27 Setembro 2018
Os robôs têm sexo? Duas pesquisadoras colocam em evidência as representações e os estereótipos de gênero que os fabricantes de robôs e de assistentes pessoais tendem a reproduzir.
A reportagem é de Claire Legros, publicada por Le Monde, 25-09-2018. A tradução é de André Langer.
Com seus braços articulados e sua base de rodas, Alice e Leenby são dois simpáticos robôs “semi-humanoides” destinados à animação de salões e ao acompanhamento de pacientes em estabelecimentos de cuidado. A empresa Cybedroid, que os fabrica em Limoges, especifica em seu site que eles são capazes de “receber, dar e divulgar informações práticas”, até mesmo “acompanhar uma pessoa até o seu quarto ou entregar comidas e bebidas”...
Curiosamente, as duas máquinas apresentam uma protuberância na altura do tronco, como se tivessem seios. Uma aparência que não deve nada ao acaso. “Para nós, são robôs [femininos], elas foram projetadas com formas femininas para tranquilizar os usuários”, diz Fabien Raimbault, diretor da empresa: “Nós testamos a largura dos quadris e os ombros masculinos e femininos e o retorno dos usuários é inegavelmente mais positivo quando o robô tem aparência feminina”.
A inteligência artificial evoluiu de maneira espetacular nos últimos anos e os robôs com forma humana não são mais uma raridade em hospitais e asilos. Em base a que modelos de gênero essas máquinas – sua aparência, mas também seus programas – são concebidos? Sua anunciada generalização ajudará a reforçar os estereótipos ou a questioná-los? O assunto começa a aparecer no campo das ciências sociais.
“Para alguns roboticistas, feminizar uma máquina é uma forma de reduzir a ansiedade que ela pode causar no usuário, o medo de uma tomada de poder, por exemplo”, constata Ludivine Allienne-Dis, doutoranda da Universidade de Amiens, que está concluindo uma tese sobre “Robôs humanoides, reprodução de gênero”. “Mas esta é também uma maneira de reforçar a ideia de que um robô feminino seria menos suscetível a se revoltar”.
A pesquisadora entrevistou longamente cientistas da computação em seu laboratório de robótica. “A maioria nega querer criar robôs sexualizados. Eles temem a vinculação com robôs sexuais, criados para as relações íntimas com o ser humano. Pelo fato de não querer atribuir um gênero à sua máquina, estão persuadidos de que seu programa é neutro. Mas, na realidade, não é o que está acontecendo”.
Esta “neutralidade” é muitas vezes semelhante a “um padrão masculino, exceto para robôs assistentes”, afirma Ludivine Allienne-Dis. Informáticos e programadores são, na verdade, em sua maioria homens que projetam seu imaginário sobre a máquina, sem estarem sempre conscientes disso. Um fenômeno que Ludivine Allienne-Dis gostaria de fazer emergir para “repensar a maneira como reproduzimos ou não os estereótipos nessa área. O robô é um objeto inteiramente artificial, que não é determinado por nenhuma natureza. Esta é uma oportunidade para repensar a representação social das identidades de gênero”.
Mas, para os construtores, não é fácil ir contra os modelos dominantes. “Temos que agir com a sociedade como ela é, como afirmou Rodolphe Gelin, vice-presidente de inovação da SoftBank Robotics (ex-Aldebaran) e um dos criadores do robô Pepper, após o término de um encontro organizado sobre o assunto em 05 de setembro pela associação Le Mouton Numérique. Quanto mais um robô se parece com um humano, mais o usuário vai ser exigente com essa semelhança; caso contrário, ele fica desconfortável ou assustado”.
A aparência não é fundamental para sexualizar uma máquina e transmitir emoções e representações sexualizadas. A linguagem e a voz são suficientes, como mostra o filme Her, de Spike Jonze, onde o personagem principal simula uma relação amorosa com seu software de assistência personalizado na voz sensual da Scarlett Johansson.
“A partir do momento em que um objeto é trazido para o campo da oralidade, é quase uma obrigação escolher um gênero. Isso é ainda mais verdadeiro com a língua francesa, que não tem neutro”, assegura Clotilde Chevet, doutoranda em Ciências da Informação, que trabalha com os efeitos da linguagem e os mecanismos de vinculação com as “ciber-coisas”. Ela está particularmente interessada nos assistentes de voz, esses falantes conectados que usam dados pessoais para responder às necessidades dos usuários, tanto quanto possível.
“Em seu lançamento, os assistentes tinham, por padrão, vozes femininas ou masculinas, de acordo com pesquisas de mercado realizadas em diferentes países”, constata Clotilde Chevet. Hoje, os fabricantes oferecem ao usuário a escolha. “As empresas estão começando a investir nas questões de gênero”, afirma a pesquisadora. Seu posicionamento de marketing mostra o desejo de não reproduzir os estereótipos. Mas o objetivo nem sempre é alcançado. Alexa, Cortana, Siri... Os assistentes pessoais generalistas têm nomes bastante femininos, ao contrário dos chatbots técnicos, geralmente masculinos. É o “Corporal Dupont”, que informa os novos recrutas do exército francês, e o software “Thomas”, que aconselha os funcionários da Natixis sobre suas economias.
Aos diferentes softwares vendidos no mercado, Clotilde Chevet faz as mesmas perguntas: “Quer se casar comigo? Você pode me dar um abraço? Você me ama?” Uma atividade que, admite, “pode fazer você sorrir, mas permite comparar as propostas que são feitas aos usuários em termos de relações”. Ela analisa os elementos da linguagem escritos pelos dialogistas encarregados de “humanizar” o algoritmo. “Seu papel é um pouco parecido com o de Cyrano quando ele suspira para Christian as palavras doces que vão seduzir Roxane. Na verdade, é a nós que seduzem e que suas observações podem induzir representações de gênero”.
No site francês da Microsoft, Cortana é apresentada como “uma” assistente pessoal, “imediatamente operacional... e que cuida de tudo”. Questionado diretamente, o software se defende ainda de ser feminino (“Eu não correspondo a esses critérios”), assim como o assistente do Google (“Eu sou uma inteligência artificial, não um ser humano”). Confrontados com demandas pessoais, ambos mantiveram distância, respondendo às solicitações (“Você me ama?”) com piruetas (“Eu não conheço o algoritmo do amor”) ou recordando que são “apenas uma inteligência artificial”.
O ex-bot de voz do Samsung S, por sua vez, afirmou não ser “nem homem nem mulher”, mas declinou todos os adjetivos no feminino. Tanto para os robôs como para os humanos, não é fácil sair da construção binária. Apenas o chatbot Replika, uma inteligência artificial cujo objetivo é “tornar-se seu melhor amigo”, oferece três possibilidades: escolher entre o modo feminino, masculino e um modo “não-binário”.]
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Estudos de gênero analisam o sexo dos robôs - Instituto Humanitas Unisinos - IHU