30 Mai 2022
O documento foi encaminhado às Secretarias Municipais e ao prefeito de Blumenau na tarde dessa quarta (26); No dia 27 de abril, a Prefeitura de Blumenau derrubou a casa da família e sumiu com os pertences do local.
A reportagem é de Conselho Indigenista Missionário – Cimi, 27-05-2022.
Há um mês, a Prefeitura de Blumenau derrubava, covardemente, a casa de uma família do povo Kaingang. Na ação, os pertences dos indígenas também desapareceram do local: artesanatos, ferramentas de trabalho, fogão, cama e roupas. Como resposta, foi encaminhado às Secretarias Municipais e ao prefeito de Blumenau, na tarde dessa quarta-feira (26), um documento com o pedido de devolução dos bens da família.
À época, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) mostrou em matéria denúncias de que a ação havia sido realizada “sem qualquer ordem judicial” – e enquanto a família viajava. Um dia após o episódio, funcionários da prefeitura ainda voltaram ao terreno e colocaram pedras onde ficava a casa, a fim de impedir o retorno dos indígenas. A família morava no local há cerca de 20 anos.
“Diante dos fatos narrados, requeremos a devolução dos pertences (bens materiais) acima descritos, removidos, no dia 27 de abril, do endereço acima mencionado pela Prefeitura Municipal de Blumenau. Pelos direitos de posse desses bens recolhidos e por uma questão de justiça, pedimos deferimento e imediata devolução dos mesmos. Adicionalmente, solicitamos que sejam retiradas as pedras colocadas sobre o terreno em questão que está sob a posse dos requerentes”, diz um trecho do documento encaminhado às Secretarias do município de Blumenau.
Na ocasião, foram levados pela Prefeitura de Blumenau sapatos, roupas, brinquedos de crianças, ferramentas de trabalho, balaios confeccionados, “filtros dos sonhos”, utensílios de cozinha, eletrodomésticos, alimentos e matérias-primas para produzir os artesanatos.
No mesmo documento, foi solicitado também que a Prefeitura de Blumenau “respeite o direito de posse sobre o terreno em questão e se abstenha de realizar operações da mesma natureza ou semelhantes contra a residência e demais bens materiais dos requerentes”.
No dia 28 de abril, funcionários da Prefeitura de Blumenau (SC) colocaram pedras em cima do espaço onde ficava a moradia da família Kaingang. Para uma das vítimas do despejo, essa ação significa o “enterro” de sua família. (Foto: arquivo pessoal)
Em vídeo, um dos moradores do local – que terá sua identidade preservada – exigiu respeito por parte das autoridades do município.
“Hoje estamos acampados aqui, comercializando os nossos artesanatos. Mas eu quero, novamente, que as autoridades respeitem todo o nosso povo. Respeitem as pessoas desse acampamento. Queremos viver a nossa cultura dentro da cidade de Blumenau. A nossa cultura ainda não morreu e queremos viver em paz”, disse.
“Blumenau se formou em cima do coração da terra-mãe. E hoje estamos aqui, nesse acampamento, com todas essas pedras fincadas em cima de nossas moradias. Isso machuca a nossa alma, o nosso coração, porque somos os primeiros habitantes desse país. A nossa vivência, o nosso direito ainda não morreu. O nosso direito ainda está aceso. Peço, novamente, respeito”, completou.
Após a denúncia, no final do mês de abril, o Ministério Público Federal (MPF) solicitou à Prefeitura de Blumenau que fornecesse informações, no prazo de dez dias – a partir do dia 28 de abril de 2022 –, a respeito de quem partiu a ordem para demolição, quais as razões que justificavam a medida e quais as medidas que a Prefeitura de Blumenau pretendia adotar para possibilitar abrigo aos indígenas que acampam na cidade para vender artesanatos.
Recentemente, a prefeitura emitiu uma nota (confira abaixo) sobre o caso e afirmou que “as duas áreas da cidade destinadas ao acampamento indígena seguem disponíveis para moradia”. Além disso, usou como justificativa da ação o aumento de focos do mosquito Aedes Aegypti – transmissor da dengue – na região.
“A ação faz parte da série de mutirões de limpeza que a Prefeitura de Blumenau tem feito desde o começo de abril e já passou pelos bairros Escola Agrícola, Do Salto, Vorstadt, Água Verde e Garcia”, diz um trecho da nota.
A iniciativa da Prefeitura de Blumenau contraria uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF): em maio de 2020, a Corte determinou a suspensão de todos os processos que tratem do tema e que possam resultar na anulação de demarcações ou no despejo de comunidades indígenas.
A decisão do ministro Edson Fachin é válida até o fim da pandemia de Covid-19 ou até o término do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365 – caso ele ainda não tenha sido concluído quando a crise sanitária for considerada encerrada.
A Prefeitura de Blumenau informa que as duas áreas da cidade destinadas a acampamento indígena, na Rua Itajaí e na região próxima ao Terminal Rodoviário de Blumenau, seguem disponíveis para moradia, sendo monitoradas, porém sem interferência do município. O poder público reforça que recentemente, um mutirão da Sala de Situação que atua no combate do mosquito Aedes aegypti na cidade, fez a retirada de materiais que estavam abandonados em um local próximo ao viaduto da Via Expressa.
A ação foi motivada por diversas denúncias de moradores. Atualmente, a Itoupava Norte é o bairro com maior número de focos na cidade, são mais de 234 locais, o bairro também registra 140 pacientes com diagnóstico de dengue. A ação faz parte da série de mutirões de limpeza que a Prefeitura de Blumenau tem feito desde o começo de abril e já passou pelos bairros Escola Agrícola, Do Salto, Vorstadt, Água Verde e Garcia.
Os trabalhos são acompanhados pela Secretaria de Promoção da Saúde (Semus), Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semudes), Secretaria de Defesa Civil (Sedeci) e Secretaria de Conservação e Manutenção Urbana (Seurb). Mais de 200 toneladas de entulhos já foram recolhidos desde o começo de abril.
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Após Prefeitura de Blumenau (SC) derrubar casa de família Kaingang, indígenas protocolam documento com o pedido de devolução dos bens - Instituto Humanitas Unisinos - IHU