16 Março 2018
Deus pode conviver muito bem com os buracos negros. “No fundo, o que a Bíblia quer nos ensinar não é tanto como o céu ou as galáxias são feitos, mas simplesmente como se vai para o céu.” Um dia, perto do fim de 1981, quando João Paulo II se encontrou pela primeira vez com Stephen Hawking, alguns meses após o atentado na Praça de São Pedro, ele disse ao gênio da astrofísica e a outros cientistas recebidos no Vaticano mais ou menos essa frase, antecipando assim as bases de um diálogo vindouro que diria respeito ao tema central da relação entre ciência e fé.
A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada no jornal Il Messaggero, 15-03-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Hawking fazia parte, há mais de 10 anos, como membro permanente, da Pontifícia Academia das Ciências, um lugar acadêmico privilegiado, onde dezenas de prêmios Nobel e cientistas se reuniam periodicamente para refletir sobre temas referentes ao futuro da humanidade, falando livremente sobre eles para além das próprias confissões religiosas ou políticas.
A propósito daquele encontro, Hawking comentou que seu interesse pela origem do universo foi despertado de novo precisamente por aquele seminário. Como se sabe, na teoria de Hawking – que aplica a quantização da gravidade para explicar a origem cosmológica do universo – não é necessária a existência de Deus, porque o universo é concebido de tal modo que não precisa de condições limítrofes. Trata-se de uma das descobertas intelectuais mais importantes dos últimos tempos, que, porém, de acordo com bilhões de crentes no mundo, não preenche as respostas sobre a fé, que continua sendo algo poderoso e impenetrável, enraizada no coração humano e capaz de falar para além do espaço-tempo e de se projetar para além de todas as fronteiras.
Existe um além? A resposta para a pergunta que foi uma constante para Hawking é o diálogo entre a ciência e a fé. Quando o Papa Ratzinger foi eleito, ele quis voltar para Roma, mesmo que os movimentos começassem a não ser tão simples por causa do agravamento de sua doença.
O encontro com Bento XVI teve como testemunha o chanceler da Pontifícia Academia das Ciências, Dom Marcelo Sorondo. “Assim que ele o viu, disse: ‘Eu queria vir até o senhor para falar sobre a relação entre a ciência e a fé’. Ele também quis ser abençoado, algo que o Papa Ratzinger fez, fazendo um sinal da cruz em sua testa”.
No entanto, o cientista que, mais do que todos, investigou sobre o mistério dos mistérios, o Big Bang e o início da centelha, professava ser ateu, não acreditava em nenhuma das coisas que não podia explicar, era cético em relação aos milagres, mesmo que os cientistas não conseguiam explicar sua própria vida.
Os médicos lhe haviam dado não mais do que dois ou três anos de vida por causa da esclerose lateral amiotrófica, e, em vez disso, Hawking se casou, teve filhos e viajou pelo mundo para conferências, mesmo que colado em uma cadeira de rodas e em um computador.
Ele afirmou em diversas circunstâncias que não há lugar para Deus na criação do universo, porque a força da gravidade seria a causa de uma autoposição do mundo a partir do nada. Mas Sorondo, que se encontrou com ele muitas vezes, não acredita na tese do ateísmo. Um rótulo superficial que foi colado nele. “Ele não era ateu. No máximo, ele não acreditava no conceito de um Deus tapa-buracos, ou seja, uma divindade que é incomodada sempre que não se consegue explicar alguma coisa. Tanto que ele dizia que fazia ciência, não filosofia”.
Um pouco como São Tomás, quando dizia que o fato de o mundo ter começado é objeto de fé, mas não de demonstração ou de ciência.
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Perguntas sobre a fé. A força de Hawking, o cientista que venceu a deficiência - Instituto Humanitas Unisinos - IHU