Cristo Rei – Ano B – Subsídio exegético

19 Novembro 2021

 

"Quando Jesus alega que seu reino não é deste mundo (desta ordem), ele não está falando de um reino fora da história. Mas mostra que há dois critérios: as autoridades judaicas, assim como as romanas, são daqui de baixo; Jesus e seu reino vêm do alto (Jo 8,23s). Os valores daqui de baixo (deste mundo) são a força, as armas, a violência, a injustiça. Os valores do alto são o servir, a doação da vida em prol do ser humano, sem apelo à força e às armas (Jo 18,11). Jesus não terá trono, tropas, armas (v.36), mas é o reino que testemunha a verdade (v.37)."

 

O subsídio é elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF:

- Dr. Bruno Glaab
- Me. Carlos Rodrigo Dutra
- Dr. Humberto Maiztegui
- Me. Rita de Cácia Ló

Edição: Prof. Dr. Vanildo Luiz Zugno

 

Leituras do dia

 

Primeira Leitura: Dn 7,13-14
Salmo: 92,1ab.1c-2.5
Segunda Leitura: Ap 1,5-8
Evangelho: Jo 18,33b-37

 

O Evangelho

 

O que entender por Jesus, rei? A arte sacra representou Jesus como os reis deste mundo, formando uma mentalidade triunfalista. Mas é bem isto que o texto de hoje reprova. Jesus recusou as perspectivas messiânica dos seguidores (Jo 6,15; Mc 8,31; 10,35-45). Somente diante da morte iminente ele assume ser rei (Jo 18,37; Mc 14,62). Mas um outro tipo de rei, bem diferente dos reis deste mundo.

 

O evangelho de João fala pouco do Reino de Deus (Jo 3,3.5). Nisto ele diverge dos evangelhos sinóticos. Porém, fala do reino de Israel/judeus (Jo 1,49. 6,15; 12,13; 18,33.36-37.39; 19,3.12.14.15.19.21). O conceito de rei de Israel/judeus é um conceito diferente do Reino de Deus. O primeiro tem conotação política, o segundo tem conotação teológica. No texto de hoje, Pilatos pensa no sentido de rei de Israel/judeu, e Jesus, em sua resposta, sai desta área para o conceito de Reino de Deus; ou ainda, o diálogo de Jo 18,33-37 culmina e reinterpreta toda questão da realeza que se começa a insinuar a partir de Jo 1,49; 6,15; 12,13. A realeza de Jesus só se pode entender à luz da cruz.

 

Pilatos, em suas indagações, orientado pelos chefes religiosos, pensa num rei político (Jo 6,15; 12,13) que poderia significar uma ameaça ao império Romano. Jesus, porém, não se enquadra neste esquema. Seu reino não é hereditário de Davi (João não menciona a suposta descendência davídica de Jesus, como Mt 1,1-17; Lc 3,23-38). Mas vem do alto (Jo 3,13; 8,23). Logo, sua realeza não é imposta pela força, mas requer adesão livre. Não tem soldados, mas seguidores.

 

Quando Jesus alega que seu reino não é deste mundo (desta ordem), ele não está falando de um reino fora da história. Mas mostra que há dois critérios: as autoridades judaicas, assim como as romanas, são daqui de baixo; Jesus e seu reino vêm do alto (Jo 8,23s). Os valores daqui de baixo (deste mundo) são a força, as armas, a violência, a injustiça. Os valores do alto são o servir, a doação da vida em prol do ser humano, sem apelo à força e às armas (Jo 18,11). Jesus não terá trono, tropas, armas (v.36), mas é o reino que testemunha a verdade (v.37).

 

Aqui convém indagar, como Pilatos: “o que é a verdade?” Os reis desta terra dominam, exercem poder (Mc 10,42ss). Esta é a grande mentira. A verdade da qual a realeza de Jesus dá testemunho, é o oposto: o servir como os últimos (Mc 10,43-45). Ele é a realização do projeto de Deus na história. Ele é a resposta à aspiração central do ser humano, o desejo de realização plena. Desta forma, Jesus é a plena verdade de Deus e a plena verdade do ser humano, o que os reinos deste mundo negam pela sua ambição, força e domínio.

 

Assim seria um erro entender o reino de Jesus como algo fora da história, mas antes, este reino diferente dos reinos deste mundo, é a verdadeira orientação da história para que todos tenham vida plenamente (Jo 10,10). Por isto mesmo, os discípulos de Jesus estão no mundo, mas não na lógica do mundo (Jo 17,14-16), pois não o devem reproduzir: “Entre vós não seja assim” (Mc 10,43). O Reino de Jesus não é fuga do mundo, mas a quebra da lógica dos poderes mundanos, é a superação das forças malignas. Dir-se-ia, então, que a verdade que nem Pilatos e nem os interlocutores judeus puderam entender, é a nova lógica do amor e da doação da vida para a fraternidade universal. Quem é da verdade, isto é, da fraternidade, adere a Jesus, ou vice-versa. Tanto Pilatos, como as autoridades religiosas viviam na mentira e por isto rejeitaram Jesus e seu reino.

 

Reino de Deus, ou de Jesus, é a realização na história daquilo que Deus desde a eternidade projetou para a vida do mundo. Por isto mesmo, celebrar Jesus, Rei do Universo é, mais do que pensar na eternidade, pensar na vida já aqui neste mundo.

 

Relação com as outras leituras

 

Como no evangelho, também em Dn 7 (1ª leitura) se contrapõem dois reinos. Os reinos deste mundo com suas violências (7,2-8) e um outro reino que vem do alto, isto é, de Deus. Ele derrota os reinos do mundo. Na segunda leitura se acena para a realização final do reinado de Cristo que é o príncipe dos reis da terra. Ou seja, a realeza de Cristo começa na história e culmina na eternidade.

 

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