20 Junho 2023
“Aqueles que participam diretamente da guerra são os principais envolvidos, mas também o resto do mundo, se tivermos em conta o que está em jogo”, avalia Noam Chomsky, em declaração gravada para a Cúpula Internacional da Paz, realizada nos dias 10 e 11 de junho, em Viena, da qual participaram 32 países, publicada por Ctxt, 15-06-2023. A tradução é do Cepat.
A invasão da Ucrânia avança inexoravelmente aumentando o massacre e a destruição. A opinião geral é que está alcançando uma fase crucial. Os ucranianos são as principais vítimas, mas não estão sozinhos. Em todo o mundo, muitas outras pessoas estão sofrendo gravemente a falta de alimentos e fertilizantes. O mundo inteiro é vítima, talvez uma vítima terminal, do retrocesso dos esforços, muito limitados, para enfrentar a emergência climática no breve tempo em que ainda será possível agir.
Além disso, é muito fácil traçar cenários plausíveis que levariam a uma escalada bélica internacional de grande envergadura: poderia facilmente se transformar em uma guerra nuclear terminal. A Ucrânia, é claro, tomará suas próprias decisões sobre como lidar com os momentos críticos que se aproximam. Nós, não obstante, não somos meros observadores passivos. É claro, aqueles que participam diretamente da guerra são os principais envolvidos, mas também o resto do mundo, se tivermos em conta o que está em jogo.
A racionalidade elementar e a moralidade determinam que analisemos com cuidado e serenidade as opções e perspectivas que se aproximam. A guerra terminará ou não com um acordo diplomático, ao menos isso é indiscutível. Na ausência de um acordo diplomático, uma das partes se renderá, ou a guerra continuará com horrores cada vez maiores. Isso também é dificilmente questionável. Deve ser analisado com mais cuidado.
É bem pouco provável que a Rússia se renda. Caso se depare com a derrota, sempre pode escalar o conflito sem limites. Ainda precisa alcançar todo o potencial das armas convencionais. Como muitos em todo o mundo sabem muito bem, aqueles que falam valentemente sobre a vitória total da Ucrânia estão colocando em jogo a vida dos ucranianos de um modo espantoso. Estão apostando que caso o cachorro louco que retratam sofrer a derrota, fará as malas em silêncio e sairá de fininho até cair no esquecimento ou algo pior.
As alternativas que ficam para um acordo diplomático são a rendição ucraniana ou a continuação da guerra, e qualquer uma das duas é terrível. Por tais razões, a opinião internacional se inclina de forma esmagadora a favor de se avançar na paz e na solução diplomática. De forma esmagadora, mas não total: a posição oficial dos Estados Unidos continua sendo de que a guerra deve continuar para enfraquecer gravemente a Rússia.
Isso se respalda na afirmação de que se a guerra continuar, a Ucrânia estará em uma melhor posição para negociar – ou em uma pior posição para negociar, uma possibilidade que não se contempla. Certamente, em uma posição mais frágil, ainda que seja apenas pela matança e destruição contínuas.
É possível avançar para um acordo diplomático? Só há uma maneira de descobrir: tentá-lo. A recente iniciativa da China é um importante ponto de partida baseado no princípio da soberania, independência e integridade territorial de todos os países. Todos os países, incluindo a Ucrânia, conforme confirmaram altos funcionários chineses.
Nos Estados Unidos, a proposta da China foi rapidamente desdenhada, quando não condenada, junto com grandes iniciativas do Brasil, do Vaticano e outros. A maior parte do mundo não descarta essas opções, muito pelo contrário. A maioria quer que se encerre rapidamente os horrores e se nega a se alinhar com Washington, muito a seu contragosto.
Também não se deixam impressionar pelas declarações de princípios, devido à sua vasta experiência. Parece-me que é aqui, em grandes traços, que nos encontramos de novo. A Ucrânia tomará suas próprias decisões, como tem o direito de fazer, mas os outros não são espectadores passivos, nem muito menos os que participam diretamente no conflito. É muita coisa que está em jogo. É necessário pensar com serenidade e com um planejamento cuidadoso, não com declarações heroicas, apostas terríveis e atitudes ardilosas.
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Chomsky e a guerra na Ucrânia: “Não somos meros observadores passivos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU