritório de liturgia do Vaticano.
Junto com a saída de Sarah, no mês passado o Papa Francisco nomeou o cardeal Mauro Gambetti como o novo arcipreste da Basílica de São Pedro, assumindo uma nova liderança no posto que supervisiona as atividades da basílica. Além disso, o Papa Francisco falou recentemente em termos fortes sobre a importância do Vaticano II, afirmando veementemente que quem não aceita o Vaticano II não está caminhando com a Igreja.
“Em conjunto, todas essas coisas são sinais de reafirmação das prioridades da reforma litúrgica que se seguiu ao Concílio Vaticano II”, disse Ferrone.
Ou, como Baldovin resumiu: “esta é uma forma de enviar um sinal ao resto da Igreja sobre o que é bom e o que não é”.
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Por que o Vaticano está restringindo a missa privada na Basílica de São Pedro? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU