Por: Jonas | 15 Julho 2014
Ao lado de São Francisco, Jorge Mario Bergoglio escolheu como seu guia São Pedro de Morrone, Papa durante poucos meses, aos 85 anos de idade. Contudo, segundo os historiadores, esse pontificado foi desastroso.
A reportagem é de Sandro Magister, publicada por Chiesa.it, 12-07-2014. A tradução é do Cepat.
“Estes dois santos deram o exemplo. Sabiam que como clérigos – um era diácono e o outro bispo, bispo de Roma – os dois deviam dar o exemplo de pobreza, de misericórdia e de desapego total de si mesmos”.
Fonte: http://goo.gl/KEsd2z |
É deste modo que Jorge Mario Bergoglio apontou como seu modelo a dois santos: não apenas o previsível Francisco, de quem assumiu o nome, mas também o inesperado Pedro de Morrone, Papa durante poucos meses, no ano de 1294, com o nome de Celestino V.
Fez isso no dia 5 de julho, em Isérnia, cidade que reivindica as origens de Celestino V, no dia de aniversário da elevação ao papado deste santo.
Exatamente aqui está a novidade. Como Papa, Celestino V jamais foi particularmente apreciado por seus sucessores antigos e recentes. Foi muito mais lembrado e admirado por sua “humilde” renúncia do pontificado e mais ainda por sua vida santa anterior, como ermitão.
Ao contrário, Francisco celebrou e destacou Celestino V como seu modelo, na condição de “bispo” de Roma e pontífice. Por ter realizado – disse – com desapego de si e com a primazia dada à misericórdia de Deus, uma escolha “contracorrente, não apenas como ascese pessoal, mas também como testemunho profético de um mundo novo”.
Com efeito, em torno de Celestino V rapidamente floresceu a lenda, antes que se tornasse santo no ano de 1313.
Seu mais confiável biógrafo, o historiador alemão da Igreja Peter Herde, no bem documentado perfil de Pedro de Morrone – Celestino V, publicado por ele na qualificada “Enciclopedia dei papi”, editada na Itália pelo Instituto Treccani, escreve a síntese de uma biografia mais ampla, aceita e apreciada também pelos mais entusiasmados “celestianos”.
“Muito rápido, começou-se a individualizar em Pedro - Celestino, com base nas especulações escatológicas de Joaquim de Fiore, esse Papa angélico que, segundo as profecias difundidas a partir da metade do século XIII, teria inaugurado a época dos monges, purificado a Igreja, reconquistado Jerusalém e preparado o retorno de Cristo”.
Todavia, esta é a lenda, porque quando se lê o capítulo da biografia de Herde sobre o brevíssimo pontificado de Celestino V, a realidade que aparece é muito diferente.
Também é muito diferente da idealização que o papa Francisco fez do pontificado desse seu predecessor.
Pedro de Morrone foi elevado ao papado no dia 5 de julho de 1294, com o voto unânime de uma dúzia de cardeais, após um atribulado conclave que durou mais de dois anos.
Naquele momento, ele tinha 85 anos. Consagrado à vida eremita, havia fundado uma congregação de monges, posteriormente chamados Celestinos, incorporada à Ordem beneditina e rapidamente enriquecida com igrejas, mosteiros e terras agrícolas ao sul de Roma, graças a numerosas doações.
Pedro de Morrone foi totalmente alheio às manobras que o levaram a eleição como Papa. Escreve Herde:
“Os cardeais tentaram encontrar nele um candidato de compromisso como solução de transição, elegendo um eremita inexperiente, muito adiantado em idade, que prometia ser um Papa não muito severo. Foi por certo uma decisão insensata, porque Pedro carecia de todas as condições para dirigir a Igreja com êxito: o conhecimento do complicado aparato curial, do Direito Canônico, dos problemas espirituais e políticos. Além disso, era muito velho para poder se adaptar às novas tarefas”.
Ao saber de sua eleição, em sua ermida de Sulmona, Pedro de Morrone foi vítima do pânico, mas aceitou quando lhe disseram que, caso a rejeitasse, cometeria pecado mortal. O que o sustentou e o tranqüilizou em sua nova tarefa foi, sobretudo, um monarca em quem depositava grande confiança: Carlos II de Anjou, rei de Nápoles e sobrinho de Luis IX, o santo rei da França, que dali para frente exerceu uma pesadíssima influência sobre o ancião.
Carlos II organizou a cerimônia de coroação do novo Papa. Não em Roma – onde Celestino V jamais residiu – mas, sim, em Áquila, cidade que estava dentro de seus domínios. Pedro fez seu ingresso sentado no lombo de um burro, tomando o exemplo de Cristo, gerando no povo a ideia que finalmente havia chegado o Papa angélico das profecias. Em seguida, estabeleceu-se em Nápoles, a capital onde o rei de Anjou o rodeou com homens próprios, além de encher de privilégios reais os mosteiros fundados por Pedro, que não os rejeitou, ainda que pessoalmente tenha permanecido com uma vida austera, em uma cela ajustada expressamente por ele, em Castelnuovo.
No dia 18 de setembro, Celestino V criou novos cardeais. A esse respeito, Herde escreve:
“O longo conclave havia demonstrado a necessidade, mas também Carlos II deve ter incitado o Papa a dar este passo. Era muito importante para o rei introduzir pessoas de sua confiança no colégio cardinalício, também em previsão do próximo conclave. As facções nobiliárias romanas não viram reforçadas suas próprias alas, ao contrário, entre os novos cardeais nem ao menos um provinha do Estado da Igreja. Dos doze cardeais criados por Celestino (o número doze se referia, em sentido escatológico, ao número dos apóstolos), somente cinco eram italianos: Tomás, de Ocre, e Francisco, de Atri, ambos freis da congregação do Papa, o beneditino Pedro de Áquila, bispo de Valva e Sulmona, o napolitano Landolfo Brancaccio, homem de confiança do rei de Anjou, e Guillermo Longo, de Bérgamo. Entre os sete franceses, houve dois monges que Celestino jamais havia visto”.
Escreve também o historiador alemão:
“Era cada vez mais evidente que o ingênuo ancião não estava em condições de governar a Igreja. Na ‘plenitude de sua simplicidade’, como destacaram seus adversários, distribuiu benefícios, dignidades e prebendas pessoais. Sua honradez foi explorada cinicamente por cardeais como Jacobo Colonna e Hugo Aycelin e por funcionários da cúria. Nesta situação, também começaram a criticá-lo os que até então o haviam apoiado. Jacobo de Todi, em uma de suas falas, advertiu-lhe a respeito dos perigos inerentes ao seu ofício”.
É por isso que Celestino V começou a pensar em sua própria renúncia. Seus projetos de abdicação foram examinados escrupulosamente a partir do ponto de vista jurídico. E no dia 13 de dezembro, em Castelnuovo de Nápoles, leu sua declaração de renúncia diante dos cardeais reunidos. Desapegou-se das vestimentas pontifícias e colocou novamente a túnica cinza de sua congregação. O Papa voltou a ser Pedro de Morrone. Seu pontificado durou cinco meses e nove dias. Faleceu no dia 19 de maio de 1296, aos 87 anos de idade.
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Celestino V, um papa modelo? A lenda e a realidade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU