20 Dezembro 2018
É também a missão dos cristãos levarem aos não crentes a presença de Cristo Ressuscitado. Eis aqui o sentido da festa de Natal que nós celebramos nesta semana. Estamos grávidos de Cristo? Estamos dispostos a mostrar a sua presença ao mundo de hoje? Estamos prestes a dar a luz?
A reflexão é de Raymond Gravel (+1922-2015), padre da arquidiocese de Quebec, Canadá, publicada no sítio Réflexions de Raymond Gravel, comentando as leituras do 4o Domingo de Advento - Ciclo C. A tradução é de Susana Rocca.
Eis o texto.
Referências bíblicas:
1a leitura: Miqueias 5,1-4
2a leitura: Hebreus 10,5-10
Evangelho: Lc 1,39-45
Desde o início do Avento nos preparamos para celebrar o Natal, pois o Natal se atualiza a cada ano; isso quer dizer que nós fazemos renascer o Cristo nas nossas vidas. Eis a Boa Nova de Natal: o anúncio do nascimento do Cristo da Páscoa. Mas não é só escutar e receber a Boa Nova: é preciso levantar e ir anunciá-lo, como faz Maria, símbolo da Nova Aliança, no evangelho de hoje, no encontro com Isabel, a mulher do sacerdote Zacarias, símbolo da Antiga Aliança, para receber a confirmação da sua missão. Sem isso, não haveria nascimento nem Verbo feito carne. O que nos dizem os textos bíblicos deste domingo?
Fazia muito tempo que se esperava um Messias, um libertador, um salvador. Já no século VII a.C., o profeta Miqueias, contemporâneo de Isaias, viu as graves injustiças sociais do seu tempo cometidas pelos reis, um mais corrupto que outro, e anunciou a destruição de Jerusalém. Haverá um tempo difícil em que se dirá que Deus abandonou seu povo... mas isso não vai acontecer: “Pois Deus os entrega só até que a mãe dê à luz, e o resto dos irmãos volte aos israelitas” (Mi 5,2).
Miqueias está tão decepcionado do reinado em Israel que ele não ousa utilizar o termo rei para anunciar aquele que vai vir. E, olhando para aquela que tem que dar à luz, como fez Isaias diante dele: “A jovem concebeu e dará à luz um filho, e o chamará pelo nome de Emanuel” (Is 7,14). Miqueias faz alusão ao prestígio da rainha mãe em Israel, como na época do Antigo Oriente. É sob a influência desses dois profetas que São Lucas, nas suas narrativas da infância, no trecho que temos hoje, testemunha sua veneração a Maria, mãe do Messias, como o indicava Isabel: “Como posso merecer que a mãe do meu Senhor venha me visitar?” (Lc 1,43). Com a palavra Senhor, utilizou-a após a Páscoa na boca de Isabel, o que quer dizer que Maria é a mãe do Messias, de Cristo Ressuscitado, pois é após a Páscoa que Jesus foi reconhecido como tal.
Por outro lado, a espera do Messias foi tão longa que, do século VIII a.C. até o século I d.C, nada aconteceu. Acreditou-se várias vezes que o Messias tivesse chegado, mas foi sempre por pouco tempo. Pelas guerras sucessivas, o povo de Israel foi oprimido e a sua terra foi sempre ocupada pelos estrangeiros. Mas após a morte de Jesus na cruz da Sexta-Feira Santa, os homens e as mulheres, discípulos seus que o haviam acompanhado, tomaram consciência pouco a pouco que as promessas dos profetas da Antiga Aliança agora estariam sendo realizadas. Esse Jesus que vimos morrer, Deus o ressuscitou. Ele o fez o Cristo e Senhor, e o sacrifício da sua vida vem selar uma Nova Aliança entre Deus e o seu povo.
Na Antiga Aliança, ofereciam-se constantemente sacrifícios e holocaustos a Deus para expiar os pecados. Mas tinham que fazê-lo sempre de novo. É por isso que o autor anônimo da carta aos Hebreus escreve: “Primeiro diz: ‘Não queres e não te agradam sacrifícios e ofertas, holocaustos e sacrifícios pelo pecado’. Trata-se de coisas que são oferecidas segundo a Lei” (Hb 10,8). E ele continua: “‘Eis-me aqui para fazer a tua vontade’. Desse modo, Cristo suprime o primeiro culto para estabelecer o segundo” (Hb 10,9). Então, a pergunta que deveríamos fazer é: como pode ser que na Igreja atual tenha se restabelecido o antigo culto na celebração do Santo Sacrifício da Missa? E pior ainda, sendo que no culto antigo se fazia uma vez ao ano, enquanto que alguns padres atualmente o fazem todos os dias, mesmo se eles celebram a sós, diante de uma armário.
E ainda o autor da Carta aos Hebreus o diz claramente: “É por causa dessa vontade que nós fomos santificados pela oferta do corpo de Jesus Cristo, realizada uma vez por todas” (Hb 10,10). Então, a missa não pode ser uma repetição do sacrifício da cruz. Ela não faz sentido se ela não for uma celebração da Páscoa, isto é, uma festa comunitária onde se celebra a Vida do Ressuscitado. Quando Cristo nos diz: Façam isto em memória de mim, ele quer que nós doemos a nossa vida aos outros como ele próprio doou a sua. Não é a flagelação e a crucifixão que devemos celebrar, mas sim a vida do Ressuscitado. É a missão que nos foi confiada.
Assim que Maria, a Igreja, soube que levava a Cristo nela, a sua missão começou. Ela se expressa no caminhar: “Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se, às pressas, a uma cidade da Judeia” (Lc 1,39) Se levamos a Cristo em nós é para dá-lo aos outros. Ao mesmo tempo, temos necessidade de sermos confirmados na nossa missão: “Entrou na casa de Zacarias, e saudou Isabel” (Lc 1,40). Zacarias é um sacerdote da Antiga Aliança e Isabel leva nela mesma o último dos profetas que reagiu favoravelmente, no seio da sua mãe, à chegada de Maria: “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança se agitou no seu ventre, e Isabel ficou cheia do Espírito Santo” (Lc 1,41). Foi a confirmação da Nova Aliança pela Antiga Aliança: “Você é bendita entre as mulheres, e é bendito o fruto do seu ventre!” (Lc 1,42).
Como bem disse o exegeta francês Claude Tassin: “O episódio da Visitação não se reduz a um ensinamento sobre o serviço, dado pela mãe do Messias. Pois essa página de Lucas tem um importante conteúdo simbólico: Maria, a jovem Igreja, habitada pelo Cristo, vai ao encontro da velha Isabel, habitada pelo último dos profetas. Maria vê a sua anunciação confirmada por Isabel; a Igreja vê a sua missão confirmada por Israel, o filho mais velho”. Quando Isabel anuncia a bem-aventurança: “Bem-aventurada aquela que acreditou, porque vai acontecer o que o Senhor lhe prometeu” (Lc 11,28), um pouco depois, no evangelho de Lucas, esta bem-aventurança se aplica a todos os crentes: “Mais felizes são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática” (Lc 11,28).
Nisso, diz Tassin, a Visitação concerne a todos e todas nós: “Toda pessoa cristã e toda Igreja estão grávidas da presença de Cristo para dá-lo ao mundo”. É também a missão dos cristãos levarem aos não crentes a presença de Cristo Ressuscitado. Eis aqui o sentido da festa de Natal que nós celebramos nesta semana... Estamos grávidos de Cristo? Estamos dispostos a mostrar a sua presença ao mundo de hoje? Estamos prestes a dar à luz?
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Como alcançarei essa felicidade? Uma feliz visita (Lc 1,39-45) - Instituto Humanitas Unisinos - IHU