14 Abril 2018
Novas iniciativas estão sendo implementadas para armazenar energia no mundo.
A reportagem é publicada por BBC Brasil, 12-04-2018.
Em muitas partes do mundo desenvolvido, basta acionar um interruptor para ligar uma lâmpada, uma máquina de lavar roupa, uma televisão ou um computador.
Mas não é em todo lugar que isso acontece.
Na maioria dos países em desenvolvimento, a demanda por energia está aumentando. Como resultado, apagões constantes são registrados e, não raro, se vê com frequência cidades ‘às escuras’.
Todas as fontes de energia são intermitentes, em maior ou menor grau. Mas, por sua natureza, a produção de energia renovável se move entre dois extremos: ou gera muita energia ou não gera o suficiente para atender à demanda.
Por essa razão, especialistas vêm tentando descobrir novas formas de melhorar o armazenamento de energia, de forma que o excedente, se houver, possa ser usado posteriormente quando houver desequilíbrio entre a oferta e a demanda de eletricidade.
“A necessidade de armazenar energia surge quando você entende como é incrivelmente difícil gerar eletricidade”, diz Benjamin Sovacool, professor de Política Energética da Universidade de Sussex, no Reino Unido.
Embora 176 países no mundo, incluindo o Brasil, tenham uma política de energia limpa, o mundo ainda depende em grande parte do petróleo, do gás e do carvão.
São combustíveis fósseis que, segundo cientistas ambientais da ONU, terão “impactos sérios, generalizados e irreversíveis sobre as pessoas e os ecossistemas” se nada for feito para mudar essa realidade.
John Goodenough, um cientista pioneiro e professor universitário, criador de baterias de íons-lítio, defende que a humanidade precisa repensar como produz e armazena energia.
“A dependência da sociedade moderna de combustíveis fósseis não é sustentável. Portanto, temos que encontrar em um futuro muito próximo uma maneira de produzir energia e, em seguida, armazená-la em uma bateria [em larga escala]”, diz ele.
Mas as baterias de íon-lítio também têm suas desvantagens, lembra Goodenough.
“As pessoas têm que ter muito cuidado. Se você criar uma bateria em grande escala, tem que monitorar muitas células. Por exemplo, o carro Tesla tem 7 mil células, tudo tem que ser bem gerido, e ele [o presidente da Tesla, Elon Musk ] sabe como fazer isso muito bem”, acrescenta.
A americana Tesla, conhecida por seus carros elétricos, investiu tempo em tecnologia e produção de baterias para compor seus carros elétricos.
Agora, a empresa investe em um armazenamento em grande escala para fornecer energia em locais que sofreram blecautes.
Por isso, lançou recentemente o maior conjunto de baterias de íons-lítio do mundo em Hornsdale, na Austrália.
Os veículos elétricos também podem ser usados como centros de troca e armazenamento de energia.
Os chamados “veículos conectados à rede”, ou V2G (do inglês vehicle-to-grid), podem captar energia da rede elétrica e devolver o que não gastaram.
Fabricantes de automóveis como Nissan, BMW e Honda estão analisando a possibilidade de produzir veículos do tipo V2G em colaboração com empresas de energia e software.
Forsyning Frederiksberg, uma empresa dinamarquesa, substituiu dez dos seus veículos por caminhonetes da Nissan totalmente elétricas e instalou dez pontos de carga “bidirecional” (para a captura e devolução de energia).
Neste sentido, seus operários saem com seus veículos pela manhã, fazem seu trabalho pela cidade e, à tarde, conectam o veículo de volta ao ponto de carga.
Feito isso, a rede pode usar a energia restante nas baterias das caminhonetes.
Por outro lado, o software Nuvve, desenvolvido pela Universidade de Delaware (Estados Unidos), conecta-se à rede e monitora constantemente suas necessidades energéticas.
Se houver uma flutuação energética, por exemplo, é possível ativar as baterias conectadas à rede para fornecer energia em questão de segundos.
“Chamamos isso de uma usina de energia virtual”, diz Marc Trahand, diretor de operações da Nuvve na Europa.
“Todas essas pequenas baterias juntas se tornam uma grande estação de energia que você pode ativar na rede”, acrescenta.
Mas segundo Kotub Uddin, especialista em veículos da Universidade de Warwick, na Inglaterra, e atual chefe de armazenamento de energia na OVO Energy, para que a tecnologia V2G decole comercialmente, será necessário que os proprietários tenham certeza de que as baterias dos veículos não serão danificadas.
Carregar e descarregar a bateria repetidamente pode causar danos. A resposta para esses problemas é um carregamento inteligente, diz ele, em que a deterioração seja mínima, com uma extensão da vida útil de sua bateria.
No mundo desenvolvido, há mais de 1 bilhão de pessoas sem acesso à eletricidade, dizem especialistas.
Koen Peters, diretor executivo da Global Off-Grid Lighting Association (Gogla), aponta que outras 1 bilhão não têm um fornecimento de energia de maneira confiável, ou seja, regular.
Para ele, os números são uma indicação de que existe um grande mercado para energia renovável fora da infraestrutura convencional, especialmente em lugares em que pode não ser economicamente viável conectar-se a uma rede de abastecimento.
“Ainda não exploramos totalmente esse mercado”, diz ele.
Dados confirmam esse crescente interesse.
Desde 2010, as vendas de painéis solares para o armazenamento de energia cresceram 60%, por exemplo, segundo a Gogla.
As empresas líderes no mercado, M-Kopa Solar e Azuri, D.light e Bboxx, estão aproveitando esse boom e competem para vender painéis solares, lâmpadas e baterias para domicílios na África Central, Oriental e Ocidental e partes da Ásia.
As companhias instalam o equipamento nas residências, que é carregado durante o dia. Os clientes podem, então, usar essa energia armazenada para iluminar a casa à noite e carregar o celular. Outros dispositivos precisam de outros painéis com maior potência.
Monica Keza Katumwine, CEO da Bboxx, sediada em Ruanda, na África, advoga que a empresa pode monitorar remotamente as necessidades de energia ou armazenamento das pessoas.
“O que estamos mudando é ter essa energia, mas sem cabos e postes e todas essas coisas…proporcionamos o mesmo serviço, mas sem a conexão física completa; tudo é feito remotamente”, diz.
Mas esse tipo de infraestrutura ainda é escasso e muito caro. O investimento é alto, o que acaba impactando no preço dos serviços para o consumidor.
Altos custos e investimentos maciços são um problema nos países em desenvolvimento, diz Peters.
Segundo ele, o acesso a esse tipo de serviço gera “um enorme impacto na qualidade de vida”.
A demanda por energia no mundo deve aumentar nos próximos anos, acompanhando o crescimento da população mundial.
Acredita-se que até 2040 a demanda vai aumentar ainda mais na Índia, China e África.
O desafio é ampliar a capacidade das energias renováveis para atender a essa demanda, especialmente em áreas urbanas.
Além disso, não poderemos confiar nos combustíveis fósseis: nos últimos 20 anos, as regulações decorrentes das mudanças climáticas se multiplicaram, impulsionando o uso de energias renováveis, conforme estabelecido no acordo de Paris de 2015.
Então, como será possível combinar o armazenamento de energia com uma maior produção de energia renovável? E como fazer tudo isso de forma eficiente?
Ravi Manghani, diretor de armazenamento de energia da Greentech Media, diz que será necessário inovar.
“O ar comprimido é uma tecnologia interessante”, diz ele. “Pode ser uma forma de armazenamento em massa.”
Uma empresa que vem atuando nesse segmento é a suíça Alacaes, ao perfurar a lateral de uma montanha para ali armazenar ar que pode, então, ativar uma turbina.
Outras tecnologias, como o armazenamento de ar frio, devem mostrar ao mercado que são “tão confiáveis” quanto as tecnologias mais estabelecidas, diz Manghani.
Essa técnica envolve o uso de refrigeração. O ar é resfriado a menos 196 graus Celsius até se tornar líquido. Então, é armazenado a baixa pressão. Mas esse mecanismo, no entanto, ainda está em uma fase muito precária.
Nem todos os especialistas estão confiantes sobre as tecnologias atuais de armazenamento de energia.
Mas seja qual for a tecnologia do futuro, será necessário que empresas de energia, de automóveis e de dados combinem forças.
E como não haverá uma única tecnologia, fica claro que os problemas de armazenamento de energia serão resolvidos de muitas maneiras diferentes.
Indivíduos, empresas, cidades e comunidades estarão envolvidos, desafiando as grandes empresas que dominaram o cenário energético até agora.
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