14 Janeiro 2020
A geração dos millennials sofrerá mais do que as outras de distúrbios físicos e mentais quando ocupar um lugar predominante no mercado de trabalho.
A reportagem é de Gérard Horny, publicada por Slate, 10-01-2020. A tradução é de André Langer.
Os millennials, geração nascida entre 1981 e 1996, são certamente a geração mais numerosa, mais educada e mais conectada que os Estados Unidos já conheceram. Mas há um problema: de acordo com um estudo publicado pela Moody's Analytics, sociedade de estudo e consultoria pertencente ao mesmo grupo da conhecida empresa de classificação, os membros dessa geração sofrerão com mais distúrbios de saúde do que aqueles que a precederam e esses distúrbios teriam um potencial de pesar negativamente na economia americana.
Este estudo é baseado em dados coletados pela Blue Cross Blue Shield (BCBS), uma associação que reúne empresas de seguros de saúde presentes em todo o território estadunidense. O primeiro índice negativo é o aumento da taxa de mortalidade aos 35 anos em relação à geração anterior, a geração X. (Lembrete metodológico: de acordo com os critérios utilizados neste estudo, temos a geração silenciosa, formada pelas pessoas nascidas entre 1925 e 1945, que conheceram quando jovens a Grande Depressão após a crise de 1929 e a Segunda Guerra Mundial, geração qualificada como silenciosa, porque teriam passado por todas essas dificuldades e trabalhado muito sem resmungar; a geração dos boomers, 1946 a 1965; e a geração X, de 1966 a 1980).
No passado recente, já havia um aumento na taxa de mortalidade em uma população ainda jovem, mas cada vez uma causa específica explicava esse fenômeno: a Guerra do Vietnã no final da década de 1960, um aumento no uso de drogas no final da década de 1970. Desta vez – e é isso que preocupa os especialistas –, as causas são múltiplas, variando de acidentes (incluindo overdoses) a câncer.
Mas a mortalidade é apenas o aspecto mais visível e dramático da evolução em andamento. Como disse Jean de La Fontaine sobre a peste, “nem todos morreram, mas todos foram atingidos”. O índice de saúde calculado pelo BCBS mostra uma deterioração geral do estado de saúde em comparação com a geração X, seja física ou mental, homens ou mulheres, com, no entanto, diferenças de gênero: os homens com problemas comportamentais têm maior probabilidade de cair no alcoolismo ou na dependência de drogas, enquanto as mulheres têm maior probabilidade de sofrer depressão severa ou hiperatividade. E a frequência de certos distúrbios se acelerou acentuadamente nos últimos anos, sobre os quais dispomos de estatísticas, entre 2014 e 2017.
Com base nesta observação, estão previstos vários cenários. No primeiro, conhecido como cenário de referência, os distúrbios atualmente observados podem ser apenas temporários e a frequência das doenças físicas ou comportamentais pode retornar gradualmente às cifras registradas anteriormente. Porém, ao contrário do que foi observado no passado com causas específicas e bem identificadas, está longe de ser obtida uma correção relativamente rápida, o que justifica a construção do chamado cenário adverso, podendo a realidade se inscrever entre esses dois extremos.
Tanto em um cenário como no outro, os responsáveis pelo estudo acreditam que os Estados Unidos estão caminhando rumo a gastos maiores com saúde, observando que a frequência mais elevada dos casos de hipertensão ou de colesterol alto ainda não levam a gastos maiores, os efeitos indesejáveis dificilmente se farão sentir antes dos quarenta anos; portanto, espera-se uma aceleração clara no futuro.
A saúde precária levaria a problemas financeiros que, por sua vez, levariam a novos problemas de saúde, etc.
Os Estados Unidos já dedicam mais de 17% do seu PIB à saúde; nos próximos dez anos, essa soma poderá aumentar para 20%, incluindo os gastos bancados pelas famílias e pela coletividade.
Para os economistas, esse aumento nos gastos com saúde pode ter duas consequências: por um lado, poderia impedir que as famílias gastassem seu dinheiro com outras despesas, o que poderia desacelerar outros setores da economia; por outro lado, poderia ter um efeito provocador de ansiedade, pois as famílias acham ainda mais difícil equilibrar seus orçamentos e, portanto, ajudam a acelerar ainda mais a frequência de distúrbios comportamentais. Esta última consequência pode ter um impacto importante, porque seu efeito seria cumulativo: problemas de saúde levariam a problemas financeiros, que, por sua vez, levariam a novos problemas de saúde, etc.
Mais importante, o que preocupa os economistas da Moody's Analytics é o impacto geral na economia dos Estados Unidos que esses problemas de saúde poderiam ter, dado o crescente papel desempenhado pelos millennials no mercado de trabalho à medida que a geração do baby-boom desaparece; com mais licenças médicas ou ainda mais pessoas que não trabalham mais ou trabalham menos, que são menos produtivas do que os seus pais, é uma geração que pode ver sua renda per capita cair de 1% a 11% de acordo com o cenário escolhido em comparação à geração X. E, no total, o PIB dos Estados Unidos poderia crescer menos rapidamente do que se essa geração tivesse se beneficiado das mesmas condições de saúde que aquelas que a precederam.
Tudo isso é realmente sério, doutor? De fato, a parte mais interessante deste estudo aparece no final, quando os economistas chegam à questão das desigualdades de renda. Que os problemas de saúde dos millennials afetem sua produtividade e tenham um impacto negativo no crescimento do PIB podem de fato parecer secundários. A verdadeira questão é saber a causa desses problemas. E aqui descobrimos um fato que confirma que a relação entre saúde e economia segue nos dois sentidos. Os estudos comparando os dados recolhidos de condado a condado mostram que os problemas de saúde surgem nas regiões onde a economia já mostrava sinais de fraqueza, medida pelos níveis de renda, pelos custos da habitação ou pelas taxas de desemprego.
E aí os economistas da Moody's Analytics apontaram um fenômeno que poderia nos interessar também na França. A priori, nossos sistemas de saúde e de proteção social diferem significativamente daqueles dos Estados Unidos e os problemas que afetam a geração americana dos millennials podem não ser encontrados neste lado do Atlântico [isto é, na Europa]. Mas não vemos por que a relação entre bem-estar material e saúde não se possa verificar também aqui. Há um ano, durante a crise dos “coletes amarelos”, a questão da diferença nos padrões de vida entre os diferentes territórios da França apareceu brutalmente em plena luz. E, desde então, também continuamos a falar sobre o problema dos desertos médicos. Sem dúvida, há aqui uma questão a ser acompanhada muito de perto.
Basicamente, a questão não é saber se corremos o risco de perder um ou dois décimos de ponto percentual do crescimento do PIB a cada ano, mas saber se em nosso país também não haveria áreas onde o progresso teria se estancado. Porque, no final das contas, essas estatísticas americanas constituem uma salutar chamada à ordem: não há garantia de que cada geração seja levada a viver mais e com melhor saúde do que a geração anterior, como vimos durante várias décadas. A história pode nos reservar algumas surpresas ruins, se não tomarmos cuidado.
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Nos Estados Unidos, a péssima saúde dos millennials preocupa os economistas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU