Por: Jonas | 20 Abril 2012
O imperador Constantino, 17 séculos depois, provoca um debate entre o Vaticano e os judeus. Passaram-se 1700 anos desde a conversão do primeiro imperador de Roma ao cristianismo e desde a Batalha da Ponte Mílvia, contra Maxêncio, que assegurou ao neocristão Constantino a vitória “sob o sinal da Cruz”, como conta a lenda. Segundo a Santa Sé, a perseguição dos judeus, por parte do Império Romano, não tem nada a ver com Constantino, nem com sua conversão.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vaticano Insider, 18-04-2012. A tradução é do Cepat.
As perseguições são posteriores ao século quarto e sob o período de Constantino abriu-se apenas uma Igreja cristã em Jerusalém, que naquela época já não era judia, mas pagã, explicou Claire Sotinel, professora de História Romana na Universidade Paris-Est Cretei, durante a apresentação do Congresso Internacional “Constantino o Grande. As raízes da Europa”, que acontece no Vaticano, de 18 a 21 de abril.
Porém, o rabino de Roma, Riccardo Di Segni, não pensa da mesma maneira. “Com a conversão de Constantino tudo mudou – assinalou ao Vaticano Insider o líder espiritual da comunidade judaica mais antiga da Europa. Aquele evento incidiu decisivamente na história e está estreitamente relacionado à perseguição antijudaica”. A conversão de Constantino, acrescenta o rabino de Roma, “dividiu a história como um divisor de águas entre o antes e o depois, causando tal convulsão que mais tarde o imperador Giuliano teria tentado remediar a situação, sendo que por este motivo, os cristãos, polemicamente, o chamariam de o Apóstata”. E negar isto “vai contra toda a evidência histórica”.
Participaram do evento no Vaticano o padre Bernard Ardura, presidente do Pontifício Comitê de Ciências Históricas, o diretor do “L’Osservatore Romano” e historiador da época constantina, Giovanni Maria Vian, e o porta-voz da Santa Sé (como moderador), o padre Federico Lombardi, que acentuou a importância desta iniciativa. Existe uma “lenda negra” ao redor do imperador Constantino, que alimenta os que ainda hoje veem com maus olhos a contribuição dos cristãos na vida pública. Inclusive, por este motivo, neste aniversário de 1700 anos da Batalha da Ponte Mílvia e da conversão de Constantino, o Pontifício Comitê de Ciências Históricas promove este congresso internacional de estudos. Constantino não tem nada a ver com a perseguição antijudaica, explicou Sotinel, que desmistificou a “Espada de Constantino”, de James Carrol, que segue sendo um best-seller, mesmo não tendo bases históricas. “A perseguição antijudaica – argumentou a professora francesa – não é um tema ‘constantiniano’”: é posterior ao século IV.
Para medir o peso histórico do imperador romano, Vian recordou as palavras do estudioso “de formação marxista”, Santo Mazzarino, que em sua obra “O Império Romano”, definiu o imperador como “o homem político mais revolucionário da história da Europa”. “A conversão de Constantino – comentou Vian – é um nó crucial da história do cristianismo, porque ela toca a relação entre a esfera religiosa e a esfera política, uma relação que se transformou radicalmente com as pregações de Jesus”. A união entre as dimensões religiosa e política, acrescentou Vian, “foi quebrada com a pregação autêntica de Jesus. Nas palavras “Dai a César o que é de César...” está o cerne da distinção entre ambas as esferas, a religiosa e a política; somente o cerne, porque depois a história seria entrelaçada de outra forma”.
Vian também recordou que Paulo VI, “no final do Concílio Vaticano II, se indignava e dizia que éramos obrigados a deplorar Constantino, ao passo que foi o maior defensor da liberdade religiosa”. A questão em jogo, inclusive na época do Concílio, era se a “imagem de uma Igreja ideal, livre de todos os condicionamentos temporais, não arriscava a ofuscar a história paleocristã”. Giovanni Maria Vian, que também é membro do Pontifício Comitê de Ciências Históricas e professor de História do Cristianismo na Universidade La Sapienza de Roma, recordou que o cristianismo deve muito a Constantino, porém somente nas Igrejas orientais ele é venerado como santo, posto que sua canonização se deu por um “antipapa”. “Constantino – afirmou o presidente do discatério vaticano, o monge Bernard Ardura – foi, indubitavelmente, um grande imperador e um político genial; conseguiu unificar todo o Império criando Constantinopla, a nova Roma. Desde o Arco do Coliseu até os numerosos testemunhos numismáticos, foi glorificado por seu gênio e se converteu, com o passar do tempo, num ícone deste novo mundo, ou seja, da Europa cristã”.
Porém, é Constantino o pai da hegemonia da Igreja sobre a sociedade e, além disso, das perseguições antijudaicas ou, ao contrário, é o modelo de uma relação entre a esfera religiosa e a esfera política, válida ainda hoje? E não foi graças a Constantino que as diferenças entre o âmbito político e o âmbito religioso, nas sociedades ocidentais, são muito mais nítidas do que em qualquer outra parte? Graças à atualidade destas questões, o Vaticano decidiu estudar a figura do imperador romano que, em 312, se converteu ao cristianismo e um ano mais depois, com o edito de Milão, colocou fim às perseguições aos cristãos. A apresentação do evento, esta manhã (18/04), não deixou de indicar um dos problemas mais polêmicos entre os historiadores: a conversão de Constantino ao cristianismo foi sincera ou uma estratégia política?
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O Imperador Constantino provoca debate entre os judeus e o Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU