23 Junho 2022
Não só “possível”. Um mundo livre de armas nucleares é “necessário”. Isso foi afirmado pelo Papa Francisco na mensagem lida por Dom Paul Gallagher, secretário para as relações com os Estados, na cúpula de Viena.
A reportagem é de Lucia Capuzzi, publicada em Avvenire, 22-06-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Desde essa terça-feira, 21, na capital austríaca, estão reunidos os mais de 80 países aderentes ao tratado da ONU sobre a proibição da bomba atômica para a primeira conferência das partes. Destes, 65 já ratificaram o acordo, e 23 o assinaram.
O pacto não inclui as nove potências nucleares, assim como os outros membros da Otan. Quatro Estados da Aliança, no entanto – Alemanha, Holanda, Bélgica e Noruega –, dos quais os três primeiros abrigam ogivas ornais em seu território, e a Austrália, que tem uma relação especial com a Otan, participam como observadores. Um sinal – ainda pequeno, diante das ausências, inclusive da Itália – na perspectiva de uma superação da doutrina da dissuasão.
Como demonstra a crise ucraniana, um equilíbrio baseado na ameaça de destruição recíproca é altamente instável. “Tentar defender e garantir a estabilidade e a paz através de uma falsa sensação de segurança (...) acaba inevitavelmente envenenando as relações entre os povos e dificultando todas as possíveis formas de diálogo real”, escreveu o pontífice. Não só a utilização, portanto, mas também a mera posse da bomba atômica é – sublinha o papa – imoral.
A proibição da ONU, aprovada em 7 de julho de 2017 e que entrou em vigor há um ano, constitui um marco nessa direção, mesmo que o caminho para convencer o clube atômico seja longo. E inclui uma série de fases intermediárias, nas quais trabalham organizações da sociedade civil, a começar pela International Campaign Against Nuclear Weapons (Ican), prêmio Nobel da Paz justamente por ter transformado uma petição popular em proibição internacional. Entre elas está a cooperação pelas vítimas das armas atômicas.
Não por acaso, a própria conferência – que terminará nessa quinta-feira, 23 – foi precedida, na segunda-feira, por um momento de debate sobre o impacto humanitário da bomba atômica. Uma única explosão de 100 quilotons em uma cidade como Washington atingiria meio milhão de pessoas; em Paris seriam 1,3 milhão, conforme afirma um recente estudo do Ican, que em Viena conta com a presença de parceiros italianos, a Rete Pace e Disarmo e a Senzatomica.
Além dos danos imediatos, somam-se os de longo prazo à saúde das pessoas e do planeta. A contaminação atômica tem uma duração que ultrapassa os 100.000 anos. Além disso, nessa terça-feira, houve uma reflexão sobre os mecanismos financeiros adequados para desencorajar não só a produção, mas também o armazenamento e a manutenção das ogivas. Uma proposta para proibir explicitamente qualquer forma de investimento no setor foi apresentada aos líderes internacionais pelo italiano Ugo Biggeri, presidente da Etica SGR, em nome de 37 bancos e instituições financeiras que, juntos, administram ativos no valor de 230 bilhões de euros.
“O desarmamento nuclear é complexo. A alavancagem financeira pode se tornar um instrumento precioso, dada também a sensibilidade dos cidadãos. Estes poderiam decidir premiar aqueles fundos e instituições que se recusassem a cooperar com o negócio atômico. Não se trata apenas de não apoiar a fabricação das bombas, mas também todas as atividades colaterais de manutenção e a fabricação dos componentes”, explica Biggeri.
“Enquanto houver armas nucleares, nunca estaremos seguros”, disse Laura Boldrini, presidente do Comitê de Direitos Humanos no Mundo da Câmara italiana, que está em Viena pelo seu compromisso com a campanha da Ican “Itália, pense de novo”. “Continuaremos trabalhando para que isso se torne realidade”, disse.
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A necessidade de um mundo sem armas nucleares: uma cúpula em Viena - Instituto Humanitas Unisinos - IHU