04 Outubro 2017
Do roteiro do filme "The Young Pope" (Paolo Sorrentino, "Il peso di Dio. Il Vangelo di Lenny Belardo”, Turim, Einaudi, 2017, 140 páginas, € 13) o jornal L’Osservatore Romano, 01-02-107, transcreve uma resenha publicada no suplemento dominical de Il Sole 24 Ore de 9 de abril de 2017 de autoria de Lucetta Scaraffia. A tradução é de Luisa Rabolini.
A beleza de Jude Law, a perfeita reconstrução dos ambientes do Vaticano, a inquietante ambivalência de quase todos os personagens fizeram da série The Young Pope um sucesso, e não são poucos a aguardar ansiosamente sua continuação. Mas talvez esse excesso de imagens cuidadosas, de figuras bem-sucedidas, distraiu de uma leitura mais aprofundada de um roteiro ambicioso, nada fácil. Por esta razão, é interessante ler o texto de Sorrentino no qual se baseia a série, precedido por uma introdução que, embora negue ter mensagens a transmitir, explica bastante sobre a experiência da qual se originou.
Aluno até os dezoito anos de uma escola salesiana, o diretor conta o efeito, ao mesmo tempo misterioso e repugnante, que os religiosos exerciam sobre os garotos, e a presença, escondida, mas essencial, das irmãs: "O pensamento malévolo, quando você entra de soslaio no mundo clerical, é que as irmãs, na realidade, foram reduzidas a um exército de empregadas domésticas com um véu. É uma suspeita justificada. Dizem que estão a serviço de Deus, mas, na maioria dos casos, estão a serviço dos padres". Sorrentino reserva outra farpa ao uso do jargão clerical, retumbante e incompreensível, bem sintetizado pelo título da apostila exibida a cada ano, como novidade, pelo professor de religião: "Projeto educativo pastoral".
O roteiro assim esclarece o profundo motivo da série: estar em paradoxal equilíbrio entre a crítica dura e a esperança. Crítica da Igreja existente, mas, de alguma forma, ainda esperança que dali possa vir algo de bom. O jovem papa está consciente que no plano da popularidade, do sucesso midiático, todas as armas já foram usadas e abusadas e que, depois de anos de papas aclamados como estrelas de rock, mas pouco ouvidos como guias espirituais, o único caminho para realmente conseguir sacudir os corações das pessoas, a única estrada para tocar os fiéis, são o silêncio e o mistério. O papa jovem e bonito, que se recusa ser visto em público é um sinal gritante desse ponto de não retorno do qual a Igreja não sabe como sair. Uma Igreja bem representada pelo Cardeal Secretário de Estado, pronto a todas as torpezas para manter o poder, mas capaz de compaixão e carinho por um jovem portador de deficiências e uma paixão pueril pelo seu time de futebol.
Mas os personagens principais não são aqueles que procuram fazer uma carreira na Igreja, mas aqueles que buscam Deus: além de Lenny (o jovem papa), o seu amigo Dussolier e a irmã Mary, que criou ambos no orfanato. Todos os três órfãos, órfãos daquele Deus em quem não se consegue mais acreditar, aquele Deus que parece ter abandonado os seres humanos.
Os milagres de Lenny não são, dessa forma, tanto uma prova da existência de Deus, quanto da força do apelo desesperado que lhe apresenta um órfão. É justamente neste pedido desesperado, reconhecido até o fundo exatamente no protagonista e posto, com a sua eleição como papa, dentro da instituição eclesial, que se diferencia Sorrentino de quem realiza filmes críticos sobre o clero e sobre a Igreja.
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O Evangelho de Lenny Belardo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU