31 Agosto 2016
“Bergoglio fez uma síntese concisa e elegante que lhe valeu os aplausos de todos e a atenção de importantes remadores na barca de Pedro. Bergoglio traçava seu perfil: um bispo missionário, próximo aos pobres, livre de falsas ideologias, chamado a ser um profeta da justiça, no qual confiam os marginalizados. Bergoglio havia reunido o que havia de mais valioso do Sínodo. O cardeal Dolan, sucessor de dom Egan, logo contava como dom Egan sempre falava elogiosamente do arcebispo de Buenos Aires”, escreve Manuel Pablo Maza Miguel, S.J., professor da PUCMM – Pontifícia Universidad Católica Madre y Maestra, de Santo Domingo, República Dominicana, em artigo publicado por Listin Diario, 30-08-2016. A tradução é de André Langer.
Eis o artigo.
Os avós do Papa Francisco, Giovanni Angelo Bergoglio e Rosa Margarita Vasallo di Bergoglio, possuíam uma modesta cafeteria em Turim. Eles conseguiam a duras penas manter seus seis filhos, entre eles, Mario, o futuro pai do nosso papa. Giovanni e Rosa sonhavam em emigrar para a Argentina, onde já se encontravam outros irmãos de Giovanni.
No final do século XIX e começo do século XX, milhares de italianos emigraram para a Argentina buscando prosperar. Austen Ivereigh, em sua extraordinária biografia do Papa, repete esta piada: os mexicanos descenderam dos astecas, os peruanos dos incas e os argentinos dos barcos. Jorge Luis Borges dizia em tom de pilhéria, que ele não podia ser um verdadeiro argentino, porque por suas veias não corria sangue italiano (The Great Reformer, 2014, 2 e 3).
Giovanni e Rosa Bergoglio compraram passagens na terceira classe no melhor barco ao seu alcance para cruzar o Atlântico. Tratava-se do Principessa Mafalda, navio insígnia da Navigazione Generale Italiana. Tinha o nome da segunda filha do rei Víctor Manuel III. O barco começou o serviço entre Gênova e Buenos Aires em 1909. A travessia durava 14 dias. O Principessa Mafalda participou dos experimentos de comunicação por rádio de Guillermo Marconi em 1910. No dia 11 de outubro de 1927, zarpou de Gênova. A bordo viajavam 971 passageiros e uma tripulação de 281 marinheiros, 300 toneladas de carga, 300 volumes de correio e 250 mil liras em ouro para o governo argentino.
Após vários percalços, às 17h15 do dia 25 de outubro de 1927, a 80 milhas de Bahía, os passageiros foram sacudidos por vários golpes secos. O capitão tranquilizou a todos. Um dos eixos das hélices quebrou, mas isso, em si, não era nada grave. Na realidade, o eixo quebrado furou o casco do navio em vários lugares. As comportas que poderiam ter isolado a água não funcionavam. O Principessa pediu ajuda, vários barcos apareceram em um mar calmo, mas entre os passageiros reinava a confusão; parte da tripulação desertou. Alguns dos botes salva-vidas estavam imprestáveis, outros não puderam ser usados pela violência e histeria dos passageiros no meio da noite. Ao amanhecer, somente um dos barcos, o Athena já havia recolhido 450 sobreviventes, mas 314 viajantes não sobreviveram.
Os avós de Bergoglio tinham trocado suas passagens na última hora. A venda da cafeteria em Turim tinha se complicado. Viajaram no Giulio Cesare um mês depois. A malograda viagem no Principessa ficou entre as histórias da família.
Uma segunda tragédia atingiu a vida de Bergoglio. Dá-se no contexto do Sínodo de outubro de 2001 sobre o papel dos bispos. Bergoglio já era cardeal desde 21 de fevereiro. Fazia semanas que tinha recebido a incumbência de assistir o relator principal, o cardeal Edward Egan, de Nova York. Mas os ataques terroristas de 9 de setembro obrigaram o cardeal Egan a retornar para Nova York para os funerais das vítimas. De repente, Bergoglio foi o relator principal, encarregado de organizar as 247 intervenções dos bispos em um relatório que daria forma às discussões e conclusões do Sínodo.
Bergoglio fez uma síntese concisa e elegante que lhe valeu os aplausos de todos e a atenção de importantes remadores na barca de Pedro. Bergoglio traçava seu perfil: um bispo missionário, próximo aos pobres, livre de falsas ideologias, chamado a ser um profeta da justiça, no qual confiam os marginalizados. Bergoglio havia reunido o que havia de mais valioso do Sínodo. O cardeal Dolan, sucessor de dom Egan, logo contava como dom Egan sempre falava elogiosamente do arcebispo de Buenos Aires.
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Duas tragédias no passado do Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU