06 Julho 2021
"É da natureza de toda guerra híbrida, como a instalada no Brasil a partir de 2013, desenvolver operações psicológicas buscando confundir a opinião pública, passando a impressão de algo que não representa a verdade de fato, para poder, entre outras coisas, purificar os rastros (ou ruídos) deixados ao longo do caminho por processos anteriores, de modo a apaga-los", escreve Alexandre Aragão de Albuquerque, arte-educador (UFPE), especialista em Democracia Participativa (UFMG) e mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE).
Na epígrafe da monumental obra literária “Nada de novo no front”, seu autor, o alemão naturalizado estadunidense Erich Maria Remarque, aponta que aquele livro não pretende ser um libelo, nem uma confissão, e muito menos uma aventura, pois a morte não é uma aventura para aqueles que se deram face a face com ela. Apenas procurou mostrar uma geração de homens que, mesmo tendo escapado às granadas, foram destruídos pela guerra.
Aos dezoito anos de idade, Remarque foi ferido três vezes nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, uma delas gravemente. Ao retornar para seu país, suas noites de insônia eram preenchidas por infindáveis cadernos, onde anotava os horrores que viveu sobre o absurdo da guerra. No livro, ele mostra a face real dos soldados: homens neuróticos, maltrapilhos e assustados.
Com a implantação do nazismo alemão, Erich Remarque e sua obra pacifista foram perseguidos diuturnamente. Joseph Goebbels (ainda em ascensão) e seus milicianos interromperam várias sessões do filme baseado no livro, espalhando ratos nas salas de projeção. Em 1933, com a chegada de Hitler ao poder, o filme foi proibido de ser exibido na Alemanha, e todos os exemplares de “Nada de novo no front” foram queimados na famosa fogueira na Praça da Ópera, em Berlim. Remarque exilou-se nos EUA, mas sua irmã foi decapitada pelo nazismo alemão.
O Brasil no dia de hoje, 02/07, conta com um quadro arrasador. São, pelos dados oficiais, 520.000 pessoas que perderam suas vidas na guerra contra a Covid-19. Para um efeito comparativo, na cidade de Nagasaki, no Japão, morreram vítimas do terror da bomba atômica 74.000 pessoas. Portanto, até a data presente, cerca de sete (07) bombas atômicas foram atiradas em solo brasileiro, causando terror e desolação para as famílias dos mortos na trincheira brasileira, gerando inclusive uma infinidade de órfãos.
Mesmo sendo instalada tardiamente no Senado Federal, a CPI do Genocídio, em virtude da omissão das instituições republicanas em cumprir o seu papel procurador da justiça diante dos evidentes sinais de crimes praticados por agentes do Estado brasileiro contra a saúde pública, tem permitido à sociedade brasileira ter acesso à trama nefasta produzida na caserna do Ministério da Saúde, sob a administração do general Pazuello, voltada para duas estratégicas básicas, conforme já comprovadas pela CPI:
1) disseminação indiscriminada do não-comprovado tratamento precoce à base de cloroquina e hidroxicloroquina, tendo na pessoa de Jair Messias Bolsonaro o seu garoto-propaganda;
2) Adiamento pelo maior tempo possível da aquisição das vacinas imunizantes. O momento atual da CPI é a constatação da deplorável obtenção de vantagens financeiras por parte destes defensores inescrupulosos, mediante o genocídio de brasileiros.
Importante esclarecer que os ministros médicos Nelson Teich e Henrique Mandetta caíram dos seus cargos por discordarem frontalmente do encaminhamento defendido por Jair Messias Bolsonaro em relação ao uso precoce da cloroquina e sua disseminação.
No Diário Oficial de 19 de maio de 2020, o general Eduardo Pazuello, ministro substituto da Saúde, nomeou diversos militares do exército, na ativa, para atuar em seu ministério: o subtenente André Cabral Botelho (coordenador da contabilidade); o subtenente Giovani Cruz Camarão (coordenador das finanças do FNS); o tenente Mario Luiz Ricette Costa (subsecretário de planejamento e orçamento); o capitão Alexandre Magno Asteggiano (assessor); o major Ângelo Martins Denicolli (diretor do departamento de monitoramento e avalição do SUS); o major Ramon da Silva Oliveira (coordenador-geral de inovações de processos e estruturas); o tenente-coronel Marcelo Sampaio Pereira (diretor de programa); o coronel Luiz Otávio Franco Duarte (assessor especial); o tenente-coronel Vagner Luiz da Silva Rangel (coordenador de execução orçamentária); o coronel Antônio Élcio Franco Filho (secretário-executivo do ministério). Portanto, onze (11) militares da ativa do exército comandando o ministério da Saúde. No dia 19 de maio de 2020 o Brasil contava 17.983 mortes pela Covid-19. A partir do comando desses militares, o número de mortes aumentou em quase 30 (trinta) vezes.
Na entrevista concedida ao jornalista Roberto D’Ávila, na Globo News, no último dia 22/06, o general da reserva Hamilton Mourão, vice-presidente da República, dissimulou que as Forças Armadas não estavam presentes no Ministério da Saúde. Era uma questão pessoal de Pazuello. Mas como Pazuello teria ascendência sobre 11 (onze) militares, se não fosse pela anuência e autorização do Comando da Força à qual esses militares estão hierarquicamente submissos?
Sabe-se muito bem que no manual básico militar, como registra o jornalista Elio Gaspari em seus estudos sobre a ditadura de 1964, “As Ilusões Armadas”, nenhum movimento é feito sem uma conexão e autorização da hierarquia. Portanto, a presença desses militares no Ministério da Saúde, como em outros ministérios e repartições públicas, conta com o crivo do Alto Comando das Forças Armadas, que fazem de tudo para ficarem despercebidas, deixando que venha em relevo a figura do Jair, passando a imagem para a sociedade brasileira de que é ele que está no controle das ações.
É da natureza de toda guerra híbrida, como a instalada no Brasil a partir de 2013, desenvolver operações psicológicas buscando confundir a opinião pública, passando a impressão de algo que não representa a verdade de fato, para poder, entre outras coisas, purificar os rastros (ou ruídos) deixados ao longo do caminho por processos anteriores, de modo a apaga-los.
Enquanto o olhar fica fixo na figura do Jair, deixa-se de observar a ação de sete mil militares à frente do Poder executivo federal. O Ministério da Saúde é um caso típico a ser analisado, porque a partir do seu estudo pode-se entender melhor a natureza da guerra que foi colocada em movimento a partir do Golpe de 2016.
Por fim, não se pode esquecer que o Chefe da CIA, William Burns, está hoje no Brasil para conversar secretamente com os generais Eduardo Ramos (Casa Civil) e Augusto Heleno (GSI). O general Hamilton Mourão disse não saber nada do conteúdo da visita. Talvez Burns tenha vindo para conversar sobre o resultado da Copa América. Aliás, por curiosidade, o que faz um general ser ministro da Casa Civil?
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Nada de novo no front: generais e coronéis no comando - Instituto Humanitas Unisinos - IHU