09 Setembro 2020
Comemorar e celebrar a vida de Dom Pedro Casaldáliga, no dia em que completava um mês da sua Páscoa, tem sido o motivo do encontro virtual, convocado por diferentes movimentos e pastorais sociais, que nesta terça-feira, 8 de setembro, congregou um bom número de pessoas de todos os cantos do Brasil e de diferentes países do exterior. O nome que foi dado a esse momento: “Contra todas as Cercas”, lembra o título de um dos muitos poemas escritos por alguém que acima de tudo se considerava poeta.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Entre os presentes um sentimento de agradecimento, de esperança, inclusive em um momento em que o Brasil tem se tornado um dos focos principais da COVID-19, com mais de 127 mil vidas apagadas “pela ação e omissão de nossos governantes”, como afirmava Pedro César Moreira, condutor do evento, que afirmava que “neste tempo de sombras, nos encontramos como os primeiros cristãos, partilhando o pão na segurança das catacumbas”.
A homenagem tem sido um mosaico de depoimentos, da sua família, da Igreja e dos movimentos sociais, mas também do mundo da política, da arte, vozes entrelaçadas que quiseram demonstrar o carinho, o reconhecimento e o amor pelo bispo do Araguaia, o rio que mansamente se desliza na frente do seu túmulo, escavado na terra vermelha, embaixo de um pé de pequi. Pedro é alguém que continua sendo importante para muita gente, pela força de seu amor e de suas ideias, de seus exemplos, pela força da sua indignação contra as injustiças, pela força da sua luta indignada para romper todas as cercas.
Os muitos testemunhos de reconhecimento a Pedro, como ele gostava de ser chamado, que ajudaram entender quem tem sido Casaldáliga, foram intercalados com diferentes vídeos que recolhiam seu testemunho profético em defesa dos mais pobres, em defesa da vida, algo que assumiu com empenho e utopia. Em um tempo em que as comunicações não tinham a rapidez de hoje, Pedro Casaldáliga, desde um lugar totalmente isolado, como era, e continua sendo, São Félix do Araguaia, ultrapassou as fronteiras da Igreja e do Brasil, mostrando a dura realidade local, se posicionando desde o início do seu ministério episcopal contra o latifúndio e a opressão, provocando múltiplas ameaças de morte e duras críticas de parte da Igreja e do governo da Ditadura Militar.
Em palavras de Marcelo Barros, “o Pedro foi alguém humano”, um elemento de especial relevância em um momento em que “vivíamos no Brasil um momento de certa desumanidade, uma indiferença frente ao fato da morte”, que o monge considera consequência “do descuido do governo, pela política pública ineficaz que nós estamos sofrendo neste tempo de pandemia”. Esses elementos cobram destaque à luz da vida de alguém que se empenhou em viver pobre, em fazer opção pelos indígenas e posseiros.
Alguém que é um grande pastor, em palavras de Leonardo Boff, que participava das dores e alegrias do povo, que é um profeta, que denuncia o latifúndio e anuncia a Boa Nova de Jesus, é um poeta, que Boff coloca na altura de São João da Cruz, que é um santo, que nos recorda as virtudes do Evangelho da simplicidade, da compaixão, do amor incondicional, ele é uma luz que ilumina nossa Igreja e nos dá certeza que o Evangelho é verdadeiro caminho para a humanidade.
Pedro foi alguém com um forte compromisso latino-americano, com a Pátria Grande, como foi lembrado na homenagem, comprometido com as lutas da Nicarágua, de El Salvador, de Cuba, momentos relatados por diferentes testemunhas dessas viagens, especialmente Frei Betto, quem lembrava uma frase que Pedro, com sua fina ironia, disse a Fidel Castro, “para a direita, é melhor ter o Papa contra a Teologia da Libertação, do que Fidel a favor”.
O testemunho de Pedro foi além da sua morte, como ficou demonstrado, e foi recolhido na homenagem, em tudo o que envolveu seu sepultamento, onde mais uma vez o jeito de Pedro foi respeitado, o jeito de alguém que é considerado como grande exemplo de ligação entre a fé, a mística, e a luta social a favor dos mais pobres e excluídos, algo que fica como referência para muitas pessoas.
Dom Adriano Ciocca (frame do vídeo do evento enviado pelo autor).
Fiquemos com as palavras de Dom Adriano Ciocca, quem dizia que “Pedro, aqui na Prelazia, nós fazemos questão de manter firme o legado de compromisso com a justiça, o compromisso com os mais pobres de nossa região, e ver se nós conseguimos fazer que não morra a profecia que ele sustentou a vida toda”. O atual bispo de São Félix do Araguaia dizia que “é muito importante saber que ele até o final ficou lutando e se comprometendo com um mundo mais justo e mais fraterno. Tanto que poucos dias antes de ser internado no hospital, ainda deu anuência para assinar a carta que um grupo de bispos escreveu ao Povo de Deus que foi publicada neste mês de agosto”. Dom Adriano insiste em que “a memória dele não pode e não deve desaparecer, porque Pedro vive, e vive na sua luta pela justiça, e vive no coração de todos aqueles que o conheceram e reconhecem que ele foi um poeta, um profeta e também um santo”.
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Contra Todas as Cercas, uma homenagem a Dom Pedro Casaldáliga no mês da sua Páscoa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU