23 Abril 2024
"O uso diário e irresponsável do plástico, aliado à superprodução e à má gestão dos resíduos, constitui uma emergência social e ambiental do nosso tempo".
O alerta é de Carlo Petrini, fundador do Slow Food, ativista e gastrônomo, sociólogo e autor do livro Terrafutura (editora Giunti e Slow Food), no qual relata suas conversas com o Papa Francisco sobre ecologia integral e o destino do planeta, em artigo publicado por La Stampa, 22-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Ontem celebramos o Dia Internacional da Terra. Uma Terra onde o peso total dos produtos de fabricação humana, dos edifícios aos celulares, é maior do que a biomassa viva, ou seja, o peso de todas as plantas e animais juntos. Em termos de massa, o cimento é o material que mais se destaca no mar de artefatos humanos. Porém, se olharmos mais de perto para a difusão, ou melhor, para a invasão, o plástico está sem dúvida entre os materiais mais onipresentes.
Olhem ao seu redor: o tablet, a caneta para escrever, as roupas que vocês vestem, os recipientes dos alimentos, o seu carro. Todos objetos feitos total ou parcialmente de plástico. O plástico nos rodeia a tal ponto que se tornou parte integrante de nós mesmos. Comemos, bebemos e respiramos plástico: na forma de partículas imperceptíveis aos sentidos humanos, invade os organismos dos seres vivos, o ser humano incluído. Não surpreende, portanto, que o tema escolhido para o Dia Mundial da Terra 2024 seja: Planeta contra Plástico; para destacar o fato de que estados perante uma ameaça de âmbito global que primeiro precisa ser reconhecida como tal e depois enfrentada com urgência.
Os cientistas que inventaram o plástico no início do século passado ficariam horrorizados diante do estado atual das coisas. A introdução do plástico permitiu simplificar e melhorar muitos âmbitos das nossas vidas, desde o domiciliar até o sanitário (basta pensar, por exemplo, nas seringas descartáveis) e possibilitou a criação de objetos ou atividades antes impensáveis. O plástico é, portanto, um recurso valioso, mas como infelizmente acontece frequentemente quando se lida com um bem de alta utilidade, não sabemos nos controlar e agimos compulsivamente. O plástico é barato, dúctil, isolante, leve. Acima de tudo, o plástico é durável, poder-se-ia até dizer que é eterno.
No entanto, ironicamente, hoje é o emblema da cultura do descarte. Um objeto de PET comum (o tipo mais comum de plástico) estima-se que possa levar algumas centenas de anos para se degradar.
Isso significa que quem viver nos próximos séculos deste milênio entrará em contato com objetos ou resíduos plásticos gerados neste preciso momento histórico, talvez se refira a eles com o termo "arqueoplástico", termo que tomei emprestado de um projeto italiano que visa conscientizar sobre a poluição do plástico e que considero, no mínimo, eloquente. Nossos ancestrais nos deixaram um patrimônio cultural material inestimável. Nós deixamos em herança um Planeta cheio de plástico.
Desde que a produção em grande escala começou, na década de 1950, foram produzidas 9 bilhões de toneladas. Todos os anos, no Ocidente, consumimos 100 kg cada. Se continuarmos no mesmo ritmo em 2050 chegaremos aos 30 bilhões. É disso que se originam as montanhas de resíduos, ou as ilhas de plástico nos mares, onde 5% do plástico produzido vai parar todos os anos.
O Mediterrâneo, que nos rodeia e nos distingue como península, é uma das áreas mais contaminadas de todas. É um mar fechado, com costas densamente povoadas, dedicadas ao turismo e a inúmeras atividades industriais: todos fatores que facilitam a concentração de plástico. Entre a Córsega e Elba estima-se a presença de 10,5 kg de material plástico por quilômetro quadrado. Em nível mundial, se não agirmos até 2050, teremos mais plástico nos oceanos, em peso, do que peixes. Dados que fazem estremecer e com consequências em cascata que partem do ecossistema marinho e chegam até nós.
Uma das grandes questões a enfrentar são os efeitos a longo prazo, provavelmente prejudiciais, mas ainda não totalmente compreendidos, sobre a saúde. Através da ingestão por peixes, moluscos, crustáceos (que, por sua vez, comemos), mas também apenas pela ingestão de água (83% da água do mundo contém microplásticos), o plástico entrou no circuito alimentar. Comemos microplásticos e obrigamos os nossos filhos a fazê-lo; a tal ponto que até na placenta humana foram encontrados vestígios de plástico.
Comemos plástico e de quem é a culpa? Na Europa, 50% das embalagens são utilizadas para os alimentos. Basta olhar para as embalagens onde há mais plástico do que presunto. Ou os brócolis orgânicos que, por serem orgânicos e terem que garantir a certificação do campo à mesa, os encontramos no supermercado embrulhados em metros de filme. O orgânico foi criado por motivações ambientais, mas depois é embalado em plástico, que danifica o meio ambiente.
O uso diário e irresponsável do plástico, aliado à superprodução e à má gestão dos resíduos, constitui uma emergência social e ambiental do nosso tempo.
O ser humano tem uma engenhosidade extraordinária e a invenção do plástico é um entre muitos exemplos. Pensar apenas nas vantagens decorrentes dos sucessos da nossa inteligência, pelo contrário, torna-nos tolos. Adotemos um governo saudável de limites, interrompamos o círculo vicioso que nos tornou plasticófagos e melhoremos a nossa saúde e aquela do Planeta.
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Aceitar os limites da nossa casa. Artigo de Carlo Petrini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU