31 Outubro 2020
As reações às midiáticas declarações do papa Francisco divulgadas na semana passada sobre as uniões civis de casais homossexuais, gerou reações mistas. A maioria das pessoas concorda que o papa Francisco precisa avançar mais.
A reportagem é de Robert Shine, publicada por New Ways Ministry, 29-10-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Xavier M. Montecel, um candidato ao doutorado em Teologia na Boston College, escreveu em National Catholic Reporter que a distinção que o papa Francisco faz entre o casamento sacramental e as uniões civis regulamentadas pelo Estado é atualmente encontrada na tradição da Igreja (ele cita Aquino e Agostinho como autoridades), e pontua quão anômala é a celebração do casamento nos EUA, tanto por padres quanto por autoridades do governo. Montecel afirma que os comentários do Papa indicam progressos em relação à separação de Igreja e Estado, mas argumenta que mais mudanças são necessárias.
“Mas os católicos LGBT ainda merecem mais. Embora as uniões civis possam oferecer segurança e inclusão para casais do mesmo sexo no que diz respeito à lei, eles não podem fazer isso dentro da igreja. Aplaudo Francisco por sua coragem e pelo cuidado que oferece a quem vive “nas periferias existenciais”. Mas, francamente, manter as pessoas LGBT nas periferias e tornar a vida nas margens um pouco mais habitáveis por meio de arranjos legais que não transformam a vida da igreja não é bom o suficiente...”.
“Como qualquer outro católico, meu coração se parte com a polarização que vemos na igreja. Mas eu nunca entendi por que as pessoas LGBT, já relegadas às margens da vida da igreja, deveriam arcar com o fardo da desumanidade para evitar o cisma”.
Por fim, Montecel afirma a necessidade de mudanças na doutrina para que reconheça casais do mesmo gênero como possíveis para “contribuir para o florescimento humano”, mais que ser uma ameaça, como algumas lideranças da Igreja sugerem. A Igreja precisa reconhecer institucionalmente que alguns casais também refletem o amor de Cristo.
Jamie Manson, a presidente da organização Catholics por Choice, escreveu um artigo para o The Washington Post onde argumenta que a fala do Papa é insuficiente para os Católicos LGBTS. Ela comentou sobre a história de amor entre duas ex-irmãs, cujo casamento Manson oficializou em 2011:
“Dói em mim que Francisco, quem claramente vê a face radiante de Deus nos sem-teto, nos marginalizados, nos presos e imigrantes, não possa ver a vida sacramental de Deus expressada de tão variadas maneiras em relações belas e sagradas...”
“Até Francisco gravar essas ideias em um ensinamento definitivo, uma pequena esperança de mudança institucional fica a ser encontrada em frases e apoios de segunda-mão. Como uma católica, eu sei que Deus é totalmente e sacramentalmente presente no meu amor e no amor de todos os casais LGBTQs”.
“Dado tudo o que continuamos sofrendo, especialmente nas mãos da Igreja Católica Romana, merecemos muito mais do que as migalhas de uma mesa controlada por um homem extraordinariamente poderoso e influente. Somos dignos do mesmo nível de defesa franca e vigorosa que este Papa ofereceu a tantos outros grupos oprimidos e marginalizados em todo o seu papado”.
Eve Tushnet, uma autora católica gay, também escreveu no The Washington Post. Ela se concentra não no apelo do Papa por uniões civis, mas em sua ênfase de que as famílias não devem rejeitar membros lésbicos e gays, e que a família é fundamental para a vida de lésbicas e gays também. Tushnet escreve:
“Portanto, não, o Papa não apoia o casamento gay; aqueles que acreditam que esses últimos clipes indicam uma mudança em sua postura ficarão desapontados. Mas muitas pessoas queriam que o Papa falasse sobre o próprio desejo dos gays de formar uma família porque eles anseiam por algum reconhecimento de que ser gay é mais do que desejo sexual. O que surpreendeu e encantou muitos gays, tanto fora como dentro da igreja, foi a possibilidade de ele falar sobre nossos anseios em termos positivos... Ele ainda não o fez – mas espero que faça”.
Mas embora mais progresso seja realmente necessário, o jornalista católico gay Michael O’Loughlin, da America Magazine, ajudou a destacar as respostas de áreas onde a igualdade LGBTQ está sob maior ataque:
“Uma católica LGBT que vive em Uganda, Ssenfuka Joanita Warry, chamou a mensagem do papa de ‘bomba’. Warry, que lidera o Faithful Catholic Souls Uganda, um grupo de Católicos LGBTs, disse que o foco na aceitação é mais importante do que debates sobre a mudança do ensino da Igreja sobre relacionamentos do mesmo sexo. Os comentários do Papa instando as pessoas a aceitarem os membros LGBTs de suas famílias, disse ela, tocaram especialmente um acorde”.
“‘Ele está dizendo que é da nossa cultura – como católicos ou como cristãos – fazer exatamente o que ele disse: aceitação e inclusão de todos, independentemente de sua orientação sexual e identidade de gênero’, disse ela. ‘Acho que ele me deu um motivo para não mudar minha religião ou ir a qualquer outra igreja. Isso me dá coragem’”.
Em um outro artigo, separado da revista America, O'Loughlin, que produziu um podcast sobre a Igreja Católica e a crise da AIDS, afirma não querer que o significado deste momento seja subestimado, mesmo que “fazer mais” seja necessário. Ele aponta o quão negativos e excludentes alguns líderes da Igreja têm sido historicamente, usando as campanhas católicas para impedir as leis de não discriminação para pessoas LGBTQ ou a linguagem preconceituosa do Vaticano como exemplos. O'Loughlin conclui:
“Existe um clichê de que a Igreja pensa há séculos. Portanto, é importante ter em mente o quanto o tom em torno de questões LGBTs mudaram em apenas décadas... contra tudo isso, minimizar a visão do Papa sobre as uniões civis hoje é ignorar o passado não muito distante, quando os católicos LGBTs não podiam nem sonhar com um pronunciamento papal como este”.
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As reações de Católicos LGBTQ ao apoio do papa Francisco às uniões civis são diversas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU