03 Fevereiro 2020
A Irmã Marie Diouf é Superiora Geral das Filhas do Santo Coração de Maria, congregação religiosa feminina que nasceu no Senegal, e presidente da Anima Una, uma associação que reúne congregações religiosas femininas que originárias da África Ocidental de língua francesa. Sete países e 15 congregações estão representados nesta união, que comemorou seu 50º aniversário nos dias 31 de janeiro e 1º de fevereiro em Abidjan.
A entrevista é de Lucie Sarr, publicada por La Croix Africa, 02-02-2020. A tradução é de André Langer.
Com que finalidade a Anima Una foi criada?
A Anima Una (uma só alma) foi criada em 1970, na linha das tradições africanas de diálogo e abertura, para testemunhar a unidade da vida religiosa através da cooperação efetiva e fraterna, com vistas a um melhor serviço às Igrejas. É um espaço de formação, informação, troca de experiências, ajuda mútua e para favorecer a consolidação dos laços fraternos.
Nossa riqueza é que nascemos em solo africano, formadas e acompanhadas na vida religiosa pelas congregações missionárias. As congregações se fortalecem e, portanto, crescem do ponto de vista espiritual, vocacional e financeiro. Temos valores africanos que enriquecem nossos valores universais e eclesiais transmitidos por nossos fundadores. Além disso, nós estamos em uma Igreja jovem e nos beneficiamos com essa juventude. Também aprendemos a assumir o encargo de alcançar, pouco a pouco, nossa autonomia.
Quais são as dificuldades e os desafios enfrentados pelas congregações religiosas femininas na África Ocidental de língua francesa?
O rosto de nossas jovens Igrejas africanas significa que o Evangelho ainda não se enraizou profundamente. Somos, pois, confrontadas com o problema da formação vinculada à juventude de nossos efetivos. Temos 80% de jovens que precisam ser formadas em assuntos seculares e espirituais.
Após 50 anos, os desafios são os da Igreja, de uma Igreja cheia de riquezas, mas que vive na miséria, uma terra de cultura, mas onde reina a ignorância, uma terra de crenças, onde coexistem o paganismo, as seitas, etc. E, como mulheres africanas consagradas, devemos enfrentar esses desafios para ajudar a África a emergir, a tornar nossas congregações estruturas fortes, bem enraizadas na fé, enquanto consolidamos nossa fraternidade.
Além disso, existem os desafios de uma inculturação da vida religiosa. O que devemos tomar ou abandonar de nossas culturas? Como ser totalmente evangélicas, totalmente consagradas, mas também totalmente africanas. É por isso que devemos nos esforçar, e não é fácil não se enganar.
As mulheres são marginalizadas na Igreja?
A Igreja está em uma sociedade. Às vezes, ela também é a imagem dessa sociedade, uma sociedade em que, infelizmente, as mulheres ainda são consideradas de segunda categoria. Embora faça esforços, a Igreja ainda não alcançou plena maturidade em matéria de igualdade.
A União Internacional das Superioras Gerais (UISG) decidiu recentemente criar, em colaboração com a União dos Superiores Gerais (USG), uma comissão para estudar, ao longo de três anos, o estresse profissional dos membros de suas congregações e propor soluções. Quais podem ser as causas desse esgotamento de religiosos e religiosas?
O campo pastoral é imenso e às vezes é grande a tentação de querer fazer tudo. Algumas de nossas fundadoras morreram de exaustão diante da enormidade da tarefa. Quando você é consagrada e faz a profissão da doação de si, existe a tentação de querer fazer tudo, de querer resolver todos os problemas.
Em certos postos particulares, algumas religiosas são muito solicitadas, por exemplo, aquelas que estão em postos de responsabilidade na escola, no consultório ou na pastoral. Eu vejo minhas irmãs que estão no campo da saúde, às vezes atendem 200 pacientes em um único dia. Aquelas que dirigem escolas para dois mil alunos trabalham de manhã à noite. E elas não têm apenas isso como responsabilidade, pois, além disso, exercem um trabalho pastoral. Infelizmente, são forçadas a agir assim, porque não são muito numerosas.
As congregações religiosas africanas são apresentadas como sendo particularmente vulneráveis aos abusos sexuais. E quanto a isso?
Os abusos sexuais não são uma exclusividade da Igreja ou das congregações autóctones. Infelizmente, é uma realidade que existe em todas as sociedades. Devemos entender que as freiras não são mulheres diferentes das outras, portanto estão expostas aos mesmos problemas. Elas estão expostas aos abusos sexuais da mesma maneira que as outras mulheres. Na África, as mulheres estão se fortalecendo no desenvolvimento de mecanismos de defesa contra os abusos e estamos tentando fortalecer esses mecanismos.
Na formação, realizamos cursos sobre a gestão da sexualidade, mas com os eventos atuais, tomamos medidas para abordar o assunto no instituto, mas também dentro da Anima Una. Nós solicitamos que as nossas irmãs saiam do silêncio para denunciar casos de abusos, caso surgirem, e estejam vigilantes para proteger os menores e as pessoas vulneráveis pelas quais somos responsáveis. Além disso, estamos ensinando às jovens em formação a se defender e proteger.
O bom é que agora uns e outros estão sendo informados sobre os abusos. Todos estarão, portanto, mais vigilantes.
O Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o seu X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos, a ser realizado nos dias 14 e 15 de setembro de 2020, no Campus Unisinos Porto Alegre.
X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos
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“As freiras estão expostas aos abusos sexuais da mesma maneira que as outras mulheres”. Entrevista com a Irmã Marie Diouf - Instituto Humanitas Unisinos - IHU