Pouco a pouco esquecemos Deus e depois esquecemos que o esquecemos. Nós diminuímos o evangelho para que não tenhamos que nos converter muito. Direcionamos a vontade de Deus para o que nos interessa e esquecemos sua exigência absoluta de amor.
O artigo é de José Antonio Pagola, teólogo espanhol, publicado por Religión Digital, 26-08-2024.
Os cristãos de primeira e segunda geração lembravam-se de Jesus não tanto como um homem religioso, mas como um profeta que denunciava corajosamente os perigos e as armadilhas de todas as religiões. Sua coisa não era a observância piedosa acima de tudo, mas a busca apaixonada da vontade de Deus.
Marcos, o evangelho mais antigo e direto, apresenta Jesus em conflito com os setores mais piedosos da sociedade judaica. Entre suas críticas mais radicais, duas devem ser destacadas: o escândalo de uma religião desprovida de Deus e o pecado de substituir sua vontade por "tradições humanas" a serviço de outros interesses.
Jesus cita o profeta Isaías: "Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim. A adoração que eles me dão é vazia, porque a doutrina que eles ensinam são preceitos humanos". Em seguida, ele denuncia em termos claros onde está a armadilha: "Você deixou de lado o mandamento de Deus de se apegar à tradição dos homens".
Este é o grande pecado. Uma vez que estabelecemos nossos padrões e tradições, nós os colocamos no lugar que somente Deus deve ocupar. Nós os colocamos acima até mesmo de sua vontade: não devemos ignorar a menor receita, mesmo que vá contra o amor e machuque as pessoas.
Nessa religião, o que importa não é Deus, mas outros tipos de interesses. Deus é honrado com os lábios, mas o coração está longe dele; um credo obrigatório é pronunciado, mas o que é apropriado é crido; ritos são observados, mas não há obediência a Deus, mas aos homens.
Pouco a pouco esquecemos Deus e depois esquecemos que o esquecemos. Nós diminuímos o evangelho para que não tenhamos que nos converter muito. Dirigimos a vontade de Deus para o que nos interessa e esquecemos sua exigência absoluta de amor.
Este pode ser o nosso pecado hoje. Agarrar-se como que por instinto a uma religião desgastada sem força para transformar nossas vidas. Continuar a honrar Deus apenas com seus lábios. Resistir à conversão e viva no esquecimento do plano de Jesus: a construção de um mundo novo segundo o coração de Deus.