29 Abril 2023
A imagem da mártir por Cristo e pela fé se sobrepunha à imagem da mártir pela virgindade: a valorização da virtude da virgindade tornava-se funcional para impulsionar e para confirmar em sua decisão as numerosas mulheres – muitas vezes pouco mais do que meninas – que, por vontade da família, eram postas em um convento.
O comentário é de Anita Prati, professora de Letras no Instituto Estatal de Educação Superior “Francesco Gonzaga”, em Castiglione delle Stiviere, Itália. O artigo foi publicado por Settimana News, 20-03-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ao visitar o Museu da Cidade de Bréscia, na Itália, a primeira obra que se encontra, no início do percurso, é um grande crucifixo colocado na parede, de cor cinza azulada, voltado para a entrada.
A cruz de madeira é escura, a ponto de quase se confundir com o fundo, mas o corpo da figura crucificada destaca-se pela sua brancura de mármore: os cabelos lambem suavemente as costas, a cabeça está ligeiramente inclinada para cima, a boca está entreaberta, como que buscando um diálogo com Deus; na brancura do mármore, ressalta-se o preto dos pregos cravados nas mãos abertas e nos pés sobrepostos.
Crucifixo na entrada do Museu da Cidade de Bréscia (Foto: Wikimedia)
A associação imediata é com o crucifixo barroco, que teatraliza o modelo iconográfico antigo do Christus triunfans, captando o instante, cheio de pathos, em que Jesus, ainda vivo na cruz, confia seu espírito ao Pai.
Mesmo assim, algo desconcerta. A nudez do corpo crucificado está coberta não por uma tanga, mas por um grande pano que desce até os pés, escondendo totalmente as pernas; e o pano é, na realidade, um vestido de mulher, com o espartilho que, rasgado e dobrado em torno da cintura, deixa o seio descoberto.
Uma mulher crucificada. O impacto é forte. Pensa-se na obra transgressora de algum artista contemporâneo. Mas a legenda ao lado diz:
Giovanni Carra
(notícias de 1619 a 1677)
Santa Júlia crucificada
Mármore de Carrara
Duas perguntas surgem a partir da perplexidade. A primeira: quem foi Santa Júlia? A segunda: por que foi representada assim?
Vou partir da segunda pergunta, para tentar responder à primeira por meio de um exercício comparativo apenas aparentemente extravagante.
A estátua de Santa Júlia está exposta no saguão de um edifício que nasceu não como museu, mas como mosteiro. Construído na era lombarda e dedicado a São Salvador, o cenóbio passou por inúmeras reformas e ampliações ao longo dos séculos.
No fim do século XVIII, após as supressões napoleônicas, foi desmantelado e reutilizado como quartel. Em seguida, após a proclamação da unificação da Itália, foi comprado pela Prefeitura de Bréscia para ser utilizado como sede de museu.
Dentro do perímetro do grande complexo monástico, havia diversas igrejas. Em conformidade com as normas arquitetônicas ditadas pelo Concílio de Trento, no fim do século XVI foi projetada uma nova igreja, dedicada a Santa Júlia, hoje transformada em auditório.
Os trabalhos de construção foram concluídos em 1599, e, no ano seguinte, em 17 de dezembro de 1600, durante uma celebração solene, as relíquias da santa foram transladadas da cripta da basílica de São Salvador para um dos altares laterais da nova igreja.
O evento teve uma grande ressonância. O Papa Clemente VIII, explicitando também nisso a firme oposição do catolicismo à Reforma Protestante, concedeu a indulgência a quem estivesse presente à celebração.
A estátua de Santa Júlia, encomendada à oficina dos Carra – duas gerações de escultores, o pai, Antonio, e os dois filhos, Giovanni e Carlo, dominadores do estilo bresciano ao longo de todo o século XVII –, foi colocada na nova igreja 20 anos após a solene cerimônia de translação das relíquias.
A escultura veio para selar a operação estratégica implementada com a construção da nova igreja: a adesão aos princípios contrarreformistas assumia a forma de uma resposta em chave polêmica às posições doutrinais e teológicas das Igrejas reformadas, que negavam a devoção às relíquias e às imagens sagradas e consideravam o culto dos santos como mera superstição.
Para compreender o significado que o artista e o cliente propunham-se a veicular por meio dessa representação escultórica, é indispensável tentar imaginar a obra, hoje totalmente descontextualizada, dentro de sua ambientação original.
A estátua constituía o elemento central de um conjunto articulado e complexo: estava posta sobre o altar das relíquias dos santos, no interior de uma imponente moldura de mármore, em cujos lados verticais encontravam-se duas esculturas com as personificações da Fé e da Caridade, enquanto da cimalha sobressaíam querubins que mostravam os instrumentos do martírio de Cristo.
O conjunto, segundo um gosto tipicamente barroco, apresentava-se aos fiéis como uma verdadeira cena teatral, animada por uma estratégia comunicativa precisa, destinada a contrastar as ideias reformadas, sobretudo em relação ao tema da salvação: identificação do altar não com a mesa do ágape, mas com a mesa do sacrifício; a imitatio Christi obtida não só por Fidem, mas também per Caritatem, ou seja, por meio das obras e das ações; Cristomimese de Júlia, alter Christus, resolvida de acordo com uma interpretação vitimista.
Não é por acaso que a translação das relíquias de Santa Júlia foi planejada e realizada no ano de 1600, o ano do Jubileu que, fechando o atormentado século XVI, marcado ferozmente pela crise desencadeada pela Reforma, tinha que manifestar e tornar visível ao mundo inteiro a vitalidade da Igreja Católica.
Precedido pela decapitação de Beatrice Cenci na Praça do Castel Sant’Angelo e marcado pela fogueira do frade dominicano Giordano Bruno no Campo de’ Fiori, o grande Jubileu do novo século – o primeiro totalmente alinhado com as diretrizes do Concílio de Trento – pode ser considerado como um verdadeiro divisor de águas na história do catolicismo.
A máquina organizativa comandada por Clemente VIII fez de Roma “o teatro religioso do mundo”, redimindo-a da humilhação sofrida com o saque de 1527 e da vergonha de ter sido definida como a Nova Babilônia.
As espetaculares coreografias dos cortejos papais e nobres e das procissões com estandartes, cruzes, relíquias e imagens de santos atraíram à Urbe uma multidão inumerável de peregrinos e turistas, impressionados com o senso de grandiosidade veiculado por essas manifestações religiosas, nas quais encontrava plena expressão a dimensão pomposa e decorativa própria da era barroca.
As cerimônias comemorativas e as procissões com as relíquias dos mártires enxertavam no tecido da cidade verdadeiros espaços de sacralidade. O processo de sacralização da Urbe contribuía para a afirmação do poder temporal do pontífice romano e reforçava as reivindicações hierárquicas.
Assim como a figura do mártir havia representado o modelo ideal do cristão na Igreja das origens, na era pós-tridentina a devoção martirial foi assumindo um veio propagandístico: graças ao culto dos antigos mártires, a Igreja Católica podia se apresentar como única e verdadeira Ecclesia universal.
O Martirológio Romano, elaborado pelo cardeal Cesare Baronio em 1584 a fim de unificar em uma única listagem os vários martirológios existentes, demonstrava a continuidade entre a Igreja Católica e suas raízes apostólicas. Os estudos e as pesquisas arqueológicas de Antonio Bosio, que confluíram na obra póstuma “Roma sotteranea”, publicada em 1632, trazendo à tona as catacumbas primitivas, cuja recordação havia se perdido ao longo dos séculos, valorizavam a antiguidade e, portanto, a legitimidade do catolicismo em função antiprotestante.
É precisamente nessa perspectiva que se justifica e se explica a ênfase dada pelos artistas da época à representação dos pormenores mais atrozes e sangrentos do suplício e da morte dos mártires.
A translação das relíquias da mártir Júlia, ocorrida na Bréscia no fim do ano jubilar de 1600, faz parte, portanto, de um quadro preciso de conjunto, do qual podemos vislumbrar outros detalhes por meio de uma história que, com a de Júlia, entrelaça analogias interessantes.
Os preparativos para o Ano Santo começaram há algum tempo. O cardeal sobrinho Paolo Emilio Sfondrati havia iniciado os trabalhos de restauração da basílica paleocristã de Santa Cecília em Trastevere na primavera de 1599.
No mês de outubro seguinte, foram exumados os restos mortais da santa, sepultada na cripta, para avaliar seu estado de conservação. Uma vez aberto o sepulcro de mármore e a arca de cipreste, apareceu o corpo incorrupto: Cecília, revestida com um hábito branco bordado com fios de ouro, jazia deitada sobre o lado direito, com os cabelos cobertos por um véu, o rosto voltado para o chão, os sinais do sangue e três feridas no pescoço.
O caráter milagroso do evento atraiu uma grande multidão. O próprio Papa Clemente VIII dirigiu-se pessoalmente à igreja de Trastevere, onde, durante um mês, os restos permaneceram expostos para a veneração dos fiéis.
Assim que o corpo foi novamente sepultado na cripta, o cardeal Sfondrati encomendou ao jovem escultor Stefano Maderno, que estivera presente na cerimônia de exumação do corpo e havia feito esboços dele, uma estátua que reproduzisse sua posição exata.
Maderno esculpiu uma obra-prima. O corpo pequeno, quase como o de uma criança, tem a sinuosidade e a suavidade de um jovem corpo de mulher. As mãos estão estendidas para a frente, os joelhos, levemente levantados. A torção da cabeça, coberta por um véu, impede que se veja o rosto, mas torna visível o pescoço com os sinais do machado e as gotas de sangue.
Estátua de Santa Cecília, de Stefano Maderno (Foto: Wikimedia)
A obra, em um mármore pariano branquíssimo, recupera os elementos estilísticos do classicismo, trabalhando-os na perspectiva daquela “dobra” que talvez seja a figura estilística mais significativa da era barroca: dobras sobre dobras estremecem na levíssima veste e no véu, cobrindo todo o corpo e os cabelos de Cecília.
A estátua foi colocada em posição cenográfica sob o altar-mor, em correspondência com o lugar de sepultura da santa na cripta abaixo, em uma magistral simbiose entre indicações conciliares e sensibilidade barroca: a imagem sagrada deve suscitar emoção e comoção, tocando a alma dos fiéis; a teatralização do sagrado faz da estátua um instrumento de oração e um objeto de veneração.
A obra de Maderno teve grande ressonância e influência sobre os artistas da época. A página do Museu do Prado dedicada à famosa pintura de Francisco de Zurbarán, Agnus Dei, evidencia uma precisa ligação iconográfica entre a pintura do pintor espanhol, datada de cerca de 1635-1640, e a estátua de Santa Cecília de Maderno, anterior em algumas décadas.
O fato de Zurbarán ter modelado seu Agnus Dei a partir da obra de Maderno atesta, de forma inequívoca, a qualidade sacrificial e a dimensão vitimista expressada pela estátua de Santa Cecília. Qualidade sacrificial e dimensão vitimista veiculadas também pela estátua bresciana de Santa Júlia crucificada. As duas estátuas respondem, portanto, à mesma função: propor como modelo para imitar a figura de uma vítima oferecida em sacrifício.
A esta altura do nosso caminho, podemos recuperar a pergunta inicial, ampliando-a com outra interrogação: não só “quem é Santa Júlia?”, mas também “quem é Santa Cecília?”.
De acordo com as narrativas hagiográficas que transmitem suas biografias, as duas santas viveram alguns séculos separadas uma da outra, Cecília, no início do século III; Júlia, em meados do século V.
Algumas reconstruções históricas recentes, porém, deslocam o martírio de Júlia para meados do século III, na época da perseguição do imperador Décio, aproximando-a de forma sensível do tempo em que Cecília viveu.
Ambas de famílias nobres, como revelam seus nomes, ligadas a algumas das mais antigas gentes romanas, Júlia e Cecília sofreram então o martírio entre o início e a metade do século III, antes do edito de Constantino.
Nos primeiros séculos do cristianismo, é fato incontestável a presença numerosa de mulheres e sua participação ativa na vida da Igreja nascente. Em um tempo e em uma sociedade em que o valor das mulheres era inferior a nada, escolher a fé cristã significava, para uma mulher, trilhar também um caminho de resgate individual e social: em Cristo não há mais nem judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher; e, portanto, em Cristo, para as mulheres, era possível se abrir a impensável possibilidade de ser e de existir no mesmo nível dos homens.
São emblemáticos, a esse respeito, os “Acta” dos mártires scilitanos, o mais antigo documento da literatura cristã em língua latina. Os 12 mártires provenientes de Scili, um pequeno centro na África proconsular romana, foram martirizados em Cartago no ano 180, durante o império de Cômodo.
Os mártires são geralmente citados com um masculino inclusivo. Na realidade, trata-se de sete homens e de cinco mulheres, cujo nomes próprios foram preservados graças ao formalismo jurídico romano. No momento da condenação, de fato, o procônsul Saturnino fez com que o pregoeiro proclamasse a sentença: “Esperato, Narzal, Citino, Vetúrio, Félix, Acelino, Letâncio, Januária, Generosa, Vestina, Donata, Segunda foram condenados à pena capital”.
O Martirológio Romano, recordando-os no dia 17 de julho, conta brevemente sua história e conclui assim: “Confessaram firmemente que eram cristãos e, por se recusarem a honrar o imperador como deus, foram condenados à morte: todos ajoelhados no local da execução, foram decapitados à espada enquanto davam graças a Deus”.
O martírio é martírio para testemunhar a fé, não faz distinção entre homem e mulher, não experimenta desigualdades de gênero. E, algo muito significativo à luz dos desdobramentos posteriores, não precisa do selo da virgindade.
Por que motivo, então, em certo ponto da história, para certificar a santidade feminina, tornou-se necessário acrescentar uma superestrutura de caráter sexual, associando a palma do martírio também à palma da virgindade?
Lemos no Martirológio Romano, no dia 22 de novembro: “Memória de Santa Cecília, virgem e mártir, que se transmite que recebeu sua dupla palma por amor de Cristo no cemitério de Calisto, na Via Ápia. Seu nome está no título de uma igreja romana em Trastevere desde a antiguidade”. E no dia 22 de maio: “Na ilha da Córsega, comemoração de Santa Júlia, virgem e mártir”.
Virgem e mártir. Virgem. Notação que nunca se encontra quando o santo é homem. O que aconteceu, e quando e por que aconteceu, que virgindade e castidade se tornaram superestrutura da santidade para as mulheres, e o epíteto “virgem” – de sabor tão impudico e voyeurístico – tornou-se o epíteto qualificativo por excelência da santidade feminina?
Para entender o mecanismo que presidiu aquilo que se configura como uma verdadeira mudança semântica, que fez com que o martírio pela fé se tornasse tout court, para as mulheres, martírio pela intangibilidade sexual, é indispensável um esclarecimento preliminar, relativo à diferença de gênero literário entre Acta e Passiones.
Enquanto os Acta martyrum são as minutas dos processos sofridos pelos cristãos com o relato escasso e essencial de seus últimos momentos de vida, as Passiones são narrativas de caráter lendário, enriquecidas por detalhes milagrosos, redigidas vários séculos depois do martírio. Em si mesmas desprovidas de valor histórico-documental a respeito da história hagiográfica contada, são, porém, fontes importantes para iluminar o contexto cultural a partir do qual esse tipo de narrativa foi promovido.
A mudança de registro narrativo entre os dois gêneros literários dos Acta e das Passiones ocorre em uma fronteira cronológica situada entre o fim da era antiga e os primeiros séculos da alta Idade Média, quando, para as famílias nobres, começa a se apresentar o problema da colocação das filhas não matrimoniáveis por motivos de dote ou de sucessão dinástica.
Em uma perspectiva antropológica, a virgindade como modelo social permite afastar a mulher do intercâmbio matrimonial, liberando a família da onerosa incumbência do dote.
O princípio do “Aut murus aut maritus” – ou do “Maritar ou monacar”, como se dizia em Veneza – foi o pivô de políticas familiares seculares que lidavam com o incômodo destino de ter dado à luz filhas mulheres. O aut aut, no entanto, não se situava em um plano horizontal: virgindade e matrimônio espiritual, via mestra para o paraíso, eram apresentados em um nível muito mais elevado do que o matrimônio mundano.
É nessa perspectiva que se entende como a imagem da mártir por Cristo e pela fé se sobrepôs à imagem da mártir pela virgindade: a valorização da virtude da virgindade tornava-se funcional para impulsionar e para confirmar em sua decisão as numerosas mulheres – muitas vezes pouco mais do que meninas – que, por vontade da família, eram postas em um convento.
E é nessa perspectiva que se explica como as narrativas lendárias contidas na “Passio sanctae Ceciliae”, datada por volta das últimas décadas do século V, e na “Passio sanctae Juliae” do século VII, ligam indissoluvelmente o motivo do martírio à vontade de preservar a virgindade – tudo às custas do testemunho da fé em Cristo.
Entre os séculos VIII e IX, os corpos das duas santas foram transladados do local de sepultura original para dois locais de culto de nova fundação – Santa Júlia para o mosteiro de São Salvador em Bréscia, Santa Cecília para a basílica em Trastevere.
Suas relíquias, fundamento de sacralidade para os edifícios, contribuíram para a definição de um imaginário religioso que identificava a virgindade com o símbolo absoluto da vida monástica, da santidade e da transcendência da própria Igreja.
Com o decreto De regularibus et monialibus, o Concílio de Trento reafirmava peremptoriamente, em oposição às Igrejas reformadas, o valor do monaquismo, exaltado como status perfectionis, e, ao enrijecer a clausura nos mosteiros femininos, conotava cada vez mais a vida monástica em perspectiva sacrifical, apresentando-a como uma verdadeira fuga mundi: para uma freira, viver verdadeiramente significava morrer para o mundo.
Neste ponto, podemos voltar à estátua de Santa Júlia crucificada de Carra, ponto de partida do nosso percurso, para tentar um exercício de imaginação.
Tentemos olhar para a estátua com os olhos das religiosas que, devido à clausura, não tinham acesso à Igreja, aberta ao culto dos fiéis, mas assistiam à missa e às funções religiosas do coro, ficando atrás de uma grade. A partir da grade, as freiras entreviam a igreja na penumbra, iluminada pela luz das velas, e ali, no segundo altar lateral à esquerda, a estátua de Júlia crucificada. Elas não podiam vê-la diretamente, mas sabiam que ela estava lá. Sabiam. Invisível para elas, mas visível para os fiéis, aquela estátua, que representava todas elas, dava razão da dimensão sacrificial de sua existência.
Resta-nos fazer, agora, pelo menos duas considerações conclusivas.
A primeira: o exercício de tomada de consciência histórica realizado por meio da desconstrução do imaginário sacrificial permite libertar as figuras de Júlia e de Cecília e tantas outras figuras femininas das superestruturas que, ao longo dos séculos, moldaram a recepção de sua experiência, devolvendo-as à intensa essencialidade de um martírio vivido como puro testemunho de fé em Cristo.
A segunda: essa tomada de consciência pode se tornar um instrumento para reler em chave antropológica a questão dos abusos das religiosas. A vítima silenciosa toma a palavra. As palavras das vítimas emergem do silêncio, desestabilizando o sistema e desequilibrando-o nas profundezas de sua estrutura simbólica, além de real.
Mas, e esta é a boa notícia, talvez tenha chegado a hora em que a religião do sacrifício pode encontrar-se na religião do Amor.
MAGLI, Ida. Storia laica delle donne religiose. Longanesi & C., 1995.
LIROSI, Alessia. Il corpo di santa Cecilia (Roma, III-XVII secolo).
GROSSI, Vittorino. Il Giubileo viaggio nella storia – Il Giubileo del 1600, il secolo dei Giubilei.
ZURBARÁN, Francisco de. Agnus Dei.
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A construção da vítima mulher: entre martírio e virgindade. Artigo de Anita Prati - Instituto Humanitas Unisinos - IHU